Fechar menu lateral

Informativo 533 – Mais de 190 e Inação

1 – Documento final da Rio+20 é oficialmente adotado por mais de 190 países

2 – ‘Inação está levando o planeta ao limite’

 

1 – Documento final da Rio+20 é oficialmente adotado por mais de 190 países

 

Confira abaixo a íntegra do documento “O Futuro que Queremos” e também do texto divulgado pela Cúpula dos Povos.

O documento final da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, foi aprovado na noite de 22 de junho sem alterações pelos chefes de Estado e Governo e oficialmente adotado por mais de 190 países. O texto havia sido finalizado no dia 19 de junho, depois de seis dias de discussões entre os negociadores.

 

A presidente Dilma Rousseff, em seu discurso de encerramento, destacou como um dos grandes resultados do encontro o “resgate do multilateralismo” – algo repetido em toda reunião internacional que não acaba em um fracasso óbvio.

 

“O Futuro que Queremos”, de 53 páginas, fixa 2015 como data mágica da sustentabilidade global. É quando entrariam em vigor os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, ideia que deve ganhar definições a partir de 2013. Os objetivos são o principal processo internacional lançado pela Rio+20, que também prometeu adotar um programa de dez anos para rever os padrões de produção e consumo da humanidade.

 

Outras decisões esperadas, como um mecanismo de financiamento ao desenvolvimento sustentável e um acordo global sobre a proteção do alto-mar, foram adiadas. “É como trocar as cadeiras de lugar no deque do Titanic”, disse Kumi Naidoo, diretor-executivo do Greenpeace, resumindo a reunião.

 

A presidente Dilma também anunciou que o Brasil dará R$ 12 milhões ao Pnuma (programa ambiental da ONU) e mais R$ 20 milhões para o combate à mudança climática em países pobres.

 

O secretário-geral da Rio+20, Sha Zukang, afirmou que parte do legado da Rio+20 são os compromissos voluntários firmados entre setor privado, governos e sociedade civil. Segundo ele, foram registrados 705 acordos, que irão direcionar R$ 1,6 trilhão ao desenvolvimento sustentável nos próximos dez anos.

 

O caráter voluntário dos compromissos foi criticado. “Não precisávamos de pessoas anunciando aqui o que poderiam ter anunciado em suas capitais”, disse Naidoo. Sha lançou uma nota de cautela, lembrando que os compromissos feitos em Copenhague, em 2009, não foram cumpridos até hoje.

 

O documento final traz compromissos como o fortalecimento do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), a criação de um Fórum Político de Alto Nível Internacional e o desenvolvimento sustentável com erradicação da pobreza, entre outros.

 

Ao final da conferência, Bolívia e Equador fizeram ressalvas a alguns pontos do documento, como a redução dos subsídios aos combustíveis fósseis. Ambos disseram que não vão aceitar qualquer monitoramento externo a suas políticas energéticas internas. A Bolívia também disse rechaçar o conceito de economia verde que, para o governo, é o mesmo que mercantilizar a natureza.

 

Conheça o documento “O futuro que queremos” (versão em inglês) no link: http://rio20.ebc.com.br/wp-content/uploads/2012/06/TheFutureWeWant.pdf

 

Só em 2015 – O resultado mais concreto da Rio+20 só vai começar a aparecer em 2015. Daqui a três anos, as Nações Unidas deverão apresentar metas de desenvolvimento sustentável a serem perseguidas por todos os países, assim como a origem do dinheiro para ajudar os países mais pobres a cumprirem os chamados Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. “A estrada será longa e difícil” comentou o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, sobre o dever de casa estabelecido pela declaração final de chefes de Estado e de governo. Encerrada a Rio+20, Ban tem agora a tarefa de formar grupo de trabalho para discutir metas para o aumento do consumo de energia renováveis, reduzir a pobreza e as emissões de carbono para uma nova rodada de negociações.

 

Negociadores brasileiros reconheceram que se frustraram pela Rio+20 não ter conseguido obter pelo menos a indicação dos temas a serem tratados pelas futuras metas. Faltou consenso em relação a isso, sobretudo pela dificuldade em discutir compromissos em relação à redução das emissões de gases de efeito estufa. Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), apontados como principal resultado da Rio+20, partiu de uma proposta brasileira lançada no ano passado. Se inspira nos Objetivos do Milênio, que países em desenvolvimento perseguem até 2015 na área social e de meio ambiente.

 

A expectativa dos negociadores brasileiros é que os ODS organizem a nova etapa da agenda para reduzir a pobreza e o impacto do crescimento sobre o meio ambiente. As Nações Unidas defendem o desenvolvimento sustentável desde o início dos anos 80. Mas pesquisa contratada pelo Ministério do Meio Ambiente mostra que mais da metade da população brasileira (53%) não sabia do que se tratava às vésperas da Rio+20. Muitos dos compromissos assumidos na agenda internacional continuavam no papel.

