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Informativo 608 – 3º C mais quente; calor e isca

1 – Mar fica 3°C mais quente no Sul e Sudeste

2 – Calor intenso afeta corais na Baía da Ilha Grande

3 – Uso de botos do Amazonas como isca para pesca pode causar extinção da espécie

 

1 – Mar fica 3°C mais quente no Sul e Sudeste

 

Onda de calor causou proliferação de micro-organismos marinhos, o que deixou mancha escura no oceano

As águas que banham a costa do Sudeste e do Sul do Brasil estão até 3°C mais quentes do que o normal para o mês de fevereiro.

 

Um período prolongado sem cobertura de nuvens fez a superfície do oceano se superaquecer, e cientistas avaliam se as perturbações ecológicas do calor podem afetar o ecossistema marinho.

 

O calor do mar neste início de ano foi constatado também por banhistas, que relataram temperatura fora do normal em praias do Rio e do litoral paulista. A água chegou a 28°C na costa. Cientistas investigam se o fenômeno está relacionado ao aquecimento global e se pode causar desequilíbrio ecológico.

 

A consequência visível mais notável da onda de calor para as águas costeiras foi a floração de algas e outros organismos marinhos fotossintéticos, que deixou uma gigante mancha escura no oceano. Essa formação se estendeu do mar do Rio de Janeiro até Santa Catarina.

 

“Uma mancha como essa pode reduzir o teor de oxigênio das águas de superfície, e isso pode espantar os peixes que ficam nessa região”, explica Sonia Gianesella, professora do Instituto Oceanográfico da USP. “Pode ser que peixes busquem águas mais profundas ou busquem horizontalmente outras áreas que não estão tão aquecidas.”

 

A pesquisadora diz já ter estudado outras manchas semelhantes no litoral, mas não se lembra de uma que tenha sido tão grande.

 

O Centro de Biologia Marinha da USP, em São Sebastião, enviou na semana passada uma equipe de pesquisadores até algumas áreas do mar onde a mancha estava presente. O barco de pesquisa Alpha Delphini, o mais ágil do instituto, já retornou e os cientistas analisam material orgânico coletado para entender melhor o fenômeno.

 

Cláudio Golçalves Tiago, biólogo da instituição, afirma que o calor excessivo em janeiro e no início de fevereiro também afeta animais à beira do mar, como as cracas.

 

“As cracas podem parecer insignificantes, mas elas são um organismo indicador daquilo que outros organismos estão sentindo”, afirma Gonçalves. “Sob calor intenso, elas ficam fervendo dentro da carapaça e podem ter uma mortandade muito grande.”

 

Outra preocupação trazida pelo calor é a mortalidade de corais, que são centros importantes de alimentação de peixes. O branqueamento de corais, sintoma típico de sua deterioração, porém, ainda não foi verificado como consequência desta onda de calor, afirma Gonçalves.

 

No início desta semana, pesquisadores da Marinha brasileira registraram a chegada da ressurgência –o afloramento de águas profundas, mais frias, perto da costa. Esse fluxo levou algum alívio às praias do Rio, mas ele vem do leste e dificilmente chega ao litoral norte de São Paulo.

 

Entre os cientistas que trabalham com oceanografia física e climatologia, a preocupação maior é a de que a atual onda de calor não seja apenas um fenômeno de variação natural do clima, mas sim algo alimentado pelas mudanças climáticas globais.

 

“O que é atípico nessa onda de calor é que ela é não só muito intensa mas também muito prolongada”, diz Regina Rodrigues, da Universidade Federal de Santa Catarina.

 

A cientista diz ter visto padrões climáticos muito incomuns para o Sudeste/Sul nos últimos anos. “Eu acredito que possa haver um efeito da mudança climática aí, mas isso ainda está em estudo.” (Rafael Garcia/Folha de S.Paulo) http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cienciasaude/152073-mar-fica-3c-mais-quente-no-sul-e-sudeste.shtml

 

2 – Calor intenso afeta corais na Baía da Ilha Grande

 

Processo de branqueamento de colônias pode levá-las à morte

A onda de calor que atormenta o Estado Rio neste verão afetou também a biodiversidade marinha. Na Baía da Ilha Grande, entre os municípios de Angra dos Reis e Paraty, pesquisadores registraram nos últimos dias grandes extensões de recifes sofrendo um processo de branqueamento, que ocorre diante das elevadas temperaturas e pode levar à morte das colônias.

