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Informativo 511 – Prisão; Aquecimento global e Rio+20 caminha para o fracasso?

1 – Polícia Federal prende paleontólogos que pesquisavam presença de fósseis do período jurássico no Cariri

2 – Aquecimento global afetará principais capitais do País

3 – A Rio+20 caminha para o fracasso?

 

1 – Polícia Federal prende paleontólogos que pesquisavam presença de fósseis do período jurássico no Cariri

 

Professores se cotizaram para pagar a fiança de R$ 24 mil para libertar os dois pesquisadores, já que a entrega da autorização para a pesquisa feita após o flagrante não foi aceita pela Polícia Federal, que alegou só aceitar com ordem judicial.

O chamado custo Brasil que incide em algumas atividades econômicas de modo a reduzir a competitividade do País, afeta também o avanço da ciência. A burocracia, o poder de polícia e o aparato legal não dialogam com as instituições que se esforçam para fazer avançar o conhecimento científico, e, por isso, cobram um preço alto, o que revela o absurdo da situação.

 

Um exemplo deste custo foi dado na tarde da última quarta-feira (2) quando a Polícia Federal prendeu no aeroporto de Juazeiro do Norte, Ceará, dois paleontólogos que vieram trabalhar numa pesquisa coordenada pela Universidade Regional do Cariri (Urca), apoiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para identificar a presença de fósseis do período jurássico na região. A bacia do Araripe, que compreende s região do sul do Ceará, e parte de Pernambuco e Piauí, sedia a maior jazida de fósseis do período cretáceo no mundo.

 

Os paleontólogos Alexander Kellner, pesquisador do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FRJ), e Romain Amiot, geoquímico da Universidade de Lyon1, da França, e professor associado do Instituto de Paleontologia de Vertebrados e Paleoantropologia de Pequim, China, somente saíram da delegacia da Polícia Federal em Juazeiro do Norte no dia seguinte. Os professores da Urca se cotizaram para pagar a fiança de R$ 24 mil para libertar os dois pesquisadores, já que a entrega da autorização para a pesquisa feita após o flagrante não foi aceita pela Polícia Federal, que alegou só aceitar com ordem judicial.

 

O paleontólogo coordenador da pesquisa, Álamo Feitosa, da Urca, disse à TV Verdes Mares que as amostras coletadas, pó de rocha e pequenos fósseis, fragmentos, iriam ser estudados para determinar o grau de salinidade do paleolago e a sua conexão com o mar, além de fazer inferências sobre a temperatura ancestral e entender aspectos das mudanças climáticas.

 

“Como vamos mais convidar pesquisadores de ponta para vir colaborar conosco nas pesquisas paleontológicas?”, questionou Álamo Feitosa. Há três anos desde que a Urca iniciou esta pesquisa começaram as tratativas para trazer ao Cariri o pesquisador Romain Amiot, do Centre National de la Recherche Scientifique da França.

 

O coordenador da pesquisa fez um “apelo ao bom senso, para separar o que é um cientista e o que é um traficante”. O delegado Francisco Assis Castro Bonfim, responsável pela delegacia da Polícia Federal em Juazeiro do Norte enquadrou os pesquisadores na lei ambiental, por porte de material mineral sem documentação legal que autoriza a condução, mesmo que com finalidade de estudos. (Flamínio Araripe para o Jornal da Ciência)

 

2 – Aquecimento global afetará principais capitais do País

 

Além de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Manaus, cidades do Nordeste estão entre as que mais sofrerão com a mudança de temperatura, afirma estudo do Inpe e da Unesp.

Um estudo que combinou modelagem climática com indicadores sociais das cidades brasileiras apontou onde estão as populações mais vulneráveis às mudanças climáticas no País. Em um cenário de aquecimento global, moradores de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Manaus e de vários municípios nordestinos serão os que estarão mais sujeitos a riscos.

 

O trabalho, realizado por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp), considerou que as projeções que mostram para as próximas décadas aumento de temperatura e mudanças no regime de chuvas não contam sozinhas quais podem ser os impactos reais aos homens. Mas, ao cruzar esses dados com a densidade populacional e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), os cientistas deduziram que seria possível oferecer uma noção melhor do problema.

 

O ganho de compreensão fica claro ao se observar um mapa feito a partir do chamado Índice Regional de Mudança Climática (RCCI, na sigla em inglês). Sintetiza, segundo o físico Roger Torres, do Inpe, mais de uma centena de projeções previstas por modelos climáticos apresentados no quarto relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), de 2007.

 

O mapa mostra que a área mais suscetível – onde as mudanças climáticas no Brasil comparativamente serão mais severas – envolve a região central e Norte do País. Isso significa que esses locais devem experimentar um aumento maior de temperatura, assim como mudança nas chuvas, que pode ser tanto nos totais anuais, como nas variações sazonais – secas mais compridas, por exemplo.