 

O dever de casa definido durante a conferência prevê um “processo intergovernamental transparente” para definir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Mas a futura adesão será voluntária. Países que não cumprirem as metas não serão punidos. Um dos parágrafos da declaração final da Rio+20 diz que o cumprimento dos Objetivos levará em conta as realidades nacionais.

 

O primeiro passo é a criação de um grupo de trabalho até o final deste ano. Esse grupo será formado por 30 integrantes nomeados pelos países membros da ONU. O resultado do debate será submetido à Assembleia-Geral da ONU de 2013. Um segundo comitê composto igualmente por 30 especialistas indicados pelos grupos regionais ficará encarregado de discutir meios de ajudar os países mais pobres a cumprirem as metas. O trabalho deverá ser concluído até 2014.

 

Cúpula dos Povos – A declaração final da Cúpula dos Povos – sintetizada em um documento de quatro páginas e 20 parágrafos – ataca a mercantilização da vida e faz a defesa dos bens comuns e da justiça social e ambiental. A cúpula reuniu durante oito dias representantes da sociedade civil em atividades paralelas à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio+20.

 

O documento divulgado critica as instituições financeiras multilaterais, as coalizações a serviço do sistema financeiro, como o G8 e G20, a captura corporativa das Nações Unidas e a maioria dos governos, “por demonstrarem irresponsabilidade com o futuro da humanidade e do planeta”.

 

A declaração ressalta que houve retrocessos na área dos direitos humanos em relação ao Fórum Global, que reuniu a sociedade civil também no Aterro do Flamengo, durante a Rio92. “A Rio+20 repete o falido roteiro de falsas soluções defendidas pelos mesmos atores que provocaram a crise global. À medida que essa crise se aprofunda, mais as corporações avançam contra os direitos dos povos, a democracia e a natureza.”

 

A economia verde, tão festejada na Rio+20 por líderes mundiais e empresários, foi desqualificada pelos participantes da cúpula. “A dita economia verde é uma das expressões da atual fase financeira do capitalismo que também se utiliza de velhos e novos mecanismos, tais como o aprofundamento do endividamento público-privado, o super-estímulo ao consumo, a apropriação e concentração de novas tecnologias.”

 

O documento exige o reconhecimento do trabalho das mulheres e afirma o feminismo como instrumento da igualdade e a autonomia das mulheres sobre seus corpos. Também enfatiza o fortalecimento das economias locais como forma de garantir uma vida sustentável.

Ao final são destacados oito eixos de luta e termina com uma exortação à mobilização. “Voltaremos aos nossos territórios, regiões e países animados para construirmos as convergências necessárias para seguirmos em luta, resistindo e avançando contra o sistema capitalista e suas velhas e renovadas formas de reprodução”.

 

A íntegra da declaração final pode ser acessada na página da Cúpula dos Povos na internet, no link: http://cupuladospovos.org.br/wp-content/uploads/2012/06/Carta-final_Cupula-dos-Povos.pdf.

 

60 toneladas de lixo – Cerca de 60 toneladas de lixo foram produzidas na última semana nos locais da Rio+20, além da Cúpula dos Povos e dos acampamentos dos participantes do evento. Os espaços de coleta feita pela Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) foram o Centro Integrado de Educação Pública (Ciep) José Pedro Varela, Sambódromo, Campus da Praia Vermelha da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ciep Trancredo Neves, a Quinta da Boa Vista e o Parque dos Atletas.

 

Segundo o coordenador de Sustentabilidade da Rio+20, o biólogo Francisco Nilson, a organização do evento teve como objetivo conscientizar os participantes sobre a gestão correta do lixo e a importância de se reduzir o consumo. Os materiais utilizados durante o evento são biodegradáveis ou compostáveis. Os copos de água são feitos de bagaço de cana ou de milho, que são fontes renováveis e não agridem o meio ambiente.

 

“Nós estimulamos o uso de squeezes, que são aquelas garrafinhas portáteis para armazenar água ou outros líquidos, que muitos delegados já tinham ou ganharam durante a conferência. Além disso, incentivamos o uso de refil de água. Havia galões espalhados pelos espaços sociais”, disse o coordenador.

 

A organização do encontro, em parceria com o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), montou um grupo de trabalho para debater como seria feita a divisão dos resíduos recicláveis entre as cooperativas. “Daí saiu nosso modelo de repartição de materiais recicláveis, e também a ideia de colocar educadores ambientais, que são catadores, nos espaços oficiais, na tarefa de conscientizar a população.”

 

Segundo Francisco Nilson, os resíduos não recicláveis tiveram como destino o aterro, que é o mais correto para esse tipo de material, por dispor de controle de emissões de gases de efeito estufa. “A ideia é irmos aprimorando essas estratégias de sustentabilidade para os próximos eventos. Com a Rio+20, nós demos um bom primeiro passo, mas ainda temos um caminho até 2016. Nós tem um potencial enorme para implementar um sistema invejável de gestão de resíduos no Rio de Janeiro”, disse o coordenador.

