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Informativo 112 – Cerrado, aves, aquecimento

1 –  Cerrado: “Valor da biodiversidade é mil vezes superior ao da agricultura”

2 – Fóssil fecha debate sobre origem de aves

3 – Aquecimento acelerado

 

1 –  Cerrado: “Valor da biodiversidade é mil vezes superior ao da agricultura”

Cientista da Embrapa afirma que a salvação da lavoura depende da preservação do bioma, Herton Escobar escreve para “O Estado de SP”:
O Cerrado ainda tem 800 mil quilômetros quadrados de terras agricultáveis – uma área igual à da França e Reino Unidos juntos, suficiente para duplicar tudo o que já é ocupado pela agropecuária no bioma. Se o País for inteligente, não precisará desmatar nem um hectare dessa terra. “A riqueza que temos guardada na biodiversidade do Cerrado é mil vezes superior à da agricultura”, diz o engenheiro agrônomo Eduardo Assad, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
A afirmação surpreende. Não só pelo conteúdo, mas por sair da boca de um cientista que há mais de 20 anos dedica sua vida ao agronegócio e que se lembra, sorrindo, dos tempos em que passava o correntão no Cerrado em cima de um trator, na fazenda da família em Quirinópolis, no sul de Goiás. Só que os tempos mudaram. Agora, diz Assad, é hora de preservar e pesquisar as riquezas que o bioma tem a oferecer no seu estado natural.
Até mesmo para o bem da própria agricultura. “A preservação do Cerrado é a salvação da lavoura”, costuma dizer o pesquisador. Segundo ele, é no DNA das plantas nativas do bioma que estão escondidos os genes capazes de proteger suas inquilinas estrangeiras (a soja, o milho, o algodão, o arroz) do aquecimento global. Dentre as 12 mil espécies nativas conhecidas, só 38 ocorrem no bioma inteiro, o que significa que estão adaptadas a uma grande variabilidade de condições climáticas e de solo.
“A elasticidade genética das plantas do Cerrado é impressionante”, afirma Assad. Ele e sua mulher, Leonor, também pesquisadora, destacam que o Cerrado é uma formação mais antiga do que a Amazônia e a Mata Atlântica, tanto do ponto de vista geológico quanto biológico. O que significa que suas espécies já foram expostas – e sobreviveram – a todo tipo de situação: muito frio, calor, seca, etc.
Os genes que conferem essa capacidade adaptativa poderiam ser transferidos para culturas agrícolas via transgenia, tornando soja e companhia igualmente resistentes às intempéries climáticas que estão por vir. Só falta descobri-los. “O Cerrado é o maior laboratório de prospecção de genes do mundo, mas ninguém olha para isso”, diz. “Nem estudamos o genoma dessas espécies e já estamos acabando com elas.”
Sem falar no potencial farmacológico das plantas medicinais e nos serviços ambientais prestados pelo bioma como um todo: estocagem de carbono, controle climático, controle de erosão, produção de água e outros fatores cruciais para a agricultura. “A conservação tem de ser vista como uma atividade produtiva também”, diz a bióloga Mercedes Bustamante, da Universidade de Brasília.
Desconhecimento
Não é o que acontece. A riqueza econômica e tecnológica do agronegócio contrasta com a pobreza de recursos e de conhecimento sobre o bioma. “Trabalhar com políticas públicas no Cerrado é muito frustrante”, admite o diretor de Políticas de Combate ao Desmatamento do Ministério do Meio Ambiente, Mauro Pires. “Quando se fala em trabalhar com a Amazônia as portas se abrem. Quando se fala em trabalhar com o Cerrado, elas não se mexem.” 
Mercedes sente a mesma dificuldade. Ela é coordenadora científica da Rede de Pesquisa ComCerrado, recém-criada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), com representantes dos 11 Estados do bioma.
A ideia é fazer pelo Cerrado o que o Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera (LBA) faz pela Amazônia, produzindo o conhecimento científico necessário para entender, valorizar e explorar adequadamente – quando possível – os serviços ambientais prestados por seus ecossistemas. “Não há como fazer boa gestão sem informação”, ressalta Mercedes. “Vemos muitas políticas públicas que carecem de embasamento técnico adequado.”
Por enquanto, o programa tem R$ 220 mil em caixa para pesquisa. A expectativa é que receba R$ 6 milhões do MCT nos próximos dois anos, mais o valor de uma emenda parlamentar apresentada pela bancada do Distrito Federal – inicialmente orçada em R$ 7 milhões, mas reduzida para R$ 1,7 milhão.
Parte da dificuldade, diz Mercedes, é o Cerrado estar espalhado por várias regiões e não concentrado em um bloco geopolítico coeso, como a Amazônia. “Até a Caatinga tem mais força política do que o Cerrado”, diz o gerente do Programa Cerrado-Pantanal da ONG Conservação Internacional, Mario Barroso – sem desmerecer a importância da Caatinga.
(O Estado de SP, 27/9)

