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Projetos

Antropologia da saúde: perspectivas na pós-pandemia (CNPq 2022-2024)

Equipe: Profa Dra Cristina Dias da Silva (coordenadora), Prof. Dr. Diogo Neves e Profa. Dra Lilian Chaves, Izabella Azevedo, Vitória kaizer, José Portes.

Este projeto de pesquisa tem como objetivo analisar as percepções e perspectivas de certo conjunto de atores sociais considerados centrais às experiências da pandemia de Covid-19 no Brasil, quais sejam, profissionais da saúde, profissionais da educação, assim como vítimas e/ou familiares de vítimas da doença. Para isso, considerar-se-á alguns processos que tomaram lugar nos espaços públicos a respeito da percepção de risco e da relação entre individual e coletivo. O Brasil, como um dos países mais afetados, se tornou epicentro de um debate sobre os limites e possibilidades de cooperação e solidariedade como estratégias de enfrentamento coletivo. Por outro lado, referências sobre a relação entre saúde pública e desigualdade social de longo prazo ensejaram múltiplas críticas à noção abstrata de coletividade. A ideia de uma linha de frente se tornou naturalizada logo após os primeiros dias de pandemia confirmada. Ao longo dos meses, tal noção foi se tornando problemática, na medida em que a linha de frente foi se expandindo na direção de outras categorias profissionais para além do campo da saúde. Nesse sentido, os variados discursos sobre sociedade, indivíduo e coletividade ganharam relevo nos discursos públicos e nas redes sociais.

O objetivo desta pesquisa é, através de entrevistas em profundidade com os atores sociais acima citados – sujeitos considerados centrais à experiência de gestão do cotidiano da pandemia – apresentar distintos modos de compreensão da pandemia, tomada como um evento crítico, isto é, todo aquele evento capaz de reconstruir significados fundamentais da vida de um grupo ou sociedade. A experiência do sofrimento, em um contexto crítico, é tanto de ordem direta como indireta, e se une a múltiplos fatores, para além do evento mórbido em si mesmo: sofremos como indivíduos e como coletividade e, por este processo, reorganizamos formas de pensar e sentir. Assim, propomos realizar um exercício reflexivo de caráter antropológico no qual múltiplos significados da pandemia possam ser considerados, apontando importantes conexões de sentido entre público e privado, entre sujeito e cultura. Como Lutz e White (1986) bem indicaram, as emoções que constituem as narrativas dos sujeitos não apontam apenas para um certo interior inescrutável, mas se articulam aos processos sociais mais abrangentes, pois os sentidos que elas possuem (dor, alegria, raiva, etc.) não podem ser compreendidos à revelia da conexão com os discursos socialmente erigidos em certo tempo/espaço. Tal perspectiva inaugurou novos debates sobre a relação sujeito (indivíduo) e cultura (sociedade), na qual a noção de indivíduo é pensada como uma categoria social por excelência, tendo seus modos de construção desvelados pelas investigações antropológicas desde então.

Palavras-chave: Antropologia da saúde, sofrimento, pandemia, saúde pública

Cronograma 

Identificação da Etapa Início (20/02/2022) Término (20/02/2024)
Levantamento e revisão de literatura fev/2022 fev/2023
Seleção e levantamento dos possíveis entrevistados nov/2022 dez/2022
Entrevistas fev/2023 mar/2023
Transcrição das entrevistas – literal abril/2023 jul/2023
Transcrição das entrevistas – minutagem jul/2023 ago/2023
Coleta de dados em mídias e redes sociais fev/2022 jan/2023
Análise conjunta dos dados fev/2024 fev/2024
Relatório final de pesquisa fev/2024 fev/2024

 

 

 Análise dos conceitos de corpo, dor e sofrimento nas principais obras de Veena Das (UFJF 2020-2021)

Coordenação: Profª Drª Cristina Dias da Silva

Bolsistas: Izabella Azevedo (Graduação BACH) e Thais Sousa (Graduação Ciências Sociais).

