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Informativo 214 – Superpredador, répteis pré-históricos, corpo, caatinga, ovos e cobra

1 – Grupo acha fóssil de superpredador com 220 milhões de anos

2 – Ainda mais velhos

3 – Viagem ao centro do corpo

4 – Caatinga perde duas cidades de SP por ano

5- Desenho em ovos revela origens do simbolismo

6 – Descobertos fósseis de refeição interrompida

 

1 – Grupo acha fóssil de superpredador com 220 milhões de anos

 

Fera que viveu no atual Rio Grande do Sul pertencia ao grupo que originaria os mamíferos e conviveu com dinos

Em meio aos membros diminutos e tímidos da linhagem que desembocaria nos mamíferos, havia um gaúcho feroz. Do tamanho de um lobo e com igual apetite por carne, o animal de uns 220 milhões de anos pouco devia aos primeiros dinossauros predadores, com os quais provavelmente conviveu.

O nome da espécie, que acaba de ser apresentada formalmente à comunidade científica por um trio de pesquisadores da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), não deixa margem para dúvidas: Trucidocynodon riograndensis.

“É um supercarnívoro”, define a paleontóloga Marina Bento Soares, coautora do estudo sobre a fera na revista científica “Zootaxa”, junto com Cesar Leandro Schultz e o aluno de doutorado Téo Veiga de Oliveira. Por causa da preservação extraordinária do espécime (“o esqueleto está quase completo, até o osso ainda é branquinho”, conta Soares), o trio achou que valia a pena uma descrição minuciosa, que ocupa um artigo de 71 páginas -raridade nas normalmente sucintas publicações científicas.

Os mamíferos de hoje foram precedidos por uma grande variedade de criaturas chamadas cinodontes, cujo esqueleto mescla elementos típicos de répteis e outros mais característicos dos mamíferos, ou “mamaliformes”. Segundo Soares, esse mosaico de características também aparece no Trucidocynodon, que não está na linhagem da qual os mamíferos são descendentes diretos.

Apesar disso, a postura geral do animal lembra bastante os elementos típicos de um mamífero caçador. Em vez da postura “esparramada” de animais como lagartos, cujos membros arqueados fazem o corpo se arrastar pelo chão, o predador gaúcho mantinha suas patas em posição ereta.

Ligeiro

Também há indícios de que, ao menos com os membros da frente, ele caminhasse apoiado nos dedos, e não na planta das patas. “Por isso, ele poderia ter hábitos mais cursoriais, ou seja, de corredor”, afirma Soares.

É tentador associar o ar de lobo do esqueleto com a imagem de uma espécie que caçava em bando, mas a pesquisadora lembra que não há indícios desse tipo de comportamento entre cinodontes. Por outro lado, é provável que o bicho já fosse coberto de pelos e tivesse sangue quente, porque essas características favorecem o estilo de vida ativo indicado pelos membros mais móveis desse e de outros representantes do grupo.

O tamanho e os caninos afiados fazem do bicho uma exceção entre os cinodontes gaúchos. “Foi uma surpresa, de fato”, afirma a paleontóloga. Quase todos os parentes do animal têm dimensões mais próximas das de ratos ou camundongos, sendo provavelmente comedores de insetos. O único contemporâneo de tamanho comparável é um herbívoro.

O curioso, porém, é que, conforme os milhões de anos se sucedem, “há uma tendência de miniaturização dos cinodontes”, explica Soares. Por algum motivo, são as formas pequenas ou muito pequenas que sobrevivem e acabam dando origem aos mamíferos, enquanto bichos maiores, como o Trucidocynodon, desaparecem.

“Ocorrem vários pulsos de extinção ao longo do Triássico [período geológico no qual a espécie viveu], mas o porquê do fim dos cinodontes maiores ainda não está claro”, diz ela. (Folha de SP, 4/3)

 

2 – Ainda mais velhos

 

Descoberta de “parente” que viveu há 240 milhões de anos, feita na Tanzânia, indica que répteis pré-históricos podem ter surgido 10 milhões de anos antes do que se estimava

Um “parente” mais velho dos dinossauros foi descoberto por um grupo de pesquisadores na Tanzânia, indicando que os répteis pré-históricos podem ser mais velhos do que se estimava.

