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Primeira mesa de debates da HQWeek! 2021 aborda as redes sociais digitais como espaço de divulgação de quadrinhos LGBTQIA+

Lima Neto

Por Helena Amaral

 

Com o tema “LGBTQIA+: Conquista de espaços nas redes sociais”, foi realizada, na noite dessa segunda-feira (26/07), a primeira mesa de debates da edição 2021 da HQWeek!. A condução da conversa ficou por conta do quadrinista, pesquisador e crítico de quadrinhos Lima Neto, que é também colaborador do site Raio Laser, parceiro na organização do evento. Para a conversa, Neto recebeu a ilustradora e quadrinista Alice Pereira; o cartunista, autor e editor de HQs, Mário César, e a quadrinista, roteirista e ilustradora Lalo (Clara Sousa).

 

Em suas considerações iniciais, Lima Neto ressaltou que as HQs saíram de um espaço periférico – não central – e vêm ganhando validação no campo artístico. No contexto atual, destacou ele, o quadrinho digital tem representado um aspecto relevante dessa nova formação das HQs. “O quadrinho digital vem como uma opção, um espaço livre para [o/a quadrinista] divulgar seu material e produzir linguagens”, ressaltou o crítico.

 

A ilustradora Alice Pereira iniciou sua carreira em 2016, com A História do Petróleo em Quadrinhos, em versão impressa. No ano seguinte, começou a produzir tiras para as redes sociais digitais e criou a página Pequenas Felicidades Trans, na qual relata seu processo de transição de gênero. Alice contou que fez um planejamento e buscou formatos que melhor se adequassem ao meio.

 

A quadrinista também relatou que, embora não tenha muitos/as seguidores/as e seus conteúdos não viralizem, ela tem um bom retorno de seu público, tanto em termos de vendas de quadrinhos quanto de oportunidades de trabalho. “Eu acho que é muito variável essa questão do retorno: às vezes você tem 100 mil seguidores e não tem o mesmo retorno se você tem cinco mil”, observou.

 

Embora tenha passado a explorar formatos específicos da Internet depois que uma imagem de seu drama juvenil LGBTQIA+ PQ CA? viralizou nas redes sociais, Lalo também disse ter poucos seguidores nessas plataformas. “O que viralizou foi a minha tirinha, mas eu não viralizei junto não!”, brincou.

Lalo também ressaltou que, ao mesmo tempo em que confere uma visibilidade maior aos trabalhos, o ambiente da web muitas vezes não permite que o/a profissional tenha uma ideia do tamanho de seu público. Um exemplo é que, mesmo não tendo muitos seguidores em sua conta no Instagram, ela teve um resultado bem sucedido em uma campanha de crowdfunding, feita para arrecadar recursos e financiar um trabalho desenvolvido em parceria com outros e outras colegas quadrinistas.

 

Para Lalo, que disponibiliza suas produções independentes de forma gratuita na Internet, o apreço pelo impresso ainda tem seu espaço e diz mais respeito aos hábitos e à vontade de colecionar. Nesse contexto, ela afirmou ter observado que publicar a íntegra dos trabalhos na web ajuda nas vendas das versões impressas. “Tem essa mentalidade básica de que, se está na Internet, as pessoas não vão comprar, porque elas já leram. Mas é o contrário: as pessoas leem, gostam e aí elas vão atrás para comprar [o impresso]”, ponderou.

 

O cartunista e editor de HQs Mário César também ressaltou o impacto da divulgação de trabalhos nas redes sociais digitais para a venda de quadrinhos impressos. Embora tenha passado maior parte da carreira dedicando-se ao referido formato de publicação, ele também aposta na Internet como forma de divulgar e tornar acessível seu trabalho, e disse que esse uso tem sido vantajoso.

 

De acordo com Mário César, disponibilizar sua HQ Bendita Cura nas redes sociais ajudou na formação de público para a versão impressa. O quadrinho conta a história de um personagem que é submetido a vários tratamentos, desde a infância, na busca de uma suposta cura para sua homossexualidade. A opção por disponibilizar o trabalho de forma gratuita na Web se deu em função da importância da temática. “Como era um tema que eu achava que tinha uma relevância social muito importante, eu queria que esse quadrinho chegasse à maior quantidade de pessoas possível”, contou, lembrando que as HQs ainda são um produto inacessível à boa parte da população brasileira, visto serem relativamente caras.

 

 

Os integrantes da mesa também conversaram sobre as lógicas dos algoritmos das redes sociais digitais e as dificuldades decorrentes destas lógicas em termos de circulação dos conteúdos. Lalo ponderou que, nestas plataformas, são comportamentos como os de blogueiros/as – com postagens e interações mais constantes – que geram mais visualização. Complementando a fala da quadrinista, Alice Pereira relatou que, muitas vezes, suas postagens de viés pessoal são mais curtidas do aquelas de caráter profissional.

 

Questionadas/o por Lima Neto, as e o convidado também falaram sobre situações de preconceito e ofensas recebidas no ambiente das redes. Neste contexto, Mário e Alice ressaltaram como as políticas destas plataformas dificultam a remoção desse tipo de postagem: embora se denuncie, nem sempre as mesmas são tiradas do ar.

 

Mário também relatou lidar com situações de preconceito, dentro e fora do ambiente da Web. Ele contou que, quando começou a publicar quadrinhos, ainda não havia assumido sua homossexualidade. A partir do momento em que se assumiu e passou a fazer HQs com a temática LGBTQIA+, começou a sofrer preconceito.

 

O quadrinista destacou, ainda, que o preconceito se dá também no mercado de trabalho e observou que no mainstream dos quadrinhos há poucos/as profissionais e personagens LGBTQIA+.  Ainda de acordo com ele, hoje em dia profissionais das HQs que trabalham com a temática LGBTQIA+ recebem mais convites para participar em feiras e outros eventos da área, mas no início esse convite se direcionava apenas a conversas e atividades relacionadas à referida temática. Neste sentido, destacou a preocupação da POC CON – Feira LGBTQ+ de Quadrinhos e Artes Gráficas da qual é um dos organizadores – em contemplar outras temáticas do universo dos quadrinhos. “A gente vê que às vezes tem que suar dobrado, triplicado para conseguir o mesmo espaço que às vezes um artista branco heterossexual vai conseguir com mais facilidade”, desabafou.

 

O e as convidadas também responderam a perguntas do público, falaram sobre seus trabalhos mais recentes e sobre outras experiências no universo dos quadrinhos e das artes gráficas. Para conferir a íntegra do bate papo, clique aqui.