1 – Brasil está à frente dos EUA em novo índice
2 – Rio+20: Lovejoy teme que crise econômica mundial tire o foco dos problemas ambientais
3 – Rio+20: ‘É possível conceber uma Amazônia com desenvolvimento, biodiversidade e pluralidade social?’, questiona diretora da SBPC
1 – Brasil está à frente dos EUA em novo índice
Cálculo feito pelo Pnuma, braço ambiental da ONU, associa PIB, indicadores sociais e recursos naturais. Proposta foi apresentada ontem (17).
Em ranking baseado num novo cálculo que associa riqueza dos países com uso dos recursos naturais divulgado ontem pelo Pnuma, braço ambiental da ONU, o Brasil aparece atrás da China e na frente de países como Estados Unidos e Canadá.
O resultado, porém, não indica um cenário nada otimista para a maioria dos países avaliados – China, Estados Unidos, África do Sul e Brasil aparecem como tendo esgotado significativamente seu capital base natural, termo usado para o conjunto de recursos renováveis e não renováveis, como combustíveis fósseis, florestas e pesca.
A proposta, batizada de Índice de Riqueza Inclusiva (IRI), se propõe a integrar aspectos sociais e ambientais ao desempenho econômico das nações, se apresentando como um indicador a princípio mais completo do que o Produto Interno Bruto (PIB) e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medidas usadas para quantificar riqueza e desenvolvimento dos países.
O indicador foi apresentado ontem na Rio+20 como sugestão para mudar a maneira como o mundo mede suas riquezas, e a expectativa é de que, com o tempo, ele seja incorporado pelos países. O Pnuma pretende divulgar o IRI a cada dois anos.
Perdas. O relatório observou as mudanças em 20 países, que juntos representam quase três quartos do PIB mundial, de 1990 a 2008. Durante o período, os recursos naturais per capita diminuíram em 33% na África do Sul, 25% no Brasil, 20% nos Estados Unidos e 17% na China.
No Brasil, o período coincidiu com um momento de avanço do desmatamento na Amazônia e no Cerrado, com a expansão do gado e da soja. Das 20 nações pesquisadas pelo relatório, somente o Japão não sofreu diminuição do capital natural, por causa do aumento da cobertura florestal.
“A Rio+20 é uma oportunidade para abandonar o PIB como medida de prosperidade no século 21. Ele não serve para medir o bem-estar humano, ou seja, as questões sociais e a situação dos recursos naturais de uma nação”, disse o diretor executivo do Pnuma, Achim Steiner.
Ele afirmou esperar que líderes mundiais olhem para esse indicador, levando-o para seus ministérios de desenvolvimento e planejamento como um parâmetro válido na definição de políticas públicas.
Para o professor Anantha Duraiappah, diretor do relatório, a proposta “representa o primeiro passo fundamental na mudança do paradigma econômico global, forçando os países a reavaliar suas necessidades e objetivos”. Ele ressalta que o cálculo é feito de forma bastante complexa, utilizando dados ambientais, sociais e econômicos dos países.
Sugestões. O relatório traz também várias sugestões para os países melhorarem seu Índice de Riqueza Inclusiva – uma das principais recomendações, válida para todos, é o investimento em reflorestamento, biodiversidade e diversidade agrícola.
O texto também diz que governos e organizações internacionais devem estabelecer programas de pesquisa para calcular os principais componentes do capital natural, particularmente ecossistemas. Cada país deve mapear e conhecer sua própria geografia natural. (O Estado de São Paulo)
2 – Rio+20: Lovejoy teme que crise econômica mundial tire o foco dos problemas ambientais
O cientista norte-americano Thomas Lovejoy, estudioso da Floresta Amazônica há mais de quatro décadas e reconhecido mundialmente pela atuação em defesa do meio ambiente, teme que a crise econômica mundial tire o foco dos problemas de longo prazo relacionados à biodiversidade.
Segundo ele, alguns países não estão dando a devida importância aos problemas relacionados à deterioração do meio ambiente. “A crise mundial é um problema de momento, o que distrai alguns países. E os problemas mais sérios, de longo prazo, estão escondidos, como a perda da biodiversidade, o efeito estufa e o ciclo de nitrogênio”, disse ele, em entrevista ao Jornal da Ciência.
Ele está no Brasil acompanhando as discussões da Conferência sobre o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. Paralelamente ao evento, o cientista recebeu, sábado (16), a edição especial do Prêmio Muriqui 2012, no pavilhão do Governo do Estado do Rio de Janeiro no Parque dos Atletas, pelo conjunto de sua obra em defesa da biodiversidade e do desenvolvimento sustentável mundial. A cerimônia ocorreu durante o seminário “As Reservas da Biosfera e a Rio+20”, realizado pelo Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA) que concede o prêmio desde 1993.