Voluntários: Hugo Quintela (pesquisador-Ifes-ES), Janis Fernandes (graduação Ciências Sociais), Monique Nascimento (Graduação Ciências Sociais), Tayene Dias (Graduação Ciências Sociais), Tainara Santos (Graduação Ciências Sociais), Pablo Henrique Ferreira (Graduação – BACH), Poliana Tavares (Graduação – BACH)

Descrição: O presente projeto de pesquisa é uma investigação sobre os conceitos de corpo, dor e sofrimento presentes nas principais obras da influente pesquisadora e antropóloga indiana Veena Das: Critical events (1995), Life and Words (2006) e Affliction (2014). O objetivo é discutir como tais conceitos se transformam ao longo de suas reflexões, que abarcam um extenso trabalho de campo sobre violências cotidianas e institucionais. Se por um lado, em meados dos anos 90, a preocupação central da autora era compor a relação entre silenciamento e o sofrimento social de grandes eventos críticos, como a partição da Índia, em Life and Words já podemos perceber um diálogo expressivo com a filosofia de Wittgenstein em torno de uma linguagem do possível, isto é, a possibilidade de narrar eventos ordinários e aparentemente menores. No terceiro momento, a obra mais recente Affliction, a pesquisadora propõe uma intersecção entre as duas vertentes, isto é, tratar-se-ia de narrar o cotidiano, no caso, o precário atendimento médico nas regiões periféricas de Nova Délhi, enquanto eventos críticos, produzindo uma narrativa antropológica capaz de alinhavar questões habitualmente percebidas como contrastantes. Vale ressaltar, ainda, que a discussão dos conceitos-chave só pode ser feita mediante o reconhecimento do contexto teórico-metodológico a partir do qual as pesquisas de Veena Das se inserem, a saber: a relação entre o pesquisador e as comunidades que estuda; as ações e os efeitos do tempo no trabalho de campo e; novas formas de escuta e narrativa da dor e do sofrimento.

Objetivos: Espera-se contribuir para adensar os debates sobre a relação entre corpo, dor e sofrimento, sobretudo servindo como subsídio para as pesquisas atuais em antropologia da saúde no Brasil, cujos contextos de atuação são muito similares aos que Veena Das explora, desde narrativas abundantes e complexas sobre violências cotidianas e institucionais, influenciadas sob certos aspectos pela desigualdade social, até narrativas subjetivas da dor e as dificuldades metodológicas do pesquisador em produzir textos que expressem tais percursos com verossimilhança. Nota-se, por tais razões, que o estudo das obras principais de Veena Das possui grande potencial de subsidiar debates não apenas na área de antropologia da saúde, mas também em sociologia da saúde, das emoções e estudos diversos sobre violência.

Cronograma

Consulta e debate da obra Critical events 01/08/2020 até 01/10/2020
Produção da primeira tabela conceitual 02/10/2020 até 15/10/2020
Consulta e debate da obra Life and Words 16/10/2020 até 16/12/2020
Produção da segunda tabela conceitual 17/12/2020 até 30/01/2021
Consulta e debate da obra Affliction 01/02/2021 até 01/04/2021
Produção da terceira tabela conceitual 02/04/2021 até 15/04/2021
Produção do consolidado final 16/04/2021 até 16/05/2021
Produção do relatório final e análise comparativas das obras 17/05/2021 até 17/07/2021
Divulgação dos dados consolidados no site do LAPS (Laboratório de pesquisas antropológicas em Política e Saúde) 18/07/2021 até 01/08/2021

