Por Monique Campos
O professor da Faculdade de Comunicação da UFJF e líder do Laboratório de Mídia Digital (LMD), Carlos Pernisa Júnior, e a mestranda pelo PPGCOM/UFJF e integrante do LMD, Larissa Rodrigues Natalino, apresentaram trabalhos no Encontro Virtual da ABCiber – Associação Brasileira de Pesquisadores em Cibercultura, realizado nos dias 30 de junho e 1 de julho de 2020. Os dois pesquisadores integraram o grupo de trabalho (GT) 1 do ABCiber, que teve como temática a cibercultura e sua importância nas novas formas de comunicação humana em tempos de crise.
Pernisa propôs uma reflexão sobre o momento atual a partir do conceito de circulação midiática, em “como as informações transitam não só nos meios de comunicação, mas para além deles, nas diversas camadas da sociedade”. O professor destacou duas questões que envolvem a circulação no contexto das tecnologias digitais em rede: a desinformação – disseminação daquilo que é descontextualizado ou recontextualizado, pouco confiável, deturpado ou falso – e o excesso de informação, esta última favorecendo a disseminação de informações falsas ou fora de contexto, principalmente porque o compartilhamento de conteúdos se dá sem qualquer discussão ou visão crítica. Pernisa explica que o ambiente da rede traz um outro modelo de construção e divulgação das notícias, bem como outras formas de atuação das pessoas, se comparado à comunicação de massa.
Conteúdos falsos ou deturpados são compartilhados nas redes de forma rápida e abrangente, muitas vezes sem possibilitar espaços para a produção de sentido. O que evidencia as problemáticas da comunicação digital, conforme ressaltou Pernisa em sua fala. Há necessidade de se observar e enfrentar tais questões em termos de circulação, segundo defende o professor, já que “a informação se mostra como um dos mecanismos mais eficazes para se poder lidar com a pandemia”.
A mestranda Larissa Rodrigues apresentou um estudo sobre a manifestação contra o machismo e a violência contra as mulheres intitulada Un Violador Em Tu Camino, que aconteceu em 2019. O protesto começou com ações de um grupo feminista chileno e transpôs as fronteiras, a partir da sua característica enquanto movimento em rede. Voltando-se para as teorias que versam sobre as representações sociais, expressões de gênero e do net-ativismo, a pesquisadora observou as repercussões e a “viralização” do protesto, sua ampliação das questões locais para um diálogo global. Além disso, apresentou as formas de divulgação da manifestação nas redes digitais e suas continuidades, com a convocação das pessoas para as ruas e inspiração para outros atos pelo mundo afora.
Analisando a manifestação enquanto expressão de net-ativismo, Larissa também se voltou para as questões de circulação midiática, a partir da hashtag#UnVioladorEnTuCamino, e fez alguns apontamentos da análise de discurso da letra da música utilizada no protesto, assim como da coreografia. A mestranda chama a atenção para as novas formas de identificação social, as conexões midiáticas virtuais, como as hashtags, e a criação de espaços coletivos onde ocorrem reivindicações de ativismo. No cenário contemporâneo, essas expressões de ativismo se apoiam cada vez mais nas dinâmicas das redes sociais digitais, conforme considera a pesquisadora.
Novas formas de se comunicar e as perspectivas da ciência em tempos de pandemia
O Encontro Virtual da ABCiber teve como tema central “Reconfiguração da Vida, Ciência Colaborativa e Futuro Online”, propondo uma análise sobre a grave pandemia que assola o mundo sob a perspectiva do papel da ciência na sociedade e a ampliação da vida digital. Após a mesa de abertura, que contou com discursos da equipe organizadora na manhã de 30 de junho, o professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Eugênio Trivinho, conduziu a palestra de abertura do Encontro Virtual da ABCiber com o tema “Comunicação, necropolítica neofacista e futuro democrático: o destino das liberdades civis na época de sua vulnerabilidade digital”. O palestrante discursou sobre o cenário político e as tendências sociais da cibercultura no Brasil, tocando em assuntos como defesa das liberdades civis, algoritmo e vigilância eletrônica, espalhamento de fake news, redes sociais, plataformas de relacionamento e como tudo isso se relaciona com o neofacismo no Brasil e a configuração da necropolítica.
Na noite de 30 de junho aconteceu a mesa de conferência virtual “Ciência colaborativa, cultura online, inovação educacional e comunicacional”. As debatedoras foram a professora da Universidade de São Paulo (USP), Sueli Mara Ferreira, e a artista e professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (UESC), Yara Guasque. A mesa teve a mediação de Lucilene Cury. Sueli Mara trouxe para a discussão a questão de como uma pandemia reacende o debate sobre o impacto da legislação do direito autoral no acesso à informação. Ela abordou questões como a garantia do direito humano de acesso à informação e os mecanismos de controle, proporcionando um repensar sobre as políticas informacionais e a legislação brasileira. Já Yara Guasque relacionou o ser humano pesquisador ao meio ambiente, refletindo sobre a economia capitalista, as experiências humanas com os desastres e as questões que envolvem comunidades científicas e políticas.
A segunda mesa de conferência, realizada na manhã de 1 de julho, teve como tema “Cibercultura e a reconfiguração da vida” e contou com a participação do professor da Universidade Metodista de São Paulo, Sebastião Squirra, e do professor Universidade Paulista, Jorge Miklos. A moderação foi de Ariovaldo Folino Júnior. Squirra discursou sobre a evolução informativa atual, pontuando as mudanças nos territórios, pertencimentos sociais e temporalidades. O professor fez uma contextualização dos dilemas atuais da humanidade, como a aceleração da vida. Miklos mencionou alguns desafios que a pandemia está nos deixando e provocou uma discussão sobre o que é posto como o “novo normal”. Ele destacou o cotidiano sistematicamente reinventado, fazendo menções ao mundo do trabalho, da educação e da vida privada.
Encerrando o evento, na noite de 1 de julho, foi realizada a mesa “Biopolítica e vigilância algorítmica em tempos de pandemia”. Os debatedores foram o professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), Sérgio Amadeu, e a professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ivana Bentes. A mediação ficou a cargo de Alessandra Marassi. Amadeu relacionou as atividades econômicas das grandes plataformas à lucratividade na pandemia. Ele também trouxe para o debate a problemática de como a coleta de dados pessoais faz com que a comunicação digital alimente o neoliberalismo e abordou a questão do “colonialismo digital”. Bentes reforçou alguns pontos apresentados por Amadeu e acrescentou as relações estabelecidas entre vigilância algorítmica e o regime de fake news, explicou o que ficou conhecido como “extrativismo de dados” e discursou sobre a necessidade de criação de novas institucionalidades que detenham esses riscos citados.
As mesas de conferência do Encontro Virtual da ABCiber foram transmitidas no canal da TV UNIFAE na plataforma Youtube. O evento contou ainda com mais de 200 apresentações de trabalhos, que foram divididos em três grupos: GT1 – A cibercultura e sua importância nas novas formas de comunicação humana em tempos de crise; GT2 – As atividades educacionais e o uso das tecnologias digitais; GT3 – Ciência colaborativa e a perspectiva do fazer científico contemporâneo. As discussões dos GTs aconteceram em diversas salas virtuais utilizando a plataforma ZOOM.