1 – Dino argentino colocava ovos junto a esguicho de água fervente
2 – A revolução da salamandra
3 – Garimpeiro acha dente de elefante no sul da Amazônia
1 – Dino argentino colocava ovos junto a esguicho de água fervente
Calor e acidez ajudavam a chocá-los há 100 milhões de anos
A água fervente, até vaporizada, esguichava das entranhas da terra de quando em quando, cozinhando o solo e as rochas. Ambiente inóspito? Não para bebês de certos dinossauros argentinos.
Um estudo na revista “Nature Communications” sugere que essas fontes de calor eram essenciais para chocar os ovos dos herbívoros grandalhões e pescoçudos que andavam pela Província de La Rioja (noroeste da Argentina) há 100 milhões de anos.
“A presença de ninhos de dinossauros em um ambiente paleohidrotermal [formado por antigas fontes de água quente] é algo único no mundo”, diz o paleontólogo Lucas Fiorelli, do Centro Regional de Pesquisas Científicas e Transferência Tecnológica. É a primeira pista direta “sobre o porquê de esses animais escolherem determinada área para fazer seus ninhos”, diz.
Em Sanagasta, sítio de La Rioja estudado por Fiorelli, já foram achadas 80 ninhadas, a maioria com até 12 ovos. Os ovos alcançam 21 cm de diâmetro e, pelo formato, devem ter sido botados por titanossauros, grupo mais comum de quadrúpedes de pescoço longo entre os dinos sul-americanos (o interior de SP e MG está cheio de fósseis deles).
O estudo detalhado das rochas revelou um ambiente quase idêntico à região de Yellowstone, nos EUA. Retratada em desenhos animados, Yellowstone é um campo minado de gêiseres (grandes esguichos de água subterrânea aquecida por atividade vulcânica) e fontes termais.
Ao mapear os ninhos, os pesquisadores descobriram que eles eram montados a, no máximo, três metros dessas chaleiras geológicas.
“Outro fator importante, além do calor, teria sido a acidez do líquido, que empapava o solo e ajudava a afinar a casca dos ovos”, explica Fiorelli.
Embora a casca inicialmente fosse muito espessa, ela iria ficando cada vez mais delgada, ajudando os filhotes a saírem do ovo.
A adaptação dos bichos ao ambiente hidrotermal seria tão minuciosa que um sistema de poros e canais na casca dos ovos ajudaria os filhotes a trocar a quantidade ideal de oxigênio e umidade com o ambiente externo. (Folha de SP, 19/7)
2 – A revolução da salamandra
Cientistas descobrem que células-tronco de um pequeno anfíbio são semelhantes às dos mamíferos. Especialistas receberam com entusiasmo a revelação, por considerar que isso pode abrir uma série de oportunidades para novos tratamentos de doenças degenerativas
Um pequeno anfíbio mexicano conhecido como axolotl (Ambystoma mexicanum) poderá revolucionar os estudos que buscam a cura para doenças degenerativas. A partir de análises feitas para entender a genética e a evolução das células-tronco em uma salamandra de 15cm, um grupo de pesquisadores da Universidade de Nottingham, na Inglaterra, descobriu que as células dos animais são extremamente similares às dos mamíferos.
De acordo com os cientistas, a descoberta possibilita uma oportunidade única para estudar as propriedades das células-tronco embrionárias e das células germinativas. E também lança luz sobre uma nova teoria evolutiva, segundo a qual a diversidade de mecanismos do desenvolvimento animal tem uma única origem, seja para seres primitivos ou mais complexos.
“Conseguimos provas que a pluripotência – a habilidade de uma célula-tronco embrionária transformar-se em qualquer tipo de célula – é, na verdade, muito antiga em termos evolutivos. Apesar de todo o conhecimento que temos sobre elas até agora provir de pesquisas feitas com mamíferos, nosso estudo sugere que elas existem em outros animais, e não apenas naqueles que usamos em laboratório”, explicou ao Correio Andrew Johnson, o principal autor da pesquisa.
Os resultados do estudo, apresentados na semana passada durante a conferência anual sobre células-tronco da Inglaterra, foram recebidos com entusiasmo pela classe científica. “Na realidade, as células-tronco pluripotentes provavelmente existem nos embriões de simples animais, classe da qual os anfíbios fazem parte”, disse Johnson.
Diferentemente de sapos, peixes, moscas e minhocas usadas como cobaias de laboratório, a salamandra axolotl, endêmica do México, tem células pluripotentes em seus embriões, equivalentes às encontradas nos embriões de mamíferos. Elas são capazes de se transformar em estruturas germinativas e em células somáticas – aquelas que formam os tecidos e os órgãos do corpo.
Numa perspectiva prática, os embriões da salamandra vão fornecer ferramentas úteis para entender como manipular as células-tronco embrionárias humanas, de forma a desenvolver terapias úteis no tratamento de diversas doenças degenerativas.
Segundo Johnson, a axolotl é uma salamandra que conserva as características primitivas dos primeiros anfíbios, os animais descendentes dos peixes que se mudaram do ambiente aquático para o terrestre cerca de 385 milhões de anos atrás. Esses primeiros anfíbios foram os ancestrais de todos os vertebrados que vivem na terra – incluindo os humanos. “Isso coloca a axolotl em uma posição perfeita para entendermos como os vertebrados se desenvolveram no solo”, diz o pesquisador.
“Descobrimos que os mecanismos genéticos que controlam o desenvolvimento dos embriões da salamandra não se modificaram à medida que os anfíbios evoluíram para répteis e, depois, mais tarde, para mamíferos”, conta Johnson.
“Isso explica por que as salamandras, que são anfíbios, se parecem muito mais com os lagartos, que são répteis – e, como os mamíferos evoluíram diretamente dos répteis, faz sentido que o mecanismo genético que controla o desenvolvimento embrionário continuou em grande parte intacto desde as axolotls até os humanos.”