Em estudo publicado na edição desta quinta-feira (4/2) da revista “Nature”, paleontólogos dos Estados Unidos, Alemanha e África do Sul descrevem a descoberta de um animal que compartilha muitas características com os dinossauros, mas tendo vivido cerca de 10 milhões de anos antes.

A nova espécie foi denominada Asilisaurus kongwe e pertence a um grupo dos silessauros, que eram próximos dos dinossauros. O estudo indica que pelo menos três vezes durante a evolução dos extintos répteis e de seus parentes, animais carnívoros evoluíram em espécies que incluíram plantas na dieta. Essas mudanças ocorreram em um espaço de tempo inferior a 10 milhões de anos, um período relativamente curso em termos geológicos.

Segundo o estudo, a relação dos silessauros com os dinossauros pode ser comparada com a existente entre o homem e os chimpanzés. Para os pesquisadores, ainda que os mais velhos dinossauros descobertos até hoje tenham cerca de 230 milhões de anos, a presença de parentes próximos 10 milhões de anos antes implica que as linhagens dos dinossauros e dos silessauros divergiram de ancestrais comuns há pelo menos 240 milhões de anos.

Silessauros e dinossauros conviveram durante boa parte do período Triássico, entre 200 milhões e 250 milhões de anos atrás. Esse é o primeiro animal do período Triássico parecido com o dinossauro até hoje encontrado na África. O primeiro silessauro foi descoberto apenas em 2003.

Ossos fossilizados de pelo menos 14 espécimes foram encontrados em um depósito no sul da Tanzânia, tornando possível a reconstrução de um esqueleto quase completo. Faltaram apenas partes do crânio e dos membros superiores.

Os silessauros encontrados tinham entre 50 centímetros e 1 metro de altura e de 1 a 3 metros de comprimento. Pesavam de 10 a 30 quilos. Andavam com as quatro pernas e provavelmente se alimentavam de carne e de plantas, uma vez que tinham dentes triangulares e mandíbula inferior com uma ponta parecida com um bico.

A nova espécie foi escavada junto com restos de ancestrais primitivos dos crocodilianos. Segundo os autores, a presença desses animais no mesmo local e tempo indica que a diversificação dos parentes dos crocodilianos e das aves foi rápida e ocorreu também mais cedo do que se considerava até então.

“Todos adoram os dinossauros. Mas esse estudo fornece nova evidência de que eles eram apenas um de diversos grupos grandes e distintos de animais que explodiram em diversidade durante o Triássico”, disse Sterling Nesbitt, da Universidade Columbia, nos Estados Unidos, primeiro autor do artigo.

O artigo “Ecologically distinct dinosaurian sister group shows early diversification of Ornithodira” (Vol 464, 4 March 2010, DOI:10.1038/nature08718), de Sterling Nesbitt e outros, pode ser lido por assinantes da “Nature” em www.nature.com. (Agência Fapesp, 4/3)

 

3 – Viagem ao centro do corpo

 

Revelado mapa genético de 160 espécies de bactérias que homem leva no intestino

Alguns cientistas sonham em enviar uma sonda a Marte. Outros trabalham para explorar o fundo do mar com um robô submersível. Agora, um time internacional de pesquisadores corajosamente foi onde homem algum já esteve: eles conseguiram desvendar todos os genes das bactérias que existem no nosso intestino.

Isso pode não ter o mesmo impacto de uma aventura espacial ou uma incursão submarina, mas o exame detalhado do que vive dentro de nós também tem grande alcance, com implicações para a saúde humana. Tal análise pode ajudar a prevenir doenças que vão da úlcera ao câncer.

O estudo, publicado na revista “Nature”, decifrou as sequências de DNA de milhares de genes das incontáveis bactérias que residem no intestino humano. Foi descoberto que cerca de mil diferentes espécies de micróbios podem viver ali e que cada um de nós carrega, em média, 160 espécies, sendo que a maioria é comum a diferentes tipos de pessoas.

– É importante que as pessoas percebam que não somos realmente humanos – afirmou Jeroen Raes, do Laboratório Europeu de Biologia Molecular, um dos autores do estudo. – Somos una colônia ambulante de bactérias e elas são chave para a nossa saúde.

Estima-se que um intestino saudável possua cerca de 100 trilhões de células que contém micróbios – cerca de dez vezes mais do que o número de células presentes no corpo humano. Mesmo assim, quase nada se sabe sobre como essas bactérias ajudam a manter a saúde humana. As descobertas vão lançar uma nova luz sobre aspectos poucos conhecidos da biologia humana.