2. Entre políticas do corpo: as medicinas alternativas e seus espaços de poder (pós-doutorado – ICS/Lisboa 2019-2020)

Autoria: Profª Drª Cristina Dias da Silva

Descrição: Este projeto de pesquisa tem como objetivo refletir sobre as chamadas medicinas alternativas, a partir de distintas e variadas experiências de trabalho de campo ao longo dos últimos quinze anos entre terapeutas, profissionais da enfermagem, médicos, profissionais da saúde pública, entre outros. Do ponto de vista de uma antropologia da saúde, as medicinas alternativas incluem as mais diversas iniciativas no campo dos processos de tratamento e cura de doenças, males e outros mal-estares físico-emocionais. Tais iniciativas se constituem e reconstituem continuamente ao longo dos anos, através da criação de espaços de poder, nos quais grupos variados e improvisados compartilham estilos ou filosofias de vida, concepções de corpo, pessoa e tempo. Embora haja um corte socioeconômico para a maioria das práticas aqui consideradas (método Rességuier, constelação familiar, ginecologia autônoma, fitoterapia, aromaterapia, terapia floral, terapia menstrual, meditação, terapias em grupo, entre outros), este recorte não pode explicar nem a diversidade interna destas práticas e nem suas diferentes epistemologias. Tais concepções vão se aglutinando em cenários francamente plurais, nos quais disputas contextuais por espaço e reconhecimento são tão importantes quanto as epistemologias em questão, inclusive porque nos fazem compreendê-las sob novos ângulos (Souza Lima, 2002a, 2002b, 2002c; Garnelo, 2003; Das, 2015; Dias da Silva, 2016).

Objetivos: O objetivo geral do projeto seria mapear formas de conexão entre saúde e política no fazer cotidiano dos terapeutas alternativos. É preciso, portanto, qualificar estes “espaços de poder” na saúde em que se negociam valores, identidades e noções de pessoa, mas se negociam também políticas de reconhecimento (Teixeira, 2012; Pussetti, 2006; Das, 2015). As etnografias na área da antropologia da saúde e da política no Brasil demonstram as profundas conexões históricas e etnográficas entre saúde e política, seja no debate da saúde indígena (Garnelo, 2003), seja no debate sobre os manejos políticos da diversidade cultural (Teixeira, 2012; Teixeira & Silva 2015), seja na comparação entre distintos sistemas de saúde (Neves, 2012), seja nos limites do debate sobre saúde mental (Chaves, 2013). A politização que se quer propor aqui como hipótese não é apenas a da consciência corporal, nos termos de um imaginário transcendental sobre o corpo, mas antes a percepção de uma política que é em si mesma corporal – para manter a noção de biopoder foucaultiano no horizonte – cuja ética se expressa em decisões que estão no corpo ou envolvem o corpo, seja para dar autonomia a este corpo, seja para discipliná-lo. De fato, o debate sobre autonomia e disciplina parece se aproximar nesse contexto epistêmico-político das medicinas alternativas. Por isso, é tão importante investigar mudanças nos próprios corpos destes terapeutas, isto é, a correlação entre ética e estética para este quasi-grupo pode indicar a presença de um sujeito encarnado, conforme os terapeutas corporais dos anos de 1980 no Rio de Janeiro (Russo, 1993)? Em repúdio a certa hierarquização da mente sobre o corpo das filosofias psicanalíticas dos anos pregressos? Essas perguntas, válidas naquele momento e contexto de pesquisa da autora, podem ser atualizadas para o contexto das medicinas alternativas, um momento de maior institucionalização de práticas alternativas? A questão que ressurge, embora práticas outrora marginais tenham atualmente mais espaços de poder, é a ciclicidade que se produz nas margens, um tipo de espaço de poder que não desaparece na medida da crescente institucionalização de práticas alternativas. Ao contrário, parece mais uma força que estruturalmente se opõe ao movimento de sua oficialização, tanto porque a espontaneidade desta troca está intensificada por meios de comunicação mais densos e sofisticados, seja porque a temática alternativa surge como uma força contra hegemônica. Nota-se, portanto, que a categoria marginal é disputada, ela é de interesse para os nossos nativos em foco, isto é, manter-se à margem da oficialidade burocrática do discurso médico sobre o sujeito torna-se um valor a ser cultivado pelas razões, essa é nossa hipótese, de uma filosofia política corporalmente engajada.

As políticas do/no corpo: cultura, cidadania e produção de conhecimento (2017-2019/FAPEMIG/UFJF)

Coordenação: Profª Drª Cristina Dias da Silva

Bolsistas Fapemig: Christian Oliveira Bernardo (Ciências Sociais) e Nathália Caroline Dias (Ciências Sociais)

Bolsistas UFJF: Arthur Dias Costa (Ciências Sociais) e Maria Carolina Gomes Aguiar (BACH)