 

O branqueamento é um alerta para a saúde dos corais. É como se eles estivessem gravemente doentes devido ao calor, à radiação UV e também à poluição. Não ocorre apenas no Brasil. Ontem um estudo apontou para o problema também a Austrália. No Rio, é alarmante e foi registrado nas 29 ilhas da Estação Ecológica (Esec) de Tamoios, uma área de preservação na Baía da Ilha Grande.

 

– Nunca tinha visto algo desta magnitude. O branqueamento às vezes ocorre no verão, mas este ano o calor está excepcional. A temperatura do mar, no caso em Paraty-Mirim, atingiu os 34 graus Celsius, o recorde desde que começamos as medições há dez anos – comentou Adriana Gomes, chefe interina da Esec de Tamoios.

 

Em janeiro, o mar fluminense sofreu um aquecimento atípico. Uma corrente vinda do Norte inibiu a ressurgência, um fenômeno que ocorre na região de Cabo Frio e que empurra as águas geladas do fundo para a superfície. Apenas nas últimas duas semanas a temperatura do mar começou a se normalizar.

 

– Ontem (anteontem) mergulhei mais uma vez, e o processo está bem expandido. Tem ocorrido a até três metros de profundidade, onde a água fica mais aquecida. Várias espécies estão sendo afetadas – completou Adriana.

 

Um dos pesquisadores que fez o registro foi o professor Joel Creed, do Projeto Coral Sol (do Laboratório de Ecologia Marinha da Uerj e do Instituto Brasileiro de Biodiversidade), que controla a expansão dessa espécie exótica na baía. O coral foi trazido de outros ecossistemas por plataformas de petróleo na década de 1980 e tem se espalhado pela região, ameaçando outras espécies. Com o enfraquecimento e a morte dos corais nativos, isto abriria espaço para o Sol se expandir ainda mais, segundo Creed.

 

Os pesquisadores do projeto analisaram 380 colônias de coral-cérebro (Mussismilia hispida) em seis locais na baía (Ilha dos Meros, do Algodão, Comprida, da Pescaria, do Mantimento e Ponta Arpuá). Destes, 51% estão branqueados e 9% estão mortos devido ao branqueamento. A região mais afetada, segundo o levantamento, foi a Ilha da Pescaria: 27% dos corais-cérebros mortos e 68% branqueados.

 

– Nunca tinha visto tantos corais passando por isso. Vi coral-cérebro de 20 ou 30 anos morto – relata.

 

Temperatura muda cor de corais

Os corais têm uma relação mutuamente vantajosa com algas unicelulares (zooxantelas). Enquanto o coral ganha energia produzida pela alga, esta, por sua vez, se beneficia da estrutura. Quando há um estresse climático, as microalgas são expulsas da colônia, explica o biólogo marinho Gustavo Duarte, coordenador executivo do Projeto Coral Vivo:

 

– Se ele vai morrer ou não, depende da intensidade do fenômeno e se ele é crônico. Se sobreviver, em seis meses percebemos uma recuperação da cor do coral, pois as algas voltam a se reproduzir. O branco é o esqueleto, e ele fica aparente por causa da perda das algas – explica Duarte, que diz estar acompanhando a situação. – Também recebemos denúncias disso. Eu mesmo estive na Praia do Sono (Trindade-Paraty) na última semana e percebi que a água estava muito quente.

 

A Baía da Ilha Grande é importante por sua biodiversidade marinha, e por isso no local foi criada a unidade de preservação da Esec de Tamoios. A perda de colônias pode afetar a sua diversidade, além de causar um desequilíbrio no fundo do mar.

 

– Esta situação deve ter conexão com fatores globais de mudanças climáticas. A gente só não pode ser conclusivo porque isto não foi medido com estudos científicos – completa Duarte.

 

As ondas de calor afetaram também corais da costa de Pilbara, no Oeste da Austrália. O processo lá, entretanto, é contínuo e vem sendo registrado há cinco anos, segundo um estudo publicado ontem pela Universidade do Oeste da Austrália. (Flávia Milhorance/O Globo)

http://oglobo.globo.com/ciencia/calor-intenso-afeta-corais-na-baia-da-ilha-grande-11599001#ixzz2tIV5oaew

 

3 – Uso de botos do Amazonas como isca para pesca pode causar extinção da espécie

 

Segundo as alegações, não há pessoal suficiente para exercer uma fiscalização contínua na região

Levantamento feito pela pesquisadora Sannie Muniz Brum com 35 comunidades de pescadores em área de reserva de desenvolvimento sustentável, na região do Baixo Rio Purus, no Amazonas, constatou que botos-vermelhos, conhecidos também como botos-cor-de-rosa, estão sendo mortos e usados como isca para a pesca do peixe piracatinga (Callophysusmacropterus).