– Esse é um ecossistema muito complexo – explica Jeroen Raes, da Universidade de Vrije, na Bélgica, e um dos autores do estudo. – Não sabemos, por exemplo, como a comida é digerida e quais as espécies responsáveis por essa ação. Basicamente, o que fizemos foi sequenciar todos os seus genomas de uma só vez. Foi um grande esforço porque ninguém havia feito algo parecido. Trata-se de um trabalho 200 vezes maior do que aquele feito em torno do genoma humano.

Descoberta pode ajudar a prevenir doenças

No estudo, foram analisadas amostras de fezes de 124 voluntários, que tiveram seu DNA estudado através de uma “máquina genética” que, segundo os pesquisadores, permitiu que fossem rapidamente decifradas a ordem das “letras” que se posicionam ao longo de cada molécula de DNA, nossa unidade de herança.

Para realizar o trabalho, foi usada uma técnica especial, que permite sequenciar cada pedaço de DNA em uma amostra misturada, sem a necessidade de isolar anteriormente cada espécie de micróbio. Assim, foi possível estimar o número de espécies presentes.

– De todos os genes presentes no intestino humano, 99% são bacterianos, indicando que esse órgão pode conter entre 1.000 e 1.150 espécies bacterianas – afirma Jun Wang, do BGI-Shenzhen, na China, um dos maiores centros de pesquisas genéticas do mundo. – E cada um de nós carrega pelo menos 160 desses organismos, que são comuns a várias pessoas.

Segundo Raes, o trabalho foi um tour-deforce técnico porque envolveu a análise simultânea de diferentes tipos de micróbios, alguns dos quais eram novos e nunca tinham sido estudados.

– Construímos um grande mapa, incluindo em torno de mil espécies de bactérias, sendo que boa parte delas era desconhecida. Foi interessante descobrir que, nesse campo, temos muito mais em comum do que imaginávamos. Até então, pensávamos que a flora intestinal humana era bastante variada. Essa descoberta vai nos permitir saber, por exemplo, se uma pessoa é mais suscetível a algumas doenças intestinais do que outras.

(Steve Connor, The Independent) (O Globo, 4/3)

 

4 – Caatinga perde duas cidades de SP por ano

 

Área desmatada anualmente é de 2.763 km2, e ritmo é semelhante ao da derrubada na Amazônia; só resta 54% do bioma

A caatinga vem perdendo por ano uma área de sua vegetação nativa equivalente a duas vezes a cidade de São Paulo, revelou o primeiro monitoramento já feito sobre esse bioma. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, resta pouco mais da metade -53,62%- da cobertura vegetal original típica do semiárido nordestino.

A principal causa de desmatamento na região é a produção de energia. Abatida, a mata nativa é transformada em lenha e carvão destinados a abastecer siderúrgicas nos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo ou a mover indústrias de gesso e cerâmica instaladas no próprio semiárido.

“Sem estimularmos alternativas de geração de energia, como gás natural ou energia eólica [dos ventos], não vamos conter o desmatamento na caatinga”, observou na terça-feira (2/3) o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) ao divulgar os números do monitoramento do bioma, que só existe no Brasil.

Minc classificou de “intolerável” o ritmo do corte da vegetação no local e anunciou para breve novas ações de repressão no semiárido. Recentemente, o ministério mandou parar parte das indústrias de gesso instaladas na região.

Dados de satélite indicam que a caatinga perdeu, num período de seis anos, entre 2002 e 2008, 16.576 quilômetros quadrados de vegetação nativa. Isso equivale a 2% do bioma, que detém cerca de 10% do território nacional. O ritmo do desmatamento é semelhante ao verificado na Amazônia.

Apesar do porte menor das árvores, o abate da caatinga foi responsável pelo lançamento de 25 milhões de toneladas de carbono por ano na atmosfera. Isso significa o dobro do corte das emissões de carbono planejado pelo governo com medidas de eficiência energética em 2020. Ou o equivalente à geração de energia por fontes alternativas, como pequenas hidrelétricas e usinas eólicas, também em 2020, conforme as metas oficiais do país.

O desmatamento na caatinga preocupa porque a região do semiárido já foi identificada como uma das áreas mais vulneráveis no Brasil às mudanças climáticas. Um terço da economia pode ser afetado com o aumento da temperatura.

