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Live do LMD aborda a desinformação no contexto da pandemia de coronavírus

LMD LIVES 2

Por Helena Amaral

 

As fake news e a pós-verdade em tempos de pandemia foram tema da segunda edição do LMD Lives, realizada na noite dessa segunda-feira (08/06). Iniciativa coordenada pelo Laboratório de Mídia Digital (LMD), o LMD Lives tem como objetivo promover discussões online voltadas, principalmente, à comunicação e suas interfaces com diversas áreas.

O debate dessa segunda-feira foi conduzido pelo coordenador do Laboratório e professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (PPGCOM-UFJF) Carlos Pernisa Júnior. Como esclarecido pelo docente ao iniciar sua explanação, a discussão ali proposta não se ateve a questões políticas e/ou de saúde, mas a considerações sobre como a pandemia tem afetado a comunicação.

Para tanto, Pernisa Júnior voltou-se a dois aspectos principais que permeiam a comunicação na contemporaneidade, com enfoque no contexto da pandemia de Covid 19: as fake news e a pós-verdade. Sobre as primeiras, o pesquisador esclareceu estarem relacionadas a dois tipos principais de notícias: àquelas efetivamente falsas, cuja inveracidade pode ser verificada, e àquelas elaboradas para não serem detectadas como tal, mas que, embora se valham de fatos verídicos, são construídas de forma a confundir os leitores.

Como exemplo destas últimas, cita divulgação de um vídeo no qual o médico Drauzio Varella diz não haver justificativa para mudanças de hábitos em decorrência do novo coronavírus. Feito no final de janeiro de 2020, quando a doença ainda encontrava-se no início e concentrava-se, principalmente, na China, o conteúdo foi retomado por algumas pessoas em meados de abril, quando o cenário já era de uma pandemia mundial.

O fato de que àquela altura o médico havia retirado o conteúdo de suas redes sociais, bem como feito outros ressaltando a dinamicidade do vírus e a necessidade de seguir as recomendações de isolamento, não impediu que o material fosse compartilhado. Ao se fazer uso descontextualizado da fala de um profissional de saúde renomado e conhecido da população brasileira, cria-se um cenário de desinformação. “Não é só uma notícia comprovadamente falsa que confunde as pessoas. Notícias deturpadas, fora de contexto, também produzem esse efeito”, ressaltou Pernisa Júnior.

Com relação ao conceito de pós-verdade, o docente disse acreditar ter “menos ligação com o que é verdade e muito mais ligação com uma ideia de crença, de fé”. Trata-se, então, de um contexto no qual o indivíduo acredita em algo a despeito de comprovações científicas e/ou argumentos que contrariem aquele fato. Dentre outras razões, tal crença pode ser atribuída à confiança que a pessoa tem na fonte que lhe repassou aquela informação ou por aceitar, ver sentido nas comprovações que lhes são apresentadas.

No cenário da pandemia, o pesquisador retoma como exemplo de pós-verdade o uso da cloroquina no combate ao coronavírus. Como argumentou Pernisa Júnior, se a pessoa acredita ou não que o remédio faz efeito contra a Covid 19, isso está mais ligado à ideia de crença do que à ideia de uma comprovação cientifica clara, tendo em vista que não há resultados conclusivos sobre os efeitos da substância no organismo dos pacientes com a enfermidade.

Os exemplos retomados pelo pesquisador evidenciam como a compreensão das fake news e da pós-verdade são importantes para o entendimento de como o país tem enfrentado a pandemia. “Notícias sem comprovação, comprovadamente falsas, fora de contexto, sem uma fonte confiável, estão circulando todos os dias no país, por muitos meios, e podem estar atuando, claramente, na disseminação de conceitos que muito mais confundem as pessoas do que as esclarecem”, argumentou Carlos Pernisa. O docente ainda complementou ressaltando que, quando não informadas, as pessoas lidam pior com a doença, suas consequências e questões de entorno.

A um cenário caracterizado por dificuldades de acesso a informações confiáveis sobre a Covid 19 e, muitas vezes, pela ausência de um olhar crítico sobre as notícias recebidas, somam-se um movimento de negação – em especial, da ciência -, a circulação de notícias em grupos fechados de aplicativos de mensagens, o uso da tática da não informação e o excesso de informações.

No que diz respeito ao negacionismo, o docente citou os movimentos antivacinas e as consequências de âmbito global resultantes das posturas de não imunização adotadas por seus integrantes. Já com relação aos grupos fechados em aplicativos de conversa, ele ressaltou ser mais difícil conter as notícias falsas que circulam nestes meios: se o indivíduo acredita somente no que recebe nestes aplicativos, há mais probabilidades de ser colocado frente a notícias que não são comprovadas e de não ter acesso a pontos de contestação sobre as informações ali recebidas.

Remetendo às decisões adotadas pelo governo federal na última semana, relativas à divulgação de dados sobre a Covid 19 no Brasil, Pernisa Júnior também chamou atenção para as consequências da não informação. “Não falar sobre um assunto, faz com que haja a sensação de que aquele assunto não existe ou que ele não tenha importância”, argumentou.

Ao retomar um episódio da década de 70, quando o governo militar escondeu um surto de meningite que teve início em São Paulo e resultou em uma epidemia da doença, o docente ressaltou que “deixar de falar em número de infectados e mortos pela Covid ou tentar alterar/mascarar dados sobre a doença – sua evolução, número total de casos e mortes – pode causar grandes problemas”.

No entanto, assim como a não informação, o excesso de informações também pode ter graves consequências. De acordo com o pesquisador, se não conseguimos enxergar o contexto dos fatos e se recebemos uma enxurrada de notícias – dificultando, inclusive, a distinção entre informações falsas e verdadeiras – podemos acabar desinformados. Como alternativa possível, Pernisa Júnior apontou o diálogo, que pode se dar na abordagem dos fatos com outros indivíduos ou na consulta às informações divulgadas por diferentes veículos de comunicação.

A despeito dos desafios comunicacionais destes tempos de pandemia, o expositor destacou que o momento também tem sido marcado por movimentos de renovação da crença na ciência e na imprensa. “Pesquisas feitas a partir de março indicam que o número de pessoas que afirmam acreditar na ciência e se informar em veículos tradicionais de imprensa tem crescido a partir da pandemia”, ressaltou.

Tal cenário, de acordo com o docente, contribui para o combate e/ou a redução na circulação de fake news, bem como na questão da pós-verdade, na medida em que as pessoas passam a se informar mais e a convencer-se do papel da ciência em detrimento de “achismos” e notícias falsas.

RESPONDENDO AO PÚBLICO

O professor Carlos Pernisa Júnior também respondeu a questionamentos feitos pelo público durante a transmissão. A situação do jornalismo na contemporaneidade, as maneiras de identificar notícias falsas, as consequências do isolamento nas chamadas bolhas sociais e o papel da educação midiática na luta contra a desinformação foram alguns dos temas abordados por quem acompanhou a live.

Para conferir as respostas, clique aqui e confira a íntegra da live.