1 – Carta de Princípios Escolares por um Mundo Sustentável
2 – ‘A Rio+20 tem obrigação de quebrar a inércia’
3 – Saída passa pela interação entre ciência e política
1 – Carta de Princípios Escolares por um Mundo Sustentável
Publicação traz documento elaborado por escolas públicas municipais do Rio de Janeiro.
Com o objetivo de criar novos hábitos nos alunos, tornando-os cidadãos conscientes e preocupados com a questão da sustentabilidade, a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro lança a “Carta de Princípios Escolares por um Mundo Sustentável”, que contou com a participação de 1.069 escolas da rede municipal. O documento lista 20 princípios que devem ser incorporados às práticas escolares executadas pela rede nos próximos anos.
“Entendemos que é durante o Ensino Fundamental que os alunos constroem seus valores individuais e, por isso, todos os temas que dizem respeito a uma ética frente a nossos contemporâneos e às futuras gerações devem ser trabalhados. Mais do que garantir o acesso de nossas crianças às salas de aula, com uma educação de qualidade, queremos garantir que todas tenham direito a um futuro melhor, formando, assim, jovens autônomos, competentes e solidários”, ressalta a secretária de Educação, Claudia Costin, na abertura da Carta.
Incentivador da ideia, o diretor do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia do MCTI, e conselheiro da SBPC, Ildeu de Castro Moreira, acredita que o projeto deve ser disseminado em todo o País. “Acho que é uma excelente iniciativa que deveria ser seguida por outras cidades brasileiras”, destacou.
Confira a íntegra do documento, publicado em português e inglês, no link: www.jornaldaciencia.org.br/links/cartaPrincipios.pdf. (Jornal da Ciência)
2 – ‘A Rio+20 tem obrigação de quebrar a inércia’
Nos 20 anos desde a Rio-92, o mundo mudou muito, mas avançou muito menos do que deveria na sustentabilidade ambiental e saiu da zona de segurança. “A angústia aumentou, mas ações não vieram”, diz Carlos Nobre.
Considerado um dos mais importantes especialistas em clima do País, Carlos Nobre, secretário de Políticas e Programas de Desenvolvimento do Ministério da Ciência e Tecnologia, assina o editorial da edição desta semana da americana “Science”, uma das mais prestigiadas publicações científicas do mundo. Trata-se da primeira vez que um brasileiro escreve o editorial da revista.
No texto, o cientista aborda as mudanças desde a Rio-92, os avanços e os desafios. Nobre afirma que a Rio+20 pode tirar o mundo da inércia em que se encontra no que diz respeito às questões ambientais e sociais.
Desde a Rio-92 o mundo tem clara noção de quais são as maiores ameaças ao planeta. No entanto, quase nada foi feito. Há uma inércia política?
Carlos Nobre: Existe claramente o sentimento de uma inércia política global 20 anos depois da Rio-92. Quando olhamos para a questão da sustentabilidade, por exemplo, vemos modestos avanços e alguns retrocessos. Na questão mais preocupante, a climática, há um contínuo aumento das emissões de gases-estufa. A única boa notícia nessa área é a redução do desmatamento, mas em termos de concentração de CO2, queima de combustíveis fósseis, erosão da biodiversidade só pioramos. Fizemos apenas promessas para o futuro. A questão da água é outra grande preocupação, sobretudo por conta da agricultura mundial, sua maior usuária. Precisamos aumentar muito a eficiência da agricultura para produzir alimentos para nove bilhões de pessoas [previsão para 2050]. É um enorme desafio.
Mudamos pouco no que mais precisávamos?
Nobre: O mundo mudou muito nos últimos 20 anos, mas avançamos muito menos no que diz respeito a perseguir objetivos de sustentabilidade ambiental. Saímos da zona de segurança.
Na questão social, que é outro foco da conferência, os avanços também foram modestos. Pelo menos 27% da população mundial vivem na miséria. Tampouco se pode fazer algo?
Nobre: No pilar social houve mais avanços. Ainda estamos distantes em termos de redução de pobreza, fome, desigualdade de gênero. Temos um grande crescimento do PIB, mas um crescimento equivalente da desigualdade. Ainda assim, outros indicadores apontam algumas melhoras, como a desnutrição.
O que seria um bom resultado para a Rio+20?
Nobre: A Rio+20 não é uma reunião anual de convenção [do clima ou de biodiversidade]. É uma reunião de tomada de decisão política, de grandes estadistas, que deve pensar o desenvolvimento do planeta como um todo. Se atingir esses objetivos, terá cumprido seu papel. Há uma expectativa muito grande de que ela sirva para quebrar a inércia em que nos encontramos. A ciência cada vez mais aponta os riscos futuros e presentes, o estado do planeta. A angústia aumentou, mas não aumentaram as ações para reduzir o risco. Acho que justamente por não ser uma reunião de convenção a Rio+20 tem o potencial, mais do que isso, a obrigação, de quebrar a inércia e causar grande e profunda reflexão. (O Globo)
3 – Saída passa pela interação entre ciência e política
Para o biólogo americano Thomas Lovejoy, é preciso estabelecer um limite para o consumo nos países, além de investir na eficiência.
Para o biólogo americano Thomas Lovejoy, professor da George Manson University e uma das maiores autoridades em biodiversidade do mundo, o tema não está sendo tratado na Rio+20 como deveria. Nesta entrevista, ele diz que as perdas de recursos naturais são enormes e o debate em torno das soluções não está sendo travado na mesma escala, em parte, por culpa dos cientistas, que falharam na tarefa de botar na pauta do dia a preservação da biodiversidade.
