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Palestrante Mandy Barros aborda a representatividade feminina nos quadrinhos no segundo dia da HQWeek! 2021

Mandy Barros

 

Por Helena Amaral

 

Dentre as atividades do segundo dia da HQWeek! 2021, nessa terça-feira (27/07), foi realizada a palestra “Universo Feminino nos Quadrinhos”, com a ilustradora, quadrinista e designer gráfica paraense Mandy Barros. Mestra em História, Crítica e Educação em Artes pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Mandy é professora de Artes no município de Ananindeua (PA).

 

A artista ingressou no universo dos quadrinhos em 2017, a convite do quadrinista Volney Nazareno, no Laboratório de Quadrinhos, pela Casa das Artes, em Belém (PA). Mandy contou que não tinha o hábito de ler e não conhecia sobre o universo das HQs, mas que, a partir da experiência, passou a se interessar pela arte. “Eu fui uma daquelas pessoas que cresce sempre escutando que quadrinho é coisa de menino, que é só coisa de super-herói. Então, quando eu tive realmente esse contato com essas pessoas que produziam e faziam vários tipos de quadrinhos, foi que me interessei por essa área e vi que tinha uma variedade enorme de pessoas e de histórias contadas”, relatou.

 

Desse encontro, nasceu o quadrinho Menina que vem de Itaiara, adaptação da obra da autora paraense Lindanor Celina. Mandy foi a única mulher a integrar a equipe de quadrinistas da HQ. Ela contou que Nazareno chegou a procurar outras artistas, mas não encontrou nenhuma com disponibilidade para atuar no projeto.

 

Desde a estreia, a ilustradora já integrou e teve trabalhos publicados em diversos projetos, como nas duas edições da revista do Coletivo Açaí Pesado; na zine O Obituário, publicação também desenvolvida no âmbito do referido coletivo; na HQ Meu Círio, premiada no IV Prêmio Proex de Arte e Cultura, realizado pela Pró-Reitoria de Extensão da UFPA, e no livro Mulheres & Quadrinhos, organizado por Dani Marino e Laluna Machado e vencedor de duas categorias do Troféu HQ Mix 2019.

 

Ao abordar a história das HQs, Mandy Barros trouxe para o debate questões importantes relacionadas à representatividade feminina, tanto em termos de personagens quanto no que diz respeito ao mercado de trabalho. Como ressaltado pela ilustradora, a história dos quadrinhos costuma ser contada a partir da popularização dos super-heróis, no período pós II Guerra Mundial. No entanto, antes disso já havia produção de HQs e um público amplo interessado nessas histórias.

 

Como observado pela quadrinista, as mulheres faziam parte deste mercado, mas acabaram sendo esquecidas na história mais popularmente narrada. “Isso tem relação, exatamente, com as histórias de super-heróis: com o fim da guerra e com a necessidade de se criar um aspecto mais otimista, foi criado este tipo de herói, este gênero de personagens heroicos, e se popularizou muito, principalmente entre homens”, explicou, ressaltando que é daí que vem a narrativa de que as HQs são coisas de meninos, de que essas histórias falam de homens superfortes.

 

A ilustradora também aborda a representação feminina em personagens de HQs, destacando que, ao longo da história, as mulheres foram comumente retratadas de forma sexualizada; como personagens irrelevantes, dependentes, psicóticas e que não traziam nenhum tipo de representatividade. “É aquela velha questão de que você tem uma personagem ali, mas ela só serve para conduzir a narrativa do personagem masculino, ela só serve como uma motivação inicial. Então, ela não tem nenhum tipo de profundidade”, explicou. Como exemplo, citou as personagens Lois Lane e Mary Jane, dos quadrinhos do Super-Homem e do Homem-Aranha, respectivamente, as quais ressaltou serem pouco trabalhadas, não possuírem muitas características fortes e não assumirem protagonismo nas histórias.

 

Como pontuado por Mandy, algumas produções atuais vão na contramão destes arquétipos e buscam construir personagens com características opostas a estas: personagens que tragam protagonismo, diversidade, independência e representem mulheres reais. “Isso é muito importante, porque você tem, nos quadrinhos, um padrão de mulher que é quase inalcançável! E aí a gente tenta trazer personagens que tenham problemas, que tenham alguns conflitos, que tenham personalidade forte. Isso geralmente incomoda a pessoa que está lendo. Mas é como as pessoas são na realidade!”, ponderou.

 

 

 

A ilustradora também abordou a expressão “mulher na geladeira”, cuja origem remete a uma HQ do herói Lanterna Verde (1994), na qual ele encontra a namorada, aos pedaços, dentro da geladeira. Posteriormente, explicou Mandy Barros, isso foi lido como uma violência gratuita e foi sendo percebido um padrão de tratamento violento da mulher nos quadrinhos, usado para conduzir a motivação do herói. Desde então, o termo é usado não somente para se referir àquelas personagens femininas que são inseridas nos quadrinhos como âncora e motivação para as histórias dos protagonistas masculinos, mas também para se referir, metaforicamente, às profissionais que atuam nos bastidores das produções de HQs e que não são devidamente reconhecidas por seus trabalhos.

 

Para Mandy, uma das formas de conseguir vencer esse tipo de metáfora e comportamento é ler e entender mais sobre as histórias produzidas por mulheres. “Porque, para você conseguir transmitir todas as características e peculiaridades de ser mulher, sem ser uma coisa estereotipada, sem ser uma coisa muito taxativa, muito forçada, é muito interessante você ter mulheres trabalhando em protagonistas mulheres”, opinou. “Eu acho superimportante que a gente tenha essa consciência de que mulheres são necessárias no universo dos quadrinhos, mulheres têm que continuar produzindo, têm que continuar protagonizando histórias. É isso que vai trazer um referencial novo para a sociedade, porque se você representa a violência gráfica em um quadrinho e você trata aquilo como uma coisa normal, é natural que no seu comportamento social você veja a violência contra a mulher de uma forma natural”, complementou.

 

A ilustradora também falou sobre a necessidade de se gerar mais oportunidades para as mulheres nos quadrinhos, inclusive na área de formação profissional; sobre a importância de produções independentes para a representatividade feminina e de outros grupos “minoritários”; sobre o uso da Internet para aproximação de profissionais da área, dentre outros temas relevantes e necessários. Você pode conferir a íntegra da palestra aqui.