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Informativo 345 – Micróbios “humanos” afetam Abrolhos e Estrada atropela lago

1 – Micróbios “humanos” afetam Abrolhos

2 – Estrada atropela lago subterrâneo na BA

 

1 – Micróbios “humanos” afetam Abrolhos

Análise de DNA indica predomínio de bactérias associadas a contaminação por fezes em corais do arquipélago. Micro-organismos têm ligação com doença do branqueamento das colônias dos recifes, que já causa perdas maciças
Os recifes de coral do arquipélago dos Abrolhos, que vai do norte do Espírito Santo ao sul da Bahia, estão contaminados por bactérias que podem ter relação com a atividade humana.
A análise é do oceanógrafo Fabiano Thompson, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), que apresentou os dados durante o 56º Congresso Brasileiro de Genética, no Guarujá (litoral de SP).
De acordo com Thompson, os recifes de Abrolhos tiveram uma perda maciça do coral Mussismilia braziliensis, o principal coral construtor dos recifes dessa região da costa do Brasil. “Em cem anos essa espécie estará extinta lá”, diz o oceanógrafo.
Batelada
Os pesquisadores coletaram material da região e fizeram um metagenoma (uma espécie de análise coletiva de DNA, buscando genes de vários organismos) da água, dos recifes e das buracas, áreas com 50 m de diâmetro, que ficam a cerca de 80 m de profundidade.
As buracas são típicas de Abrolhos e reúnem grande quantidade de nutrientes e, portanto, muitos peixes. Na análise, os cientistas notaram que há um aumento de algas nos recifes, o que leva a um crescimento de bactérias causadoras de doenças que têm reprodução rápida.
O resultado, para Thompson, é preocupante, já que a região concentra recifes importantes, de cerca de 10 mil anos, e uma rica vida marinha, que vai de pequenos peixes a baleias.
Branco pálido
Os pesquisadores notaram ainda a presença de corais considerados “doentes” nos recifes. É fácil notá-los, pois ficam esbranquiçados, com aspecto bem diferente do dos corais sadios.
Até recentemente, os biólogos marinhos achavam que o branqueamento era uma resposta fisiológica dos corais ao aquecimento da água. Mas, em 1995, cientistas mostraram que o Vibrio coralliilyticus é uma bactéria que causa a cor esbranquiçada por necrosamento (morte dos tecidos dos corais).
Nos corais esbranquiçados de Abrolhos há um predomínio de Bacterioidetes – bactérias comuns em humanos. “O aumento delas nos leva a crer que existe contaminação orgânica e contaminação fecal”, diz.
“Isso significa impacto humano. Estamos tentando provar essa hipótese”, completa ele. Uma das atividades humanas proibidas na região é a pesca. De acordo com o oceanógrafo, há pouco controle sobre os impactos negativos no ambiente da área.
Para Thompson, esse é o primeiro resultado significativo que ajuda a dar um panorama da saúde de Abrolhos. “Agora queremos entender melhor as bactérias encontradas”, explica.
Além de Abrolhos, os pesquisadores também estão analisando a biodiversidade marinha em outras ilhas: os arquipélagos de São Pedro e São Paulo, a cerca de 900 km do Rio Grande do Norte, e Trindade e Martim Vaz, a 1.200 km de Vitória.
Biólogos avaliam pontos fracos no DNA de parasitas
Biólogos brasileiros estão buscando no DNA o calcanhar-de-aquiles de parasitas como o Trypanosoma, causador do mal de Chagas, e o Leishmania, responsável pela leishmaniose. A ideia é achar formas de impedir que os micróbios consertem seus genes danificados, matando-os.
Carlos Renato Machado, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) estuda como os raios gama -que quebram DNA, desorganizam células e atrapalham a recombinação de proteínas -afeta o Trypanosoma.
A recombinação de proteínas é vital nesse parasita. Isso porque o Trypanosoma se protege do sistema de defesa do organismo com uma espécie de “capa” de proteínas.
Quando essa proteção é flagrada, o parasita produz uma nova proteína na sua capa. “É preciso entender essa recombinação de proteína”, afirma Machado.
O estudo dos efeitos da radiação nesses parasitas, no entanto, não significa que o tratamento possa vir de radioterapia. Isso já foi tentado, sem sucesso, nos EUA.
“Esses parasitas são muito mais resistentes que os seres humanos à radiação. O importante, aqui, é ver como o DNA pode ser lesionado e como se dá a reconstrução”, explica Machado. (SR) (Sabine Righetti) (Folha de SP, 18/9)

