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Livro Infantil: Que barulho é esse?

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O bioma da Mata Atlântica abriga uma enorme diversidade de anfíbios anuros, muitos dos quais estão espalhados por fragmentos de matas próximas a áreas urbanas. Como vimos no livro, nossa história se passa no Jardim Botânico da Universidade Federal de Juiz de Fora, localizado na mesma cidade, na Mata do Krambeck, onde são conhecidas até o momento mais de 20 espécies de anuros. Nesta sessão, você irá conhecer, com maiores detalhes, as espécies de anfíbios anuros que estão presentes no livro “Que barulho é esse? Descobrindo os Anfíbios do Jardim Botânico de Juiz de Fora”.


Foto: Matheus Neves

Phyllomedusa burmeisteri (perereca-macaco ou perereca-da-folhagem) – Família Hylidae: É uma espécie de perereca com ampla distribuição nos estados da região Sudeste do Brasil. Tem porte médio (aprox. 5,5 cm), um dorso de coloração verde e uma região lateral azulada com manchas arredondadas de coloração amarela. Este padrão geral de coloração (dorso esverdeado e laterais coloridas) é típico do gênero Phyllomedusa e da subfamília Phyllomedusinae, de forma geral. A coloração chamativa nas laterais do corpo permite alertar possíveis predadores sobre sua toxicidade, o que na ecologia é chamado de aposematismo. Diferentemente de outras pererecas, possuem um dedo opositor que tem uma função semelhante ao polegar dos primatas, que lhes permite se locomover pelos galhos das árvores como fazem os macacos. É por isso que seu nome popular pode também ser perereca-macaco. Seu comportamento reprodutivo é complexo, com diferentes tipos de cantos emitidos dependendo do contexto social, além de realizar sinalizações visuais. Os machos emitem vocalizações em elevadas posições nos galhos e folhagens das árvores para atrair as fêmeas, quando então o casal entra em amplexo, e a fêmea desova em folhas próximas a corpos d’água. O nome de perereca-da-folhagem, adotado no livro, vem deste fator. Como mostrado no livro, os girinos desta espécie eclodem das folhas e caem no corpo d’água, onde completam seu desenvolvimento.

 


Foto: Matheus Neves

Leptodactylus latrans (rã-manteiga) – Família Leptodactylidae: É uma espécie de rã que possui uma ampla distribuição na região costeira do Brasil. Podem ser facilmente encontradas e toleram diversos habitats, desde campos modificados pelo ser humano a florestas. São anuros de porte grande (aprox. 9,5 cm), e os machos podem ser maiores em tamanho que as fêmeas, o que é algo raro em anuros. Os machos costumam apresentar braços bem largos e musculosos, os quais utilizam em contexto de disputa e para manter a fêmea em amplexo. Assim como na grande maioria das espécies de Leptodactylidae, possuem um modo reprodutivo bastante peculiar: as fêmeas produzem uma substância semelhante à clara do ovo, que é eliminada juntamente com os ovócitos. Durante a desova, machos e fêmeas batem as pernas para transformar esta substância em espuma. Ou seja, dizemos que as desovas ocorrem em ninhos feitos de espuma, neste caso dentro de corpos d’água. Acredita-se que esses ninhos ajudam a proteger os ovos contra a dessecação e predadores. Ainda assim, as fêmeas de Leptodactylus latrans investem no cuidado parental, mantendo-se bem próximas aos girinos, e exibindo comportamentos agressivos para protegê-los.


Foto: Matheus Neves

Physalaemus cuvieri (rã-cachorro) – Família Leptodactylidae: É uma espécie de rã que pertence à família Leptodactylidae, com ampla distribuição na América do Sul. De porte pequeno (aprox. 3 cm), podem variar muito na coloração, desde tons mais terrosos até esverdeados. Durante a vocalização, os pulmões e sacos vocais dos machos se enchem muito de ar, e, com isso, é comum serem encontradas boiando enquanto vocalizam na superfície de corpos d’água temporários ou permanentes. O canto dessa espécie é bem peculiar, com uma estrutura harmônica, semelhante a uma onomatopéia de um latido de cachorro. Assim como ocorre em Leptodactylus latrans, após a oviposição, os ovos ficam protegidos por um ninho de espuma, fixados em vegetações na água.