2 – Fóssil fecha debate sobre origem de aves

 

Dinossauro coberto de penas achado na China é o primeiro com idade superior à dos ancestrais das espécies de hoje. Plumas recobriam tanto as patas da frente quanto as de trás, o que pode indicar hábitos de “planador”
Reinaldo José Lopes escreve para a “Folha de SP”:
Se alguém ainda tinha dúvidas sobre a hipótese mais aceita para a origem das aves, elas provavelmente serão dissipadas por um dinossauro peso-pena, com 30 cm de comprimento e pouco mais de 100 gramas. O Anchiornis huxleyi é o primeiro dino penoso com idade superior à da mais antiga ave, acabando com uma das últimas objeções à ideia de que os emplumados de hoje descendem dos dinossauros.
O bicho tem feições tão aviárias que a descrição original da espécie, feita pelo paleontólogo Xing Xu, da Academia Chinesa de Ciências, dizia que ele era uma… ave. Mas essa conclusão original foi baseada num fóssil incompleto. Xu e companhia tiveram a sorte de achar um novo exemplar da criatura, agora praticamente intacto – incluindo penas exuberantes que recobrem os quatro membros do bicho.
Os novos detalhes do esqueleto completo estão descritos em artigo no site da revista “Nature”. Com esses dados, ficou claro que se trata, de fato, de um dinossauro, e mais especificamente de um troodontídeo, membro de um grupo de bichos carnívoros, pequenos e ágeis. É justamente uma das subdivisões dos dinos mais próximas dos ancestrais diretos das aves, segundo o que propõem os paleontólogos.
Tapando o buraco
No entanto, apesar da grande semelhança entre os dois grupos, incluindo o grande número de descobertas recentes de dinossauros com penas, nenhum deles era mais antigo que o Archaeopteryx, animal alemão com pouco menos de 150 milhões de anos que é aceito como a mais antiga ave.
Ora, a datação mais provável para o novo fóssil é de 155 milhões de anos, afirmam Xu e companhia. Para eles, é o fim do “paradoxo temporal” que parecia colocar as aves antes dos dinossauros emplumados.
Dois dos principais paleontólogos brasileiros, ouvidos pela Folha, manifestaram empolgação com a descoberta. “Não há mais o que discutir [sobre a origem das aves]”, sentencia Reinaldo José Bertini, da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Rio Claro. “Penas eram uma característica considerada exclusiva de aves. Mas vários dinossauros tinham penas. Em consequência, aves são dinossauros”, afirma Bertini.
“É impressionante a diversidade de formas das penas e penugens do fóssil”, avalia o pesquisador da Unesp. A forma dessas estruturas é indistinguível das que muitas aves modernas possuem, à exceção de um detalhe que é importante para o voo ativo, no qual as asas são batidas pela ave. Para conseguir isso, o animal precisa de penas assimétricas, ou seja, com tamanho diferente em cada um dos lados. Todas as penas do Anchiornis huxleyi, por outro lado, são simétricas.
“As penas encontradas no novo exemplar da China, de fato, não eram ideais para o voo. Não obstante, parece-me ser factível que o Anchiornis planasse”, diz Alexander Kellner, paleontólogo do Museu Nacional da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
A presença de plumas nos dois pares de patas repete outro dino penoso célebre, o Microraptor gui. Xing Xu propõe que esses voadores/planadores primitivos usavam um sistema de quatro “asas”. Para Kellner, a ideia faz sentido, mas ele alerta: há debates sobre a idade do fóssil. Outras datações sugerem que o bicho seria mais novo que o Archaeopteryx.
Defensor número 1 de Darwin propôs ideia no século 19
O nome científico que designa a espécie do novo dino penoso homenageia um dos baluartes da teoria da evolução no século 19, o britânico Thomas Henry Huxley (1825-1895), conhecido como “buldogue de Darwin”.
Huxley comparou detalhes das patas do dinossauro carnívoro Megalosaurus e dos avestruzes modernos, mostrando que compartilhavam 35 características que não apareciam em nenhum outro animal. Com isso, ele propôs uma origem comum para os bichos.
(Folha de SP, 26/9)

