1 – Degelo de solo ártico eleva risco climático
2 – O Brasil e as mudanças climáticas
1 – Degelo de solo ártico eleva risco climático
Terra permanentemente congelada abriga até cinco vezes mais gases do efeito-estufa do que se imaginava antes.
A quantidade de gases-estufa liberados até 2100 pelo derretimento do permafrost (o solo congelado do Ártico) poderá ser até cinco vezes maior do que se imaginava. Para piorar, esses gases serão ricos em metano, que tem um alto poder de “multiplicar” o aquecimento global. A afirmação é de mais de 40 cientistas da Rede de Carbono do Permafrost, liderados por Edward Schuur e Benjamin Abbott, em artigo na revista científica “Nature”.
De acordo com a equipe de cientistas, a falta de estudos fez com que, até agora, a quantidade certa de carbono contido no permafrost fosse subestimada, assim como seus potenciais efeitos sobre o clima global.
Bomba-relógio – Durante centenas de milhares de anos, sucessivos degelos e congelamentos prenderam uma enorme quantidade de restos de animais e plantas sob uma camada espessa de gelo no Ártico. Agora, com o aquecimento global, esse material irá começar a se decompor e liberar gases intensificadores do efeito estufa na atmosfera.
O grupo estima que, sob essa camada – que cobre quase 20% de todas as terras do hemisfério Norte – haja 1,7 bilhão de toneladas de carbono “preso”. O que, definitivamente, não é pouco. “É quase quatro vezes mais do que todo o carbono emitido pelas atividades humanas em tempos modernos e o dobro do que está presente na atmosfera agora”, dizem os autores do trabalho.
Os cientistas usam avançados modelos climáticos no computador. Eles trabalham com dois cenários, um em que as temperaturas globais sobem muito e outro em que o aumento é moderado. Em ambos os casos, a cobertura do permafrost diminui consideravelmente.
Embora a maior parte do carbono deva ser liberada na forma de CO2 – o mesmo das emissões dos carros, por exemplo – haverá também muito metano, que tem um potencial de aquecimento 25 vezes maior. Por isso, embora os cientistas digam que a principal fonte de emissões continuará sendo a queima de combustíveis fósseis, o derretimento do permafrost será “um importante amplificador das mudanças climáticas”.
“As maioria das pesquisas fala muito das emissões de desmatamento e combustíveis fósseis. Esse artigo mostra, cada vez mais, que o derretimento do permafrost é um fator importante para a mudança climática”, afirma o climatologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) José Marengo.
Segundo ele, no entanto, é preciso haver mais estudos sobre a quantidade de gases-estufa liberados. “Sem isso, pode-se ter o melhor modelo de computador que não vai adiantar. O resultado final vai ser uma generalização”. (Folha de São Paulo)
2 – O Brasil e as mudanças climáticas
Artigo de Cláudio J.D.Sales publicado no jornal O Estado de São Paulo de hoje (1º).
Qual papel o Brasil deve assumir: líder ou seguidor? Nesta e na próxima semanas, líderes do mundo estarão reunidos na Conferência das Partes (COP-17), na África do Sul, para mais uma rodada de discussões sobre mudanças climáticas. De acordo com os cientistas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o aumento da concentração de CO2 na atmosfera poderá resultar em maiores e mais frequentes fenômenos climáticos extremos. Estudos científicos, ainda controversos, apontam alterações no clima da Terra em razão do aumento da concentração na atmosfera de gases de efeito estufa (GEEs) nos últimos 150 anos, resultantes principalmente da queima de combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo e gás natural) e da derrubada de florestas tropicais.
Neste contexto, muitos defendem que a redução das emissões de GEEs seria uma necessidade, em razão do alto preço que teríamos de pagar caso fossem confirmadas as hipóteses que correlacionam emissões e mudanças climáticas. O Protocolo de Kyoto é uma das iniciativas para promover essa redução. O primeiro período, que termina em 2012, define metas para que os países industrializados reduzam, em média, 5,2% das suas emissões contabilizadas em 1990. Mas, desde 2009, na COP-15 realizada em Copenhague, discute-se a prorrogação do protocolo e novas metas para um segundo período.
O mundo passou por mudanças recentemente. Talvez a principal, registrada em 2005, tenha sido a constatação de que países em desenvolvimento emitiam mais GEEs que os países industrializados. Em 1990 ocorria o inverso. Tal inversão passou a colocar pressão sobre os países em desenvolvimento, que precisariam participar do esforço de redução das emissões. Isso incluiria o Brasil, que é o terceiro maior emissor de GEEs, com 5,1% das emissões globais contabilizadas em 2005.
Essa contribuição, porém, precisa ser cuidadosamente qualificada, porque temos um perfil de emissões muito diferente do perfil dos países com elevado desenvolvimento econômico e industrial. Aqui predominam emissões decorrentes da mudança do uso da terra (basicamente desmatamento/queimadas e agricultura), setores que correspondem a 80% das emissões nacionais. Nos países industrializados, a geração de energia elétrica é responsável por 29% das emissões de GEES. No Brasil, esse número cai para 1,2% e a previsão é de que não ultrapasse 3,2% em 2030.
Com perfil tão diferenciado, precisamos assumir a liderança do debate global e fugir da armadilha da adoção do modelo de redução de emissões que outros países precisam implementar.
O Brasil, por exemplo, necessita de novas usinas termoelétricas para aumentar a robustez operacional de nossa matriz elétrica. Afinal, nossa matriz, que já tem a virtude de ser predominantemente renovável, está sujeita à imprevisibilidade de chuvas e ventos. Além de ser saudável para a operação do sistema, a complementaridade entre fontes renováveis e termoelétricas contribui para diminuir a conta de luz paga pelo consumidor. A discussão sobre GEEs deve ocorrer setor a setor. E, quando se dispõe de recursos limitados para a redução das emissões de GEEs, o esforço deve ser concentrado nos setores em que, com