Foto: Pedro Aguiar

Dendropsophus branneri  – Família Hylidae: É uma espécie de perereca que pertence à família Hylidae, com distribuição no Sudeste e Nordeste do Brasil. São identificadas no Jardim Botânico por terem uma mancha branca embaixo dos olhos. Devido ao seu porte pequeno (aprox. 2 cm), podem se tornar presa de outros invertebrados que compartilham o mesmo ambiente, como aranhas. Possuem uma reprodução do tipo prolongada, que se estende por praticamente o ano todo. Os machos podem ser encontrados vocalizando empoleirados em vegetações arbustivas a poucos centímetros da superfície de brejos ou outros corpos d’água. Os machos emitem cantos agressivos para outros da mesma espécie, e, em último caso, podem até entrar em combate físico. O seu canto de anúncio, usado para atrair as fêmeas, é composto pela repetição de apenas uma nota curta e aguda.


Foto: Pedro Aguiar

Dendropsophus elegans – Família Hylidae: Também é conhecida popularmente como perereca-de-moldura. Tem uma ampla distribuição no Brasil, nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste. Possui porte pequeno (aprox. 3 cm), porém maior do que as outras pererecas do mesmo gênero encontradas no Jardim Botânico. É facilmente identificada por uma mancha aproximadamente retangular de coloração marrom no dorso, envolta por outra mancha em forma de moldura de coloração branca ou amarela, que pode variar conforme a hora do dia. Os machos podem ser encontrados vocalizando em vegetações arbustivas próximas a corpos d’água em áreas abertas ou nas bordas de florestas. O seu canto de anúncio é composto de duas notas agudas. No Jardim Botânico, já foi encontrada em amplexo (acasalamento) com um juvenil de Boana semilineata, o que chamamos de amplexo interespecífico, uma situação claramente desvantajosa do ponto de vista reprodutivo.


Foto: Matheus Neves

Dendropsophus decipiens – Família Hylidae: É uma perereca de porte pequeno (aprox. 1,6 cm) com distribuição na região Sudeste e Nordeste. Habitam áreas abertas ou florestadas, onde é possível encontrar os machos vocalizando em vegetações próximas às poças, brejos ou lagos. A desova ocorre em folhas acima dos corpos d’água para que os girinos possam cair ali diretamente, após a eclosão. Como foi visto no livro, no Jardim Botânico, essa espécie divide o espaço com as D. branneri e D. elegans. De acordo com resultados de uma Iniciação Científica do laboratório (dados não publicados), foi descoberto que elas ficam empoleiradas em diferentes alturas da vegetação, como uma possível estratégia para evitar a sobreposição do sítio de vocalização.


Foto: Matheus Neves

Boana faber (sapo-martelo) – Família Hylidae: É uma perereca com ampla distribuição na região costeira do Brasil e em parte do Paraguai e Argentina. De porte grande (aprox. 8,8 cm), é a maior perereca e uma das maiores espécies encontradas no Jardim Botânico. Pode ser facilmente identificada por geralmente possuir uma linha horizontal escura que se estende do focinho até o seu dorso, e por ter os tímpanos bem definidos. Durante a estação reprodutiva, os machos constroem ninhos formando uma depressão na lama, popularmente chamados de panelas, e os guardam para se reproduzirem ali. Ainda nesse período, se mostram bastante agressivos, e durante contextos de briga utilizam de um espinho que se encontra próximo ao dedo, para ferir outros machos. Após a oviposição, dependendo do número de machos que ali se encontram, podem ou não realizar cuidado parental. Se há muitos machos, eles permanecem cuidando da desova, pois há uma chance de outro macho querer roubar seu local de oviposição, o que pode prejudicar o desenvolvimento dos seus filhotes.