 

Cerca de 110 mil pessoas foram ao Rio de Janeiro para participar da Rio+20, gerando para a cidade um rendimento extra de R$ 274 milhões em hospedagem, transporte e alimentação. O dado consta do balanço operacional da Rio+20, divulgado pela prefeitura carioca.

 

Aproximadamente 45 mil pessoas estiveram presentes no Riocentro, local que sediou a conferência da ONU, e mais de 1 milhão de participantes estiveram nos eventos paralelos, com destaque para a Cúpula dos Povos, no Parque do Flamengo, que reuniu 300 mil pessoas, e para o Espaço Humanidade 2012, no Forte de Copacabana, que teve 210 mil visitantes.

 

De acordo com a prefeitura do Rio, foram registradas 23 manifestações durante o período da conferência, entre os dias 13 e 22, mas oito delas não causaram impacto ao trânsito. O protesto que reuniu maior número de pessoas foi o realizado no dia 20, quando ativistas, indígenas e estudantes ocuparam as avenidas Presidente Vargas e Rio Branco, no centro da cidade. (Jornal da Ciência, com agências de notícias)

 

2 – ‘Inação está levando o planeta ao limite’

 

Cientista sueco diz que humanidade já ultrapassou vários limiares importantes para o bom funcionamento da Terra.

O hidrólogo sueco Johan Rockström chegou ao Rio de Janeiro na semana retrasada com uma certeza: a Terra está no limiar de um futuro no qual o risco de colapso ambiental é inédito. E saiu na semana passada com outra: os governos não escutam.

 

Diretor do Centro de Resiliência de Estocolmo, Rockström tornou-se uma espécie de celebridade na academia ao propor, em 2009, o conceito de “espaço de operação seguro” para a humanidade.

 

O grupo de 28 cientistas liderado por ele mostrou, num estudo seminal no periódico “Nature”, que a civilização já ultrapassou três de nove barreiras planetárias cujo rompimento pode levar a pontos de virada no sistema terrestre – e a possíveis catástrofes. A pedido do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, Rockström coordenou um grupo de Prêmios Nobel que produziu uma carta com recomendações sobre sustentabilidade global para dar subsídios às decisões da Rio+20, conferência ambiental que terminou nesta sexta no Rio.

 

Barrados no baile – Dois dos conceitos-chave da carta, porém, ficaram de fora da declaração final da conferência, “O Futuro que Queremos”: o empoderamento das mulheres e o próprio reconhecimento de que limites planetários existem. O que, para o pesquisador sueco, é uma má notícia, já que o avanço da ciência anda mostrando que a transgressão desses limites é ainda mais séria do que seu grupo imaginava em 2009.

 

Na pesquisa original, os três limites já transpostos eram os de biodiversidade, mudança climática e ciclo do nitrogênio (ligado ao uso excessivo de fertilizantes, entre outras mazelas ambientais). “O que aconteceu desde então é que nós aprendemos mais sobre o limite do fósforo e descobrimos que já o transgredimos”, declarou Rockström. “Não é uma mensagem que muita gente goste de ouvir, mas estamos chegando ao teto do que o planeta é capaz de suportar sem gerar nenhuma surpresa.”

 

O hidrólogo compara o sistema planetário a uma “mãe muito compreensiva” que aceitou ser usada como “lata de lixo” sem grandes problemas até recentemente. “Hoje nós vemos que essa era chegou ao fim. E nós não sabíamos disso em 2005, não sabíamos disso em 2002, certamente não sabíamos disso em 1992. É uma situação tão nova que nós perdemos qualquer liberdade”, afirma.

 

Cadê a ciência? – Rockström também critica o que vê como marginalização da ciência no debate político das conferências ambientais da ONU. “A ciência precisa entrar nas negociações, hoje ela está fora”, diz. Um exemplo seria o resultado da conferência do clima de Durban (África do Sul), que deixou para 2020 a redução de emissões de gases causadores do efeito estufa, como o CO2.

 

“Do ponto de vista científico, é uma irresponsabilidade total. Se você adiar a ação para 2020, o ritmo da redução terá de ser de 7% a 8% por ano. Mas fazer 200 países reduzirem emissões de 7% a 8% por ano não é viável, não consigo enxergar a revolução tecnológica que permitiria que isso acontecesse.”

 

Por tudo isso, ele afirma que a Rio+20 “não nos leva muito longe” para resolver o problema. “O texto não reflete a urgência que enfrentamos. É uma enorme encruzilhada para a humanidade. Se não acertarmos agora, será tarde demais: a Rio+30 não vai resolver. Então há razão para preocupação.”

 

Ele também fez críticas à imprensa por dar espaço aos poucos cientistas que minimizam a gravidade da situação. “Os jornalistas simplesmente não conseguem distinguir o que 99% dos cientistas dizem do que diz um punhado de homens provocadores, excêntricos e idosos.” (Folha de São Paulo)