 

2 – Estrada atropela lago subterrâneo na BA

Especialistas em cavernas apontam danos a complexo que abriga o corpo d’água, o maior do tipo no Brasil. Instituto Chico Mendes investiga se Ibama teria errado em permitir a obra, ou se ela ocorre sem devida autorização
A pavimentação de uma estrada no sudoeste da Bahia atropelou, literalmente, a caverna que abriga o maior lago subterrâneo do Brasil. O estrago foi verificado por um espeleólogo e motivou a visita de uma equipe do Instituto Chico Mendes ao local na última sexta-feira.
O órgão, agora, quer descobrir se o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) errou na concessão da licença de um trecho da obra da rodovia BR-135 ou se o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) faz o trabalho num trecho não licenciado.
A vítima principal é o Buraco do Inferno da Lagoa do Cemitério, caverna que abriga o lago de 13.860 m2. A gruta integra o sistema de cavernas João Rodrigues, no carste (formação de rocha calcária caracterizada por cavernas, que lembra um queijo suíço) de São Desidério, município baiano na fronteira da expansão da soja.
Segundo Alexandre Lobo, do Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas, há mais de uma centena de cavernas na região. Três dezenas delas são consideradas “expressivas” e deveriam estar protegidas. O Instituto Chico Mendes tem planos de criar uma unidade de conservação ali.
Alternativa
Em 2008, Lobo integrou uma equipe que mapeou as grutas na região de influência da BR-135. O objetivo era sugerir um traçado alternativo para a obra de pavimentação da estrada, justamente para desviá-la do carste.
No mês passado, o espeleólogo foi a São Desidério fazer fotos do lago subterrâneo. “Deparei com desmatamento e terraplenagem e as obras em curso”, conta.
“No ponto onde o conduto [teto da caverna] é mais alto, sobre o lago, vi que havia blocos de rocha caídos recentemente”, continua Lobo. “Há dolinas [buracos naturais na rocha calcária] entupidas, tudo isso resultado das máquinas que trabalham no local.”
A estrada, é verdade, já passava por cima da caverna. Como era uma estrada de terra, porém, o trânsito local era pequeno. Quando o Dnit pediu a licença para pavimentar a estrada, que será usada para escoar a produção agrícola da região, o Ibama aproveitou para corrigir o traçado do trecho problemático.
Segundo o Dnit, 19 km dos 60 km da obra não receberam licença por decisão do Ibama. A obra continuou no restante. Em maio deste ano, o órgão autorizou que o asfaltamento prosseguisse por mais 14 km de estrada.
O Dnit afirmou à Folha, por meio de sua assessoria de imprensa, que a obra em curso se limita ao trecho autorizado. Os outros 5 km embargados, que segundo o departamento corresponderiam “à caverna”, continuariam parados, à espera da conclusão do estudo sobre o desvio.
Lobo contesta o Dnit. Ele diz que há obras ocorrendo exatamente sobre a caverna. “Inspecionamos a obra. Ela está ocorrendo”, diz o gerente do Ibama em Barreiras, Zenildo Soares. “Falta definir as coordenadas do local onde ela foi impedida.”
O espeleólogo Jussykledson de Souza, que mora em São Desidério, acompanhou na sexta a equipe do Instituto Chico Mendes que foi vistoriar o local. “O teto da caverna está caindo. Vimos blocos caírem”, afirmou.
“Ter ou não ter licença só agrava a situação. O que nos preocupa é a integridade do sistema”, disse Jocy Cruz, chefe do Cecav (Centro Nacional de Estudo, Proteção e Manejo de Cavernas), do Instituto Chico Mendes. (Claudio Angelo) (Folha de SP, 19/9)