Como parte das atividades da Semana de Ciências Humanas, a instalação de uma grande árvore formada por pneus, inspirada em símbolos da cultura africana, revelou o Baobá. A árvore é considerada por muitas etnias africanas como a ‘aquela que guarda a memória do povo’”. Nela era feita a transmissão de memória da África, onde todas as histórias, fatos históricos e canções do povo eram preservadas e transmitidas.
A proposta surgiu das professoras de História Vanessa Vaz Costa e Jussaramar, ao mostrarem nas sala de aula dos 7ºˢ anos a relação entre a África e a Europa, além de explicarem a presença dos europeus no continente africano, bem como a chegada destes na América.
Um dos objetivos desse trabalho era demonstrar aos alunos que a História não é constituída somente por documentos escritos, mas também pelas fontes orais. “Explicamos que nem todos os povos africanos tinham a escrita como fonte base de transmissão de conhecimentos, mas sim pela fala. Para demonstrar isso, usamos o Baobá como principal instrumento”, explica Jussara.
Vanessa ressalta que o trabalho lúdico com os alunos dos 7ºs anos é importante para ajudar na compreensão de que História não é uma matéria isolada das demais disciplinas, além de conseguir demonstrar o conhecimento que é passado em aula.
Vanessa conta que a inspiração veio de uma visita à um museu de Belo Horizonte, onde a instalação de um Baobá feito de pneus incentivava os visitantes a deixarem mensagens ao pé da árvore ao visitarem o local. “Quando vi aquela arte, achei que deveria trazer a iniciativa para a sala de aula, sob uma perspectiva vinculada com a disciplina. Por isso, adequou-se bem por estarmos trabalhando a África antes da colonização dos europeus; a África que foi apagada por anos de escravidão, como se não houvesse um continente antes disso. Resgatar a memória africana tem tudo a ver com esse simbolismo do Baobá”, completa.
A dinâmica aconteceu quando os alunos recuperaram algo em suas memórias pessoais e gravaram-nas no Baobá através de uma mensagem de áudio, para destacar a importância da mensagem falada. As mensagens serão ouvidas por meio do QR Code, um código de barras bidimensional que é escaneado por celulares equipados com câmera.
Para a decodificação dos áudios foram usados símbolos típicos africanos, pintados em papéis que encapavam o tronco da árvore. Ao passarem a câmera do dispositivo celular pelo símbolo adinkra, o código era convertido para o áudio gravado pelo aluno, transmitindo sua memória.
Segundo Vanessa, o trabalho contribui para o ensino da História e funciona como exercício de identidade através da memória: “O baobá serve como um gatilho para a recuperação de memória dos jovens, que muitas vezes não se identificam como sujeitos, acham que não têm uma história ou algo importante pra escrever. Então nesse exercício eles pensam e refletem sobre quem eles são e se entendem como sujeito histórico”.
Além disso, a exposição da arte teve contribuição de outras disciplinas, garantindo a interdisciplinaridade. Na aula de Português os alunos trabalharam a constituição das memórias enquanto forma de escrita, enquanto em geografia, os estudantes montaram um grande mapa da África com materiais que remetem às regiões africanas. O departamento de biologia trabalhou questões como a importância do Baobá para a natureza, a evolução da planta e seu armazenamento de água.
A aluna Vitória Ferraz do 7º ano B relembrou um momento sentimental que passou em família e afirma que fazer essa atividade foi interessante: “cada um de nós compartilhamos nossas histórias com os outros e refletimos bastante”.
Na quinta-feira(16), a professora Sônia Miranda, do departamento de Educação da UFJF, participou de uma roda de conversa, apresentando uma pré-discussão sobre a importância da memória para a história e para a educação. A professora Adenilde Petrina também foi convidada para abordar com os alunos questões da “invisibilidade” dos povos originalmente vindos da África que foram escravizados e depois de libertos foram colocados à margem da sociedade. Também esteve presente o músico Sérgio Feliciano Barcelos. Ele falou sobre como o hip hop consegue dar voz às cidades invisíveís, denunciando questões que a grande mídia não quer falar.
Para Vanessa, o objetivo da roda de conversa é concluir a questão das memórias trabalhada com o Baobá. “Queremos que os alunos repensem sobre a inserção deles no contexto escolar e no contexto da cidade. Por isso, convidamos a Sônia, a Adenilde e o Sérgio para falar das várias esferas da cidade. Queremos mostrar aos alunos que em nossa cidade existem locais sem visibilidade, mas que possuem voz”.
Ela também explica que “A disciplina de história tem que estar a todo momento buscando nos estudantes o seu papel de sujeito e cidadão. Não podemos estudar história sempre presos ao passado. O presente está o tempo todo dialogando com o passado, por isso essas pontes de diálogos são essenciais para promover a cidadania”.