1 – Ártico está no seu momento mais quente em 2000 anos
2 – Uma curiosa troca de favores entre pulgões, bactérias e vírus
1 – Ártico está no seu momento mais quente em 2000 anos
Temperatura no Ártico deveria estar caindo e não subindo a ponto de serem as mais elevadas em 2 mil anos, indica estudo publicado na Science. Ação humana seria o motivo da reversão na tendência.
As temperaturas recentes verificada no Ártico são as mais elevadas em pelo menos 2 mil anos, aponta uma nova pesquisa. O trabalho, que reuniu registros geológicos e simulações feitas em computador, aponta que a região setentrional do planeta deveria estar esfriando e não esquentando, se não fosse a ação das emissões de gases estufa, que deturpam os padrões climáticos naturais.
O estudo, liderado por pesquisadores da Universidade do Norte do Arizona e do Centro Nacional de Pesquisa Atmosférica (NCAR, na sigla em inglês), nos Estados Unidos, foi publicado na edição desta sexta-feira (4/9) da revista Science.
Os pesquisadores reconstruíram temperaturas nos verões no Ártico nos últimos 2 mil anos, divididos por décadas até então, os dados existentes eram referentes a apenas 400 anos , para concluir que o processo de esfriamento gradual que começou há milhares de anos deveria ter continuado.
Os resultados são particularmente importantes porque o Ártico, talvez mais do que qualquer outra região da Terra, encara impactos dramáticos promovidos pelas mudanças climáticas. Esse estudo fornece registros de um período extenso que revela como os gases estufa gerados pelas atividades humanas estão influindo no sistema climático natural do Ártico, disse David Schneider, do NCAR, um dos autores do estudo.
A análise das temperaturas no verão na região indicou uma queda média de 0,2ºC a cada mil anos. O mais recente patamar de menores temperaturas ocorreu durante a pequena era do gelo que teve início no século 16.
A alteração no ciclo orbital da Terra ocorrida nos últimos 7 mil anos levou ao processo de esfriamento, mas essa tendência foi anulada pelo aquecimento derivado das atividades humanas no século 20.
Como consequência, as temperaturas no verão no Ártico, no ano 2000, estiveram em média 1,4ºC mais elevadas do que seria de se esperar apenas pela tendência de esfriamento.
Esse estudo apresenta um claro exemplo de como o aumento na emissão dos gases estufa está alterando o nosso clima, ao anular pelo menos 2 mil anos de esfriamento, disse Caspar Ammann, do NCAR, outro autor do trabalho.
O artigo Recent warming reverses long-term arctic cooling, de Darrell Kaufman e outros, pode ser lido por assinantes da Science em http://www.sciencemag.org. Fonte: Agência Fapesp.
2 – Uma curiosa troca de favores entre pulgões, bactérias e vírus
“Os três organismos, o vírus, a bactéria e os pulgões, colaboram no combate às larvas de vespa
Fernando Reinach é biólogo. Artigo publicado em “O Estado de SP”:
Os agricultores têm razões para não gostar dos pulgões. A maioria deles vive camuflada sob as folhas, sugando a seiva por um poderoso sifão. É assim que vive o Acyrthosiphon pisium, um pulgão que infesta as plantações de ervilha. Muito antes de ser combatido pelos agricultores, o Acyrthosiphon já enfrentava seu inimigo natural, a vespa Aphidius ervi.
Essa vespa, duas vezes maior que o pulgão, imobiliza a vítima, e quando você imagina que ela vai picar o pulgão e sugar o bichinho até deixar ele seco, ela dobra o abdome para a frente e, por entre as patas, usa seu ovopositor, um apêndice que parece uma seringa, para depositar no interior do pulgão um ovo fecundado. Após a injeção, ela liberta o bichinho.
Mal sabe o pulgão que horas depois esse ovo vai eclodir e a larva da vespa vai se desenvolver no seu interior, comendo o bichinho por dentro. Gorda e bem alimentada, a larva da vespa acaba por matar o pulgão, emergindo do seu cadáver.
Mas se você imagina que os pulgões são vítimas indefesas da vespas, incapazes de uma reação, você está subestimando o poder da seleção natural. Ao longo de milhares de anos, os pulgões desenvolveram uma aliança bélico-estratégica com uma bactéria chamada Hamiltonella defensa. Essa bactéria vive no interior do pulgão e, ao longo da evolução, criou uma relação extremamente íntima com seu hospedeiro.
A intimidade é tanta que o pulgão permite que a bactéria participe de seu ato sexual. Quando o espermatozoide de um pulgão se funde a um óvulo de um pulgão fêmea, a bactéria Hamiltonella está presente e espertamente infecta imediatamente o ovo a partir do qual vai se desenvolver o pulgão filho. O filho pulgão já nasce com a bactéria no seu interior. Dessa maneira, a Hamiltonella se perpetua no interior dos pulgões.
É fácil entender como a bactéria se beneficia de sua relação com o pulgão, mas que vantagem leva o pulgão em abrigar no seu interior a bactéria? Simples: a Hamiltonella é capaz de matar as larvas da vespa parasita. A taxa de sobrevivência dos ovos da vespa no interior de pulgões que possuem a bactéria Hamiltonella é de somente 10%.
Mas, se você criar pulgões livres da bactéria, 85% dos pulgões infectados são mortos pelas larvas da vespa. O acordo entre o pulgão e a bactéria é o seguinte: eu te alimento, mas em troca você mata as larvas de vespa assim que elas forem injetadas dentro de mim.
Agora foi descoberto que esse acordo envolve mais um ser vivo, um vírus que vive no interior da Hamiltonella. Os cientistas descobriram que a Hamiltonella mata as larvas da vespa utilizando uma toxina muito poderosa. O problema é que eles também descobriram que o gene para a produção dessa toxina não está no genoma da bactéria, mas sim no genoma de um vírus que vive no interior da Hamiltonella.
Quando trataram as bactérias e removeram o vírus, descobriram que sem ele a bactéria não é capaz de matar as larvas de vespa. Mas basta infectar de novo as Hamiltonellas com o vírus para se tornarem eficazes matadores de vespas.
A conclusão é que a bactéria tolera a presença do vírus no seu interior, pois ele permite que a bactéria se torne letal para as larvas de vespas. Sendo letal para as larvas de vespas, a presença da bactéria no interior dos pulgões também é tolerada. E assim os três organismos, o vírus, a bactéria e os pulgões, colaboram no combate às larvas de vespa. Ganha o pulgão, que fica protegido das vespas; ganha a bactéria, que possui um lar dentro do pulgão; e ganha o vírus, que possui um lar dentro da bactéria. É um belo exemplo de um tipo de simbiose que os biólogos chamam de mutualismo.
Mais informações: Bacteriophages encode factors required for protection in a symbiotic mutualism. Science, vol. 325
(O Estado de SP, 10/9)