Carlos Minc adiantou que o bioma também deve contar com metas para a redução do abate de árvores, da mesma forma que a Amazônia e o cerrado. “A Amazônia é fundamental, mas o ministério não pode ser samba de uma nota só”, disse. Uma das medidas em estudo é a criação de mais unidades de conservação na caatinga, como a que será estabelecida na serra das Confusões (PI) neste mês. Áreas protegidas representam atualmente 7% do bioma.

Bahia e Ceará concentram mais da metade do desmatamento medido pelo ministério no período mais recente, até 2008. O município de Acopiara (CE) lidera o ranking. Em Alagoas, o ritmo foi menor, mas restam poucas áreas preservadas no Estado.

O padrão de corte de árvores na caatinga é diferente do verificado em outros biomas já monitorados. Nos últimos anos, os satélites mostram que o desmatamento ocorreu de forma pulverizada na região. (Marta Salomon) (Folha de SP, 3/3)

 

Luta contra a desertificação no semiárido fica em “fogo brando”

 

Embora conte com um plano nacional de enfrentamento e com um comitê técnico exclusivo no Ministério do Meio Ambiente, o combate à desertificação do semiárido, principal consequência do desmatamento da caatinga, ainda mobiliza poucos esforços dos governos federal, estaduais e municipais.

“É uma agenda que ainda está em fogo brando”, avalia o secretário de extrativismo do Ministério do Meio Ambiente, Egon Krakhecke. Para ele, falta “fortalecimento institucional” da temática no país.

No plano federal, por exemplo, a CNCD (Comissão Nacional de Combate à Desertificação), teoricamente a maior instância de controle das ações contra o desmatamento da caatinga, ainda não saiu do papel.

Lançada oficialmente pela então ministra Marina Silva em julho de 2008, a comissão, que deveria “estabelecer e priorizar as estratégias” do governo na área, teve apenas uma reunião, em novembro de 2008, para definir seu regimento. A realização de um segundo encontro depende da publicação, ainda pendente, do documento no “Diário Oficial da União”.

O regimento, segundo Krakhecke, está sob análise do departamento jurídico e deve ser publicado até abril.

Outra medida esperada é a aprovação da Política Nacional de Combate à Desertificação, parada na Câmara desde “nem lembro quando”, diz a técnica do Ministério do Meio Ambiente Luciana Valadares. “A gente precisa ter um orçamento mais definido, de mais força dentro do ministério.” O projeto aguarda votação desde 2007.

Sem documento

Nos Estados, a criação dos Planos Estaduais de Enfrentamento da Desertificação, compromisso assumido em 2004, também patina. Até hoje, dos nove Estados atingidos pelo problema, apenas Pernambuco finalizou o documento.

Na tentativa de fortalecer a temática, o Ministério do Meio Ambiente promoverá de hoje a sábado o primeiro Ened (Encontro Nacional de Enfrentamento da Desertificação). A ideia é que antigas reivindicações da área sejam assumidas por Estados, municípios e União, que devem se comprometer a fazer ações concretas.

“Desde o lançamento do PAN-Brasil [Programa de Ação de Combate à Desertificação], em 2004, estamos à espera de algo mais”, diz a coordenadora do combate à desertificação no Ceará, Liduína Costa. “Precisamos de mais compromisso dos governos com o tema.” (Estelita Hass Carazzai) (Folha de SP, 3/3)

 

5- Desenho em ovos revela origens do simbolismo

 

Inscrições têm 60 mil anos

Um pequeno pedaço do gigantesco quebra-cabeças da evolução humana pode ter sido encontrado. E ele tem forma de arte. Fragmentos de ovos de avestruz – com enigmáticas inscrições coloridas, entalhadas na sua superfície -, escavados na África do Sul, representariam um dos primeiros exemplos do uso do simbolismo pelo ser humano.

Segundo cientistas, as inscrições, feitas há cerca de 60 mil anos, seriam também uma pioneira forma de comunicação visual da espécie humana, capaz de dar mais pistas sobre as nossas origens. É o que revela um estudo publicado na “Proceedings of the National Academy of Sciences”.

O uso do simbolismo – a capacidade de usar uma coisa para representar outra – é considerado um gigantesco passo na história da evolução humana, um divisor de águas entre o homem e outros animais.