3 – Aquecimento acelerado

Efeitos extremos das mudanças no clima podem vir já em 2050
O mundo pode sofrer os efeitos mais extremos das mudanças climáticas bem antes do que o previsto. Caso as emissões de CO2 não sejam reduzidas o mais breve possível, a Terra pode ter uma elevação de 4 graus Celsius até 2050, com consequências devastadoras.
Esse cenário é descrito no mais grave alerta já divulgado sobre o aquecimento global desde que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) estimou, em 2007, que a temperatura do planeta poderia subir entre 1,8 e 4 graus até o fim deste século. O novo estudo confirma que esse fenômeno pode acontecer, só que 50 anos antes e com efeitos locais mais extremos.
A pesquisa – feita pelo Centro Hadley, do Reino Unido, um dos mais respeitados centros de pesquisas sobre o clima do mundo – coincide com a última rodada de negociações sobre o aquecimento global, iniciada ontem, em Bangcoc, na Tailândia. Ela precede a reunião de cúpula da ONU, em dezembro, em Copenhague, na Dinamarca, quando o mundo deverá acertar um novo acordo para substituir o Protocolo de Kioto, que expira em 2012.
– Nossos resultados mostram padrões similares aos do IPCC, mas revelam a possibilidade de que mudanças extremas possam acontecer mais cedo – disse Debbie Hemming, uma das autoras da pesquisa, divulgada durante uma conferência sobre mudanças climáticas na Universidade de Oxford.
No estudo, foram compilados novos dados sobre o clima a partir de análises sobre o ciclo do dióxido de carbono e de informações atualizadas das emissões de países emergentes, como China e Índia, que estão entre os cinco maiores poluidores do mundo.
Tempo para ação reduzido à metade
Entre os efeitos de tamanha elevação da temperatura, relata o estudo, está o desaparecimento de metade das plantas e animais do planeta. Secas severas se abateriam sobre África, América Central e Mediterrâneo, entre outros locais, afetando a oferta de água, a segurança alimentar e a saúde da população. Haveria também aumento de 20% do nível das precipitações na Índia, piorando o risco de enchentes.
As conclusões da pesquisa, dizem os cientistas, reduzem pela metade o tempo disponível para ação.
Elas abalam também a crença de que alguns dos piores efeitos das mudanças no clima só vão ser sentidos pelas gerações futuras.
– Sempre se falou sobre esses efeitos e as futuras gerações, mas pessoas que estão vivas hoje poderão ser afetadas por elas também – conta Richard Betts, do Hadley Centre.
Uma novidade em relação aos relatórios do IPCC foi a inclusão dos efeitos dos ciclos do carbono. O estudo exemplifica que, se parte da Amazônia morrer por causa das secas, vai expor o solo, liberando mais carbono, originalmente presente na matéria orgânica, na atmosfera.
(O Globo, 29/9)