Qual a sua expectativa em relação às discussões sobre a preservação da biodiversidade na Rio+20?
Thomas Lovejoy: O tema não está sendo tratado na escala que deveria. Para se ter uma ideia, se pensarmos em termos de reestruturação de ecossistemas em escala global temos de considerar pelo menos três milhões de sistemas vivos a serem recuperados. Ou seja, temos um problemão que não está sendo levado em conta como deveria.
Por quê?
Lovejoy: Em parte porque os próprios cientistas falharam em provar que o tema teria de estar entre as prioridades dos tomadores de decisões. A ciência cumpre um papel importante com suas descobertas e previsões de cenários futuros, mas precisa ir além disso e passar a interagir com a política para criar soluções conjuntas para preservar as espécies e, consequentemente, garantir o bem-estar da Humanidade. Os cientistas, ou ficam restritos às suas áreas de conhecimento e não se comunicam entre si, ou se comunicam pouco diante da necessidade de soluções urgente das questões ambientais. Na Rio 92, o que parecia relevante para cientistas eram dados de quantidade de espécies, locais de ocorrência etc.
Hoje, qual a discussão que se impõe ao tratar do tema?
Lovejoy: Os dados continuam sendo fundamentais. Não podemos trabalhar em soluções sem fazer os mapeamentos. Mas há um assunto que entrou na pauta recentemente, do qual pouco se fala, que é serviços ecossistêmicos. São os serviços que a Natureza oferece para o planeta, como, por exemplo, garantir matéria-prima para fabricação de um remédio. Precisamos quantificar esses serviços se quisermos ter a noção dos benefícios sociais da Natureza.
Este é o desafio para os pesquisadores daqui por diante?
Lovejoy: Este é um dos desafios. Já avançamos muito, se tomarmos por base 1992. Hoje há mais áreas protegidas no planeta, temos o “Protocolo de Nagoya” assinado por várias nações em 2010, no Japão, que prevê, também, a redução de perdas de biodiversidade. Mas é preciso ir além disso. Os oceanos, por exemplo, ainda estão pouco protegidos. Além disso, teremos de saber lidar com a Natureza de modo a alimentar os 7 bilhões de habitantes do planeta sem destruir os ecossistemas. Esses são desafios também.
É possível fazer isso em um país como o Brasil, cuja economia está fortemente atrelada à monocultura do agronegócio, que é devastadora?
Lovejoy: Sim, é possível. A produção agrícola em escala é importante, mesmo a baseada em monocultura. Mas deve ser parte de um mosaico de cultivos diferentes e não a base do sistema agrícola do País.
A proposta de uma economia verde defendida pelo Rascunho Zero, o documento oficial da Rio+20, poderá contribuir para preservar espécies?
Lovejoy: Sim, pelo fato de propor um valor para a Natureza. Dessa forma, inclui os recursos naturais nas decisões econômicas. Isso é fundamental, pois poderemos provar economicamente, por exemplo, que manter um manguezal em pé ajudará a garantir o trabalho de pescadores de certo local porque preservará o ecossistema marinho. No Brasil, as classes C e D, que até bem pouco tempo não consumiam, agora têm acesso a bens e mercadorias.
Como garantir esse consumo sem devastar o meio ambiente?
Lovejoy: Algum impacto sempre terá quando populações que não consumiam ascendem à categoria de consumidores. Mas acho que é preciso estabelecer um limite para o consumo nos países. Além disso, é importante investir na eficiência. Essa é a palavra-chave quando se trata de preservação da biodiversidade. Eficiência energética, eficiência de materiais para produzir, aposta na reciclagem, enfim, otimizar os recursos para produzir mais com menos recursos naturais.
Como pioneiro em estudos na Amazônia, qual é a sua visão, hoje, sobre esse bioma?
Lovejoy: Fico satisfeito com a redução dos índices de desmatamento. Mas não posso deixar de observar que, ao mesmo tempo que reduzem, há investimentos para construir hidrelétricas e rodovias que acabam devastando a região. Falta, ali, uma política integrada de geração de energia, infraestrutura, urbanização. Mas acho que ainda não há líderes regionais capazes de tocar esse projeto. Se houvesse, talvez essa proposta já teria sido levada adiante.
Recentemente, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) divulgou o Panorama Ambiental Global (GEO-5), que mostrou redução dos recifes de coral em 38% desde 1980, e que pelo menos 20% dos vertebrados estão ameaçados. O senhor viu esse relatório?
Lovejoy: Não vi. Mas faço um comentário: os cientistas podem fazer descobertas, informar a sociedade o que descobriram, mas devem usar seus conhecimentos e métodos científicos para também agir, interferindo nas políticas e, assim, conter as perdas da biodiversidade. É essa tarefa que se impõe no momento para a comunidade científica.
Como sensibilizar a sociedade para lutar pela preservação da biodiversidade?
Lovejoy: Criar legislação para fazendeiros que os obrigue a conservar as terras que ocupam e criar mecanismos de incentivos fiscais são bom começo.
O senhor acompanhou o debate sobre Código Florestal?
Lovejoy: Acompanhei em alguns momentos e sei que o debate é bem complexo. Posso dizer que, com os vetos da presidente Dilma Rousseff, a legislação ficou um pouco melhor, especialmente sobre a proteção das matas ciliares. (O Globo)