 

Sannie é pesquisadora do Instituto Piagaçu (IPI) e colaboradora da Associação Amigos do Peixe-Boi (Ampa). O projeto teve apoio da Fundação Boticário de Proteção à Natureza. Sannie alerta que, no longo prazo, essa prática pode acabar levando à extinção do “golfinho da Amazônia”. “As medidas têm que ser tomadas agora. Se não, é extinção”, disse Sannie hoje (13) à Agência Brasil.

 

A coordenadora adjunta do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Aquáticos (CMA) do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Carla Marques, disse que, em comitês internacionais, o governo brasileiro tem sido cobrado sobre a preservação dos botos da Amazônia.

 

O problema, disse, é que não há pessoal suficiente para exercer uma fiscalização contínua na região. O ICMBio fiscaliza as áreas dentro das unidades de conservação e o Instituto Nacional do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) se encarrega de fiscalizar fora dessas unidades. “Dentro do instituto tem uma política de tentar evitar que ocorram essas práticas, mas o ICMBio não tem o poder de polícia”.

 

Carla Marques informou que têm sido feitas campanhas pelo governo em conjunto com o Centro de Estudo e Pesquisa da Amazônia (Cepam). O órgão do Ministério do Meio Ambiente tem conhecimento da utilização do golfinho como isca para pesca, o que é ilegal, e está articulando ações para coibir a prática em parceria com o Ibama e o próprio ministério. “A gente tem feito algumas ações de fiscalização em conjunto com o Ibama, mas as ações são pontuais. A Amazônia é um mundo inteiro. A gente não consegue coibir tudo”.

 

Carla admitiu que esse é um problema de difícil solução e que ocorre em outros países. Ela acredita que para resolver o problema, só com fiscalização. “Está todo mundo pensando em tentar mitigar esse problema, mas é de difícil solução pela falta de pessoal que se tem. Os dois órgãos têm pouco contingente para atender a uma região como a Amazônia”. Ela relatou, inclusive, que algumas ações ocorrem em parceria com a Polícia Federal e as polícias locais. “Mas são pontuais. A gente não consegue estar presente o tempo todo. E a pesca continua”.

 

Além de uma fiscalização mais rigorosa e permanente, a pesquisadora Sannie Brum defendeu a necessidade de se levar às comunidades que habitam em áreas protegidas informações para que saibam que é crime e ilegal usar botos-vermelhos como isca para a pesca. “É preciso que haja uma conscientização. Eles [pescadores] sabem que é proibido, que não podem fazer”. É preciso que haja uma coibição efetiva para que decidam parar essa prática. “Educar e trazer informações são medidas para a conscientização dos pescadores”.

 

Segundo a pesquisadora, a mortalidade do golfinhos é elevada na região do Baixo Purus devido à atividade de pesca da piracatinga. Considerando 15 toneladas pescadas somente na região, de acordo com relato dos próprios pescadores, a estimativa é que até 144 botos-cor-de-rosa sejam mortos por ano para virar isca. “É um absurdo”.

 

A situação se agrava considerando que os golfinhos têm uma reprodução lenta. As fêmeas têm uma gestação de cerca de dez meses e, após o nascimento, podem cuidar dos filhotes por até quatro anos. Com isso, a inserção de novos botos na natureza é demorada. Sannie diz que a morte de um grande número desses animais pode inviabilizar a manutenção da espécie.

 

Para a pesquisadora, a fiscalização é importante, mas constitui o primeiro passo. “Ela tem que ser mais efetiva e aberta à discussão”. Ela reiterou a necessidade de uma grande campanha de educação ambiental nas comunidades, para que os moradores entendam a importância que o boto tem para o meio ambiente e para ele mesmo. Hoje, disse, o pescador vê o boto como um concorrente para suas atividades de pesca. “A gente precisa mudar isso. E só muda com educação”.

 

Sannie Brum pretende começar uma nova pesquisa para descobrir o que pode ser usado como alternativa de isca para a pesca da piracatinga. A coordenadora adjunta do CMA, Carla Marques, informou que esse é um tipo de peixe que se alimenta de carne morta ou em putrefação. Por isso, é rejeitado como alimento pelos próprios pescadores.

 

Sannie Brum explicou que apesar disso, eles vendem o produto para mercados de São Paulo, do Paraná e do Nordeste e, inclusive, para outros países, como a Colômbia. Para isso, usam o nome fantasia de “douradinha”. Como é vendido sob a forma de filé, a piracatinga acaba sendo comprada pelos consumidores que o confundem com um peixe nobre, a dourada (Brachyplathystomaflavicans). (Alana Gandra / Agência Brasil)