Foto: Matheus Neves

Rhinella ornata (sapo-cururuzinho) – Família Bufonidae: É uma espécie de sapo com ampla distribuição por regiões de Mata Atlântica do Brasil e partes do Paraguai. É um anuro de médio porte (aprox. 7 cm), possui coloração em tons terrosos e apresenta uma glândula de veneno atrás de cada olho (glândula parotóide), que não é tão grande como de outras espécies do mesmo gênero. É comumente encontrado em áreas abertas e florestadas, na serrapilheira. Utilizam poças, lagoas e brejos como local de reprodução, onde ocorre a desova. Podem ter reprodução explosiva e, portanto, há uma alta densidade de machos, em que muitos se agregam para tentar entrar em amplexo com uma única fêmea. Muitas vezes, os machos cometem erros e acabam agarrando outros machos. Estes avisam sobre o erro ao emitir o que se conhece como canto de soltura. Os indivíduos de Rhinella ornata podem acasalar com uma outra espécie próxima e muito semelhante, Rhinella crucifer, formando o que chamamos de híbridos. Por isso, é possível que haja uma indefinição da espécie real existente no Jardim Botânico.


Foto: Matheus Neves

Haddadus binotatus (rã-do-folhiço) – Família Craugastoridae: Apresentam ampla distribuição nas regiões Sul, Sudeste e Bahia. É uma espécie de anuro de porte médio (aprox. 4,8 cm), com hábitos terrestres. É muito comum de ser encontrada na serapilheira da Mata Atlântica, onde sua reprodução ocorre, diferentemente da maioria dos anuros, que tem reprodução na água. As fêmeas desovam uma pequena quantidade de ovos de tamanhos maiores do que o normal para a maioria dos anuros, não havendo estágio larval, ou seja, o desenvolvimento é direto. Apesar de, no livro, a rã-do-folhiço estar do lado de sua desova, não há registro de cuidado parental para a espécie, ou seja, os ovos são depositados e deixados para que os filhotes se desenvolvam sozinhos.

 


Foto: Matheus Neves

Scinax crospedospilus – Família Hylidae: É uma perereca com ampla distribuição no sudeste do Brasil. De porte pequeno (aprox. 3 cm), seu corpo tem uma coloração esverdeada e amarelada, com manchas marrons irregulares no dorso e olhos avermelhados. Podem ser encontradas empoleiradas em diferentes alturas nas vegetações próximas a corpos d’água. É também comum encontrá-las em bromélias utilizando-as como abrigo e sítio de vocalização. Assim como a grande maioria dos hilídeos, sua estrutura de reprodução é do tipo lek, ou seja, em anfíbios, os machos cantam empoleirados para atrair as fêmeas, que após o amplexo, os carregam para os corpos d’água no chão, onde ocorre a desova. Não há registro de desova nas bromélias, apesar de haver registros de machos que foram encontrados na mesma bromélia após alguns meses. Sabe-se que para os machos desta população do Jardim Botânico, os seus cantos estão relacionados com a produção de seus espermatozoides. Assim, alguns machos podem investir desigualmente ou igualmente na sua reprodução, podendo até mesmo indicar para a fêmea seu status de fertilidade.

 

Quer saber mais sobre as espécies de anfíbios anuros do Jardim Botânico e de Juiz de Fora? Neste artigo (em inglês), há o registro de todas as espécies do município até o momento.


Referências

 

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Glossário

 

Amplexo: é o abraço nupcial que o macho realiza na fêmea. Alguns estudos demonstram que o tipo de amplexo facilita a justaposição das cloacas durante a fertilização, que é externa (sem órgão copulador).

Canto de anúncio: É o canto mais emitido por machos, tendo função de atrair as fêmeas e manter um espaçamento entre outros machos da mesma espécie.

Reprodução explosiva: Ocorre quando os machos e fêmeas permanecem nos sítios de reprodução por um curto período de tempo, para se reproduzirem geralmente após chuvas intensas.

Sítio de vocalização: São áreas onde os anuros realizam suas vocalizações. A escolha dos sítios de vocalização pode ser influenciada pelas características específicas de cada espécie e pelo ambiente em que vivem. Em geral, os anuros tendem a preferir ambientes úmidos onde o som possa se propagar de maneira eficaz, o que inclui áreas próximas a corpos d’água e regiões florestais.

Tímpano: Em anfíbios anuros, o tímpano é redondo e são externos. São as estruturas de recepção das ondas sonoras.