Ai que frio!
Paulo H. D. Menezes
No inverno é comum que as temperaturas tenham quedas acentuadas, chegando até mesmo a nevar em algumas regiões do sul do país. Nesses dias frios todos se preocupam em colocar um agasalho ou uma roupa mais “quentinha”. É comum ouvirmos frases do tipo: “Esta blusa esquenta bem”; “Este cobertor é tão quentinho”; “Vou fechar a janela para o frio não entrar”. Me lembro até de um antigo comercial das Casas Pernambucanas que trazia o seguinte diálogo musicado entre uma dona de casa e um personagem inusitado que batia à sua porta:
“Toc, toc, toc…
Quem bate? É o frio…
Não adianta bater, que eu não deixo você entrar
As Casas Pernambucanas é que vão aquecer o meu lar
Vou comprar flanelas, lãs e cobertores eu vou comprar
Nas Casas Pernambucanas e nem vou sentir o inverno passar.”
Mas afinal de contas, o que há de errado com essas frases que todo mundo fala? Do ponto de vista do senso comum, nada. Porém, fisicamente falando, não existe a grandeza “frio” e a grande maioria dos agasalhos não esquentam, eles apenas dificultam a troca de calor entre o nosso corpo e o ambiente. Para entendermos isso é preciso conhecer um forma de energia muito importante para a vida humana, o calor.
O calor é uma forma de energia que é trocada entre dois ou mais sistemas quando há diferença de temperaturas entre eles. Essa energia flui espontaneamente do corpo de maior temperatura para o corpo de menor temperatura. Por exemplo, eu posso misturar água fervendo com água fria para obter água morna. Isso ocorre porque a água fervendo transfere calor para água fria. Com isso, a temperatura da água fervendo diminui, enquanto a temperatura da água fria vai aumentando até que atinjam um ponto denominado de equilíbrio térmico. A partir desse ponto as temperaturas se igualam e não há mais troca de calor entre esses dois sistemas. Porém, em um ambiente aberto esses sistemas continuam trocando calor com o meio até entrarem em equilíbrio térmico com ele. É o que chamamos de temperatura ambiente.
Nós humanos somos seres homeotérmicos, isso significa que o nosso organismo mantém a temperatura do corpo em torno de 36°C. Por isso, estamos constantemente cedendo calor para o ambiente. Em um dia frio, cuja temperatura está muito abaixo dos 36°C esse fluxo de calor é muito intenso. Daí o organismo dispara um aviso de que é necessário diminuir esse fluxo para não corremos o risco de uma hipotermia (quando a temperatura fica inferior aos 36°C). Esse aviso é dado pela sensação térmica de frio. Assim, podemos dizer que a sensação de frio é um aviso de que o nosso corpo está liberando muito calor. Um alerta para nos proteger. Para que a temperatura do nosso corpo permaneça constante em torno dos 36°C, o nosso organismo tem que trabalhar muito para repor a energia liberada na forma de calor. É por isso que no inverno sentimos mais fome do que no verão e temos vontade de comer alimentos mais calóricos, como chocolates, doces, feijoadas, etc. Então, qual é o papel do agasalho?
O agasalho funciona simplesmente como um isolante térmico, minimizando a troca de calor entre o nosso corpo e o meio. Isso faz diminuir a sensação de frio. Porém se esse isolamento for muito intenso, a ponto de corrermos o risco de a temperatura aumentar além dos 36°C, vem aquela sensação de calor que nos faz desvencilhar de algumas roupas rapidamente.
A partir dessas informações podemos reanalisar o comercial e inferir que não é o frio que entra e sim o calor que sai. Flanelas, lãs e cobertores não aquecem, mas ajudam a diminuir o fluxo de calor. Um outro aspecto interessante é o fato de o ar ser um bom isolante isolante térmico. Por isso, tecidos que permitem um bom acúmulo de ar entre suas fibras, como lãs e flanelas, são melhores isolantes térmicos do que uma seda, por exemplo. É claro que você não precisa mudar seu modo de falar: “Este agasalho me deixa bem isolado termicamente”; “Vou fechar a porta para diminuir o fluxo de calor”. Físico já tem fama de doido, daí iriam dizer que só falta internar num hospício. A física ajuda a entender aquilo que nos afeta e assim podemos tomar decisões mais acertadas.