Thomas Lovejoy é biólogo, consultor-chefe de biodiversidade para o presidente do Banco Mundial, conselheiro sênior do presidente da Fundação das Nações Unidas e presidente do Centro Heinz para Ciência, Economia e Meio Ambiente. É professor da Universidade de Ciência Ambiental e Política na Universidade George Mason e presidente do Instituto Yale para Estudos da Biosfera, nos Estados Unidos.
Conforme avalia Lovejoy, cada elemento discutido na Rio+20 “é de muita importância”, mas “em totalidade não estamos lutando” na escala em que o meio ambiente precisa. “Existem muitos países com distração e outros que não compreendem a seriedade do desafio”, disse ele, responsável pela introdução do termo “diversidade biológica” na comunidade científica e um dos estudiosos da Amazônia brasileira há mais de 40 anos.
Lovejoy fez uma análise sobre o desempenho das metas traçadas na Eco92. Segundo disse, alguns aspectos avançaram e outros perderam velocidade. É o caso da promessa de países ricos de aumentar a ajuda financeira para o desenvolvimento estrangeiro no que se refere à proteção ambiental. Segundo ele, o “dinheiro não chegou”. “E agora temos menos tempo e desafios ambientais e econômicos maiores”, disse. A avaliação é de que a crise mundial, principalmente da Europa, deve inviabilizar os avanços nas propostas ambientais para os próximos anos.
Avaliação sobre o Código Florestal – Ao fazer uma análise sobre a votação do Código Florestal, no Brasil, o cientista norte-americano destacou que o mundo atravessa um momento em que os interesses de econômicos de curto prazo estão impedindo o progresso na recuperação do Planeta.
“Esse não é um fato isolado do Brasil, mas de todos os países”, disse ele. Nesse caso, o cientista declarou que, pelo menos, o Palácio do Planalto conseguiu melhorar o texto do Código Florestal encaminhado pela Câmara dos Deputados, por intermédio de vetos e publicação de Medida Provisória. “O leque que chegou na mesa da presidente (Dilma Rousseff) era muito pior do que a lei final. Ou seja, a lei final está muito melhor do que o leque que chegou na mesa da presidente”, destacou.
Insatisfeito com a desempenho do Código Florestal, o diretor da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), José Antonio Aleixo, espera que após a Rio+20 os parlamentares responsáveis pela reformulação da Lei Ambiental se conscientizem de que o Brasil precisa de uma legislação capaz de proteger todos os biomas brasileiros e garantir a produção de alimentos com sustentabilidade. “A minha expectativa é de que depois da Rio+20 eles [parlamentares] tomem a consciência de que o Brasil é mais importante do que eles pensam de si próprios”.
Segundo Aleixo, o Código Florestal tem de proteger todos os biomas brasileiros: Amazônia – a maior floresta tropical do mundo, Pantanal, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga e os Costeiros, conforme defendia o geógrafo Aziz Ab´Saber,falecido no dia 16 de março de 2012, aos 88 anos, uma das referências da comunidade científica na defesa de um Código Florestal amplo e capaz de proteger todos os biomas brasileiros, o que chamou de Código da Biodiversidade.
Aleixo teme que após a Rio+20 as inúmeras modificações que (deputados) estão querendo fazer na medida provisória do Código Florestal que o governo elaborou traga dificuldades para o Brasil. “A briga entre agronegócio e ambientalistas diminuiu, mas não acabou”, declarou. (Viviane Monteiro – Jornal da Ciência)
3 – Rio+20: ‘É possível conceber uma Amazônia com desenvolvimento, biodiversidade e pluralidade social?’, questiona diretora da SBPC
Em palestra ministrada no último sábado (16), a socióloga, professora da Universidade Federal do Pará (UFPA) e diretora da SBPC, Edna Maria Ramos de Castro falou sobre o processo histórico de ocupação da região amazônica e questionou o modelo de desenvolvimento econômico usado no Brasil, que contrasta com a visão de comunidades tradicionais e indígenas sobre a relação entre homem e natureza.
Dando continuidade ao ciclo de debates promovido pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) na Rio+20, a pesquisadora da UFPA, Edna Castro ministrou a palestra ‘Amazônia, Sociedade e Natureza’, no dia 16 de junho, no Armazém da Ciência, no Píer Mauá. Sua exposição tratou sobre o cenário atual da região amazônica do ponto de vista de como a sociedade preserva natureza. Para isso, o raciocínio da pesquisadora passava pela definição dessa ‘sociedade’ e do conceito de ‘natureza’.