Descrição: Este projeto busca reunir dois eixos de reflexão na Antropologia, com base em revisão bibliográfica e comparação de temas na produção bibliográfica da última década em duas de suas subáreas. Trabalho com a hipótese de que a antropologia da saúde e a antropologia da política, desenvolvidas como grandes linhas de pesquisa independentes no Brasil, produzem um debate convergente a ser investigado, que reúne elementos de uma teoria antropológica de inspiração francesa, focada em alguns temas caros para ambos os campos de produção intelectual: as políticas do corpo e seus regimes de poder; as inscrições sociais nos corpos por processos civilizadores; as políticas de saúde contemporâneas e as categorias de autoridade que emanam dos contextos de saúde pública e da rede de atores sociais envolvidos na prestação de serviços; estes últimos entendidos como direitos fundamentais dos cidadãos, tais como as políticas do Sistema Único de Saúde. Com anseios a mapear os contextos políticos que produzem – dentre uma diversidade de etnografias nacionais – corpos, práticas corporais e táticas disciplinares, o projeto se propõe a pensar as políticas de saúde a partir dos desdobramentos possíveis na produção acadêmica atual brasileira da noção de biopolítica.

A vertente francesa tem longa tradição no debate sobre os processos saúde/doença e a subsequente noção de corpo que os informa (Mauss 2003 [1950], Herzlich 1973, Canguilhem 1978, Bourdieu 1995 [1980], Foucault 2004 [1980], Boltanski 1989). Por um lado, a questão da representação do corpo e da doença, bem como as formas de classificação do normal e do patológico como categorias sociais tiveram o mérito de deslocar a noção de corpo do determinismo biológico centrado numa organicidade universal e produzir uma teoria na qual o corpo é um paradigma para refletir sobre a cultura. Por outro lado, as noções de Biopoder em Foucault e de habitus em Mauss (2003 [1950]) e Bourdieu (1995 [1980]) permitiram um aprofundamento desta teoria através do campo da saúde/corpo – tomado como objeto de pesquisa – em duas frentes: 1) as políticas da vida e os mecanismos de controle social e 2) as práticas corporais como índices de representações sociais relacionadas à distinção indivíduo e pessoa e do individualismo subjacente às práticas biomédicas.

Na esteira dos processos contemporâneos de atribuição de valor ao corpo doente como foco das políticas de direitos humanos, podemos destacar um crescente deslocamento de legitimidade política do corpo saudável (caso dos asilados políticos no mundo) para a do corpo doente para o qual não se consegue obter tratamentos em território nacional (Fassin, 2012 a e b). A este deslocamento conceitual Fassin dá o nome de biolegitimidade – a construção de um poder da vida, tendo na existência física um domínio sagrado e naturalizado da vida em sociedade. Este questionamento geral e mais profundo sobre o quadro sinóptico atual da antropologia da saúde proposto por Didier Fassin traz para a ordem do dia questões teóricas utilizadas pelos antropólogos brasileiros desde meados da década de 1980, como foi o caso da tese seminal de Luiz Fernando Dias Duarte (1986) sobre as representações dos nervos e do nervoso em camadas populares urbanas. Nesse trabalho, considerado pioneiro nos estudos antropológicos sobre saúde e doença no Brasil, facilmente identificamos a ênfase na relação entre corpo e poder, isto é, da relação mais geral entre biologia e política. Tratar-se-ia de compreender o corpo como experiência do indivíduo, isto é, como expressão de uma ordem de valores (ethos) e como veículo de signos políticos, isto é, como expressão de uma hierarquia de poderes facilmente visualizada na corrente do processo civilizador (Elias,1990 a e b).

Objetivos: O objetivo do projeto está focado na revisão de literatura com fins de comparação entre o campo da antropologia da saúde e da política, tendo como referencial os debates sobre o corpo encontrados em cada uma das subáreas. A comparação se dará através dos seguintes critérios: principais autores, abordagem teórica e tema de pesquisa escolhido. Dentre as atividades programadas para a pesquisa, destacam-se: 1) levantamento bibliográfico e revisão da literatura antropológica, que incluem análises sobre a publicação do período de 2004 a 2014, referentes às duas subáreas consideradas, antropologia da saúde e antropologia da política; 2) análise de etnografias cujo tema central seja práticas corporais, o corpo ou a corporalidade.