Os artefatos foram encontrados em Diepkloof, na África do Sul, em 1999, e têm sido analisados desde então. Até agora, os exemplos mais antigos de pensamento conceitual estavam em inscrições em pedaços de conchas descobertos na caverna de Skhul, em Israel. Estima-se que tais artefatos teriam sido feitos entre 90 e 100 mil anos atrás. Pedaços de pedras de 75 mil anos, com inscrições, também já tinham sido encontrados na África do Sul.

– O extraordinário nessa descoberta é o número de ovos, em torno de 300, que nos faz supor que se trata de um sistema de representação simbólica – afirma PierreJean Texier, da Universidade de Bordeaux, na Franca, um dos autores do estudo. – Há linhas cruzadas em diversos ângulos. A repetição desse padrão faz crer que esses humanos da Idade Média africana estava tentando comunicar alguma coisa. Talvez a sua identidade ou a de sua tribo.

A qualidade das gravações intrigou os pesquisadores, que tentaram reproduzi-las usando pedaços de pedra.

– Cascas de ovos de avestruz são bastante duras. Fazer esse tipo de inscrição nelas não é nada fácil – garante Texier, que acredita que as cores encontradas nos ovos são naturais. (O Globo, 3/3)

 

6 – Descobertos fósseis de refeição interrompida

 

Há 67 milhões de anos, cobra tentava comer dinossauro quando tempestade a soterrou

Uma cobra de 3,5 metros cerca o ninho de um dinossauro saurópode – aquele tipo herbívoro e pescoçudo. Um dos ovos começa a se romper. O ofídio aproxima-se. Embrulha, com seu corpo, o lar do filhote prestes a nascer. O bote é questão de segundos. Aí vem uma tempestade, ou fenômeno climático que o valha, e a cena congela-se no tempo. Muito tempo.

Sessenta e sete milhões de anos depois, cientistas anunciam o achado daqueles vestígios fósseis. A descoberta, publicada nesta quarta-feira (3/3) na revista “PLoS Biology”, deve oferecer aos paleontólogos uma visão mais ampla do comportamento e cardápio da tataravó de víboras, sucuris e que tais.

A análise dos fósseis, segundo o artigo, mostra que as cobras começaram a desenvolver, 100 milhões de anos atrás, mandíbulas móveis similares às que têm as víboras hoje. O réptil era, também, um dos poucos animais a atuar como predador contra os saurópodes.

– Esta é uma cobra antiga e bem preservada, que estava fazendo alguma coisa. Capturamos o seu comportamento – comemorou o paleontólogo Jeff Wilson, da Universidade de Michigan, que reconheceu os ossos do ofídio misturados aos dos dinossauros e aos filhotes. – A descoberta nos ajuda a entender a evolução das cobras, anatômica e ecologicamente.

Os vestígios fósseis foram encontrados em 1987 por Dhananhay Mohabey, do serviço geológico indiano. À época, no entanto, ele só foi capaz de distinguir os ossos do dinossauro e o ovo de onde ele saía. Wilson examinou o material em 2001 e, para sua surpresa, encontrou os vestígios da cobra, que esperava o saurópode.

– Vimos os ossos maiores, que pertencem ao ofídio, assim como seu típico envolvimento a uma presa – revelou.

Mohabey ajudou a colega a decifrar a cena. Segundo os pesquisadores, a cobra havia acabado de chegar ao ninho e preparava-se para devorar o filhote que emergia do ovo. Foi, no entanto, interrompida por uma tempestade ou algum outro desastre, que empurrou aqueles animais para baixo de camadas de sedimento.

O sítio arqueológico onde foi feita a descoberta, no estado indiano de Gurajat, já revelou cerca de 30 ninhos de saurópodes, além de pelo menos duas outras espécies de cobras.

Pesquisador da Universidade de Bristol, Michael Benton também escreveu na revista sobre o achado. Segundo ele, ainda é difícil determinar o comportamento dos animais antigos.

– É provável que, como os autores do artigo disseram, a cobra estivesse esperando para apanhar filhotes quando eles saíssem do ovo – opinou. – Claro que não podemos ter certeza absoluta a não ser que outros ofídios apareçam com ossos de pequenos dinossauros no estômago.

Integrante da Academia Nacional de Ciência da Índia, Ashok Sahni, que não teve envolvimento com a pesquisa, não impôs ressalvas: – É um levantamento memorável. Seu significado científico é mostrar o comportamento de cobras evoluídas, assim como o tamanho de suas presas preferenciais. (O Globo, 3/3)