Edna se refere à importância de estudar a Amazônia como uma área continental que ultrapassa as fronteiras brasileiras, que estão mais abertas devido à pressão das atividades econômicas na região. “Novas atividades precisam de terra e a pressão sempre é sobre as terras”, explica ao falar que, em geral, as polêmicas sobre a região tratam sobre as formas de uso do território, contrastando os movimentos de ocupação e a preservação da biodiversidade.
“A riqueza [da biodiversidade] da Amazônia permite que o mundo pense no Brasil como uma grande potência e essa ideia mobiliza recursos públicos e interesses diversos, empresariais ou não, do País ou não. O Brasil, como país forte na região, acaba determinando o ritmo dessa ocupação”, diz a socióloga, citando exemplo de projetos do BNDES, Petrobras e Vale nas fronteiras da Amazônia. Ela afirma que os países vizinhos acabam tomando decisões semelhantes sobre o desenvolvimento da região e enfrentam resistência dos povos indígenas, em movimento semelhante ao que acontece na região Norte do Brasil.
Sobre o histórico de ocupação do território amazônico, Edna lembra a colonização europeia, principalmente portuguesa e espanhola, e os ciclos de desenvolvimento que aconteceram na região, como o ciclo da borracha. Para a pesquisadora, esses momentos foram importantes para a fixação da população na Amazônia, que hoje conta com cidades bem estruturadas. O problema é que essa ocupação de forma intensiva, demográfica e economicamente, também interfere na preservação da biodiversidade e na relação que as comunidades tradicionais têm com a natureza.
Ao lidar com a biodiversidade, a socióloga esclarece a diferença entre o pensamento ocidental e o conhecimento das comunidades tradicionais. “Essa, que é uma velha questão, do meu ponto de vista, é uma questão central nesse debate. A sociedade ocidental ainda entende desenvolvimento como crescimento econômico, e essa não é a concepção das comunidades tradicionais e indígenas, que não separam o homem da natureza”, explica.
Edna destaca a importância dessas comunidades tradicionais participarem da conferência Rio+20, trazendo seus conhecimentos e mostrando outras maneiras de pensar e entender o que é desenvolvimento. O debate é importante para refletir sobre a concepção de diferentes pontos de vista sobre a natureza e sua relação com o homem.
“Por que a região tem que ser igual às outras? Por que ela não pode ser ela mesma? O desenvolvimento não pode conservar as diversas línguas, conhecimentos e culturas existentes na região? Isso também é riqueza”, declarou. Edna explica que a Amazônia, além da riqueza natural tão aclamada, também é rica em cultura e saberes. Para ela, o maior desafio é justamente discutir desenvolvimento econômico, preservando a biodiversidade e o multiculturalismo, “como transformar essa tensão em uma relação de respeito?”, questiona.
Belo Monte – A socióloga dedicou boa parte de sua apresentação aos chamados ‘Grandes Projetos’ por eles serem dinamizadores de outras atividades. Como exemplo, Edna abordou projetos de hidrelétricas, que “sempre são grandes projetos quando se trata de Amazônia”. Especialmente sobre a construção da usina de Belo Monte, Edna critica o discurso desenvolvimentista e afirma que existem muitos estudos que demonstram a insustentabilidade ambiental do projeto.
“Além disso, é possível observar também a desrregularização de dispositivos legais existentes que não foram cumpridos com o projeto. Existem pelo menos 12 ações do Ministério Público em tramitação sobre a Belo Monte e que podem parar a construção devido à ilegalidade e ao desrespeito a dispositivos legais, que mostram um processo de modernização autoritário e com violação de direitos humanos”, critica.
A pesquisadora lembra da mobilização contra a construção da usina que está acontecendo na região de Altamira intitulada ‘Xingu+23’, em paralelo à Rio+20. Centenas de pessoas denunciam crimes socioambientais que estariam sendo cometidos com a construção de grandes projetos hidrelétricos na Amazônia. Belo Monte é a primeira de várias barragens que o governo brasileiro pretende construir na região.
Edna destaca que mesmo as comunidades indígenas que não serão atingidas diretamente pela construção em seus territórios, serão afetadas por mudanças que acontecerão nos ecossistemas de toda a região. A socióloga relembra outras mobilizações de comunidades peruanas sobre as hidrelétricas que estão sendo construídas na bacia do rio Madeira.
A pesquisadora se diz pessimista em relação ao futuro da região “porque quem faz pesquisa lá sente o peso das ações governamentais”, lamenta. (Jornal da Ciência)