A pesquisa mostrou que os embriões da salamandra mexicana são muito mais similares aos dos humanos do que os de sapos e de peixes, os mais estudados pelos pesquisadores.
“Recentemente descobrimos que a pluripotência nas axolotls e nos mamíferos depende de um gene chamado nanog, o qual não existe em sapos. Acreditamos que esse gene desapareceu do genoma dos sapos depois que esses animais e as salamandras evoluíram separadamente de seu ancestral comum”, diz Jonhson.
O cientista explica que esse fato contraria uma ideia há muito tempo circulante de que as células pluripotentes evoluíram apenas com os mamíferos e sugere que essas células podem ser, na verdade, uma das estruturas embrionárias mais antigas.
Evolução
A afirmação do cientista pode gerar uma dúvida pertinente ao que se sabe, até hoje, sobre a evolução. Como o processo evolutivo pressupõe o desenvolvimento de características que beneficiam a perpetuação da espécie, por que os sapos teriam perdido as células pluripotentes, e as salamandras, não? Segundo Johnson, uma teoria desenvolvida por sua equipe há sete anos fornece a prova de que, para os sapos, possuir esse tipo de célula seria, na verdade, uma desvantagem.
Ele explica que a peça-chave na evolução dos vertebrados é a relação entre as células germinativas, que vão se transformar em esperma e óvulos, e o resto do organismo, chamado soma, em referência à palavra grega que significa “corpo”.
Se possuíssem células pluripotentes que se transformariam, mais tarde, em órgãos e tecidos, os sapos perderiam uma de suas principais características: a grande quantidade de variantes da espécie. Como não são portadores desse tipo de célula, para evoluir, os sapos precisam passar por diversas modificações físicas e fisiológicas. Dessa forma, existem quase 5 mil espécies diferentes. Isso também explica por que, desde o homem de Neandertal, extinto há 30 mil anos, a raça humana é única.
“Essa também é a razão de existirem duas formas diferentes de produzir células germinativas. Os embriões da maioria dos animais usados em laboratório, incluindo os sapos (mas não os ratos), contêm um material chamado plasma germinativo, e esse plasma traz todas as informações necessárias para as células se transformarem em óvulos e espermatozoides”, diz Johnson.
Na salamandra, porém, ocorre algo diferente. Os embriões deste animal não contêm plasma germinativos e, em vez disso, ele usa um sistema muito similar ao dos ratos e dos humanos. Assim, as axolotls produzem suas células germinativas a partir das células pluripotentes por um processo chamado indução – extremamente semelhante ao que ocorre em humanos. (Paloma Olivetto) (Correio Braziliense, 20/7)
3 – Garimpeiro acha dente de elefante no sul da Amazônia
Fóssil desenterrado em Porto Velho revela que espécie similar à asiática habitou floresta até 45 mil anos atrás
Um único dente achado por garimpeiros em Rondônia indica que a maior floresta tropical do mundo também já foi o lar do maior mamífero terrestre do planeta. A Amazônia de 45 mil anos atrás tinha elefantes, sugere uma nova pesquisa.
Mario Cozzuol, paleontólogo da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), mostra as estruturas em forma de lâmina no fragmento de molar, que mede 12 cm. São reforços que ajudavam a estrutura dentária a triturar alimentos muito abrasivos.
“Só elefantes e capivaras têm dentes com essa estrutura laminar, mas os de capivara não passam de 5 cm. Se por acaso existiu uma capivara do tamanho sugerido por esse dente, o fóssil é mais notícia ainda”, brinca ele.
Cozzuol e sua ex-aluna Ednair Rodrigues do Nascimento, da Unir (Universidade Federal de Rondônia), apresentarão o achado no 7º Simpósio Brasileiro de Paleontologia de Vertebrados, que acontece nesta semana no Rio. Se estiverem corretos, cai por terra a ideia de que havia uma espécie de barreira impedindo a entrada de elefantes na América do Sul durante a Era do Gelo.
Até hoje, o Brasil só parecia ter abrigado mastodontes, feras de tromba extintas que, embora se pareçam com elefantes, são parentes distantes desses últimos. “Sabia-se que elefantídeos haviam chegado à Costa Rica, mas não mais ao sul”, diz Cozzuol.
A coisa ainda estaria nesse pé se não fosse por Chico da Pampa, garimpeiro que, no começo dos anos 1990, doou o fóssil que achou em Porto Velho a Miguel Sant’Anna, do Laboratório de Paleontologia da Unir.
Anos depois, Nascimento estava catalogando fósseis no laboratório quando percebeu as estruturas laminares no dente. “Logo pensei em elefantes”, diz.
A análise confirmou a impressão, mas ainda não é possível saber a qual espécie exata pertence o dente. Uma possibilidade é que se trate de um Mammuthus columbi. Seria um mamute, portanto?
“Prefiro não usar a palavra “mamute”, porque as pessoas vão pensar num bicho peludo, e não era o caso”, diz Cozzuol. “O certo seria classificá-los como Elephas [gênero do elefante-asiático].”
Para os cientistas, o achado é só uma amostra da diversidade oculta de bichos da Amazônia pré-histórica. Essa fauna é desconhecida, em parte, por falta de pesquisas. Por outro lado, as próprias condições de obtenção dos fósseis não são fáceis.
“Quase todo o material está tão fundo que só aparece quando se escava para o garimpo de ouro”, explica Cozzuol. O próprio dente de elefante é prova disso: no arenito que ainda recobre parte do fóssil, o paleontólogo aponta pequenos pontos brilhantes: são grãos do metal precioso. (Reinaldo José Lopes) (Folha de SP, 20/7)