 

No entanto, quando são levados em conta os indicadores sociais, percebe-se que os mais vulneráveis aos problemas futuros estão no Nordeste e em algumas das principais capitais brasileiras. Nesses locais, o impacto na vida das pessoas será maior.

 

Dificuldades – O ecólogo David Lapola, da Unesp em Rio Claro, responsável por cruzar os dados, explica: “O Nordeste tem IDH (índice que combina educação, saúde e renda) baixíssimo, talvez alguns dos menores do País, e a densidade populacional é relativamente alta. São indicativos de que essas pessoas terão maior dificuldade para responder a um cenário de mudança climática, mesmo se ela não for a mais severa do País”.

 

Já em capitais como São Paulo e Rio de Janeiro, o problema é a grande densidade populacional e o agravamento, com as mudanças climáticas, de situações já comuns hoje quando acontecem eventos extremos, como enchentes e deslizamentos de terra, e que os governos ainda não conseguem resolver.

 

O contrário vale para o centro e o Norte do País. Apesar de lá o indicador climático apontar uma situação de mudanças climáticas mais severas, na comparação com os demais estados, os vazios demográficos tendem a possibilitar que a população seja menos vulnerável.

 

Os pesquisadores explicam que a ideia geral foi apontar quais serão as áreas mais problemáticas a fim de aproximar as informações climáticas dos tomadores de decisão, de modo que eles tenham melhores condições de desenvolver políticas públicas para essas cidades. “Com centenas de projeções climáticas, era mais difícil decidir, mas um trabalho como esse melhora a relações entre os cientistas e os políticos”, afirma Lapola.

 

“Os fenômenos recentes, como as cheias em São Paulo e os deslizamentos no estado do Rio por dois anos seguidos, mostram que não estamos preparados”, diz. “O estudo reforça que esses cenários só tendem a piorar. E que é preciso trabalhar já.”

 

Locais indefinidos – O trabalho, publicado ontem (6) na revista Climatic Change, não detalha, porém, exatamente o que pode ocorrer em cada lugar. Estudos anteriores, feitos com auxílio do Inpe, já mostraram onde as Regiões Metropolitanas de São Paulo e do Rio são mais vulneráveis, mas para as outras capitais ainda faltam estudos.

 

E as altas densidades demográficas mascaram as diferenças sociais, diz o ecólogo. “Trabalhamos com o IDH municipal. O de São Paulo é relativamente alto até, mas se considerarmos as diferenças dos bairros, temos desde locais com índice compatível a países nórdicos e outros tão baixos quanto no Nordeste. No futuro, queremos olhar essa heterogeneidade para mostrar um quadro mais preciso.” (O Estado de São Paulo)

 

3 – A Rio+20 caminha para o fracasso?

 

A edição de sábado (5) da Folha de São Paulo traz duas opiniões opostas sobre a organização da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que acontece em junho, no Rio de Janeiro.

A Rio+20 caminha para o fracasso? Sim

Artigo de João Paulo Capobianco, biólogo, ambientalista e diretor do Instituto Democracia e Sustentabilidade. Foi secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente (2007-2008).

 

Faltando pouco mais de um mês para a Rio+20, os esperançosos de que os seus objetivos finalmente fossem definidos com clareza se voltaram para a rodada final de negociações “informais” que terminou ontem (4), em Nova York. A julgar pelos resultados parciais anunciados, no entanto, esperar parece não ter valido a pena.

 

Persistem as dúvidas e divergências sobre praticamente todos os itens da pauta e até sobre o que efetivamente será discutido no evento. Para piorar o cenário, dificilmente as divergências poderão ser sanadas no pouco tempo que resta, muito menos na própria conferência – os chefes de Estado que vierem certamente não resolverão em três dias aquilo que os diplomatas negociadores não foram capazes de resolver nas fases preparatórias. Ainda mais porque a negociação ficará espremida em agendas lotadas de compromissos políticos que os líderes consideram mais relevantes, como as eleições em seus países.

 

A Rio+20 está fora de foco, em um momento em que não restam dúvidas sobre o agravamento dos problemas ambientais. Na realidade, quando se analisa os tais três pilares do desenvolvimento sustentável, o mais frágil é justamente o do meio ambiente.

 

O progresso no combate a pobreza, por exemplo, que tirou milhões de pessoas dessa situação em vários países, notadamente no Brasil, não foi acompanhado da melhoria dos indicadores ambientais. Ao contrário, as convenções sobre mudanças climática, biodiversidade e combate à desertificação que resultaram da Rio-92 não lograram avanços significativos. Suas agendas estão praticamente bloqueadas.

 

Assim, a questão da governança ambiental mundial se tornou fundamental para a implementação dos acordos internacionais já existentes e para a preparação dos que terão de ser definidos no futuro próximo.

 

Persiste, no entanto, um impasse que trava qualquer evolução nessa discussão. A proposta de se transformar o frágil e pobre Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) em um órgão com poder de implementação semelhante às agências globais de saúde (OMS), comércio (OMC), alimentação e agricultura (FAO), trabalho (OIT) e educação e cultura (Unesco), apoiada pela União Europeia e africanos, totalizando 140 países, não avança por oposição dos EUA.

 

Nesse tema estratégico, o país anfitrião, que deveria ser um facilitador de consensos, parece ter tido uma recaída com relação à sua posição assumida em 2007. Em setembro daquele ano, o governo brasileiro organizou no Rio uma reunião internacional para tratar exatamente desse assunto. O Brasil propôs aos ministros de Meio Ambiente e chanceleres de 22 países lá presentes a criação de uma nova organização com responsabilidades nas áreas normativa, de cooperação e de financiamento que coordenasse o Pnuma, o Fundo Global para o Meio Ambiente, outros mecanismos financeiros e os secretariados das convenções internacionais na área do meio ambiente.

 

A ideia defendida na reunião era que essa nova organização fosse capaz de integrar e potencializar as ações dos órgãos das Nações Unidas já existentes, de forma a buscar a efetividade da implementação sem a criação de uma nova megaestrutura burocrática.

 

Recuperar essa proposta e liderar a busca de um consenso nessa questão pode ser uma forma de evitar que a Rio+20 seja conhecida como a mais antiecológica reunião ambiental da história. Afinal, corremos o risco de emitir milhões de toneladas de gases de efeito estufa para muito pouco resultado.

 

A Rio+20 caminha para o fracasso? Não

Artigo de Lidia Brito, diretora da Divisão de Políticas de Ciências da Unesco e ex-ministra de Educação Superior, Ciência e Tecnologia de Moçambique.

 

A pouco mais de um mês da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), o mundo todo está em busca de respostas para esse desafio crucial para a humanidade. Aproveitar o espaço de diálogo global é, sem dúvida, uma oportunidade única, que não pode ser perdida.

 

Por que acreditar no sucesso da Rio+20 é tão importante neste momento? Primeiro, porque existe uma conjugação de forças de todas as partes do mundo em torno de objetivos comuns para se encontrar caminhos mais sustentáveis. Qualquer mudança só ocorrerá se começar pela mente positiva das pessoas e pelo diálogo entre os vários intervenientes no processo de desenvolvimento.

 

Segundo, e muito importante, porque nós temos de agir rápido. Hoje, o recurso mais escasso no planeta é o tempo. Só o fato de nós perguntarmos, 20 anos depois da Rio-92, aonde chegamos e para onde queremos ir agora já é muito importante. Por isso, não devemos encarar esta conferência como um evento isolado. Estamos falando de um processo que teve início duas décadas atrás e que não se encerrará em 2012.

 

Assim, esperar que um dos resultados palpáveis do encontro seja clarificar os processos de diálogo, de tomada de decisão e de ação necessários para que a humanidade possa ter uma resposta conjunta aos seus desafios é aceitar que a Rio+20 terá sido um sucesso.

 

O “processo Rio+20” vem surtindo efeitos mesmo antes do evento propriamente dito. Em março, em Londres, durante a Conferência Planet Under Pressure (“Planeta sob Pressão”), cientistas e representantes de governos, do setor privado e da sociedade civil chamaram a atenção sobre pontos importantes que devem influenciar os negociadores que estarão no Rio.

 

Entre eles, o estado do planeta e os possíveis riscos associados a mudanças a nível planetário, a necessidade de se olhar para o desenvolvimento sustentável integrando as questões econômicas com as sociais e ambientais, sugerindo assim que, por exemplo, se valorize o capital natural, quando se mede o progresso de uma nação, além de outros indicadores como o PIB.

 

Outro exemplo do otimismo com relação à Rio+20 é o espaço que se cria para organizar outros eventos, como o Fórum de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável, que será realizado em junho no Rio. Esse fórum reunirá vários parceiros da Unesco, como o Conselho Internacional para a Ciência (ICSU), a Federação Mundial de Organizações de Engenharia, o Conselho Internacional de Ciências Sociais (ICSS), o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e a Academia Brasileira de Ciências.

 

Esse é mais um passo para o diálogo construtivo entre a comunidade científica, os governos, a sociedade civil e o setor privado, todos eles atores cruciais nas mudanças que se devem operar. Eu acredito que a participação e a integração de todos em torno da Rio+20 – em especial dos jovens, que estão conectados e fazem parte de uma geração multicultural, sem barreiras linguísticas, culturais ou tecnológicas – é fundamental.

 

A Rio+20 será um ponto de convergência desses jovens em torno do objetivo comum e global da sustentabilidade, reforçando os valores da generosidade, do respeito pela diversidade e das responsabilidades partilhadas quando se enfrentam desafios tão complexos. Esse movimento universal da juventude nos ajuda a reforçar ainda mais a visão positiva sobre o futuro.

* A equipe do Jornal da Ciência esclarece que o conteúdo e opiniões expressas nos artigos assinados são de responsabilidade do autor e não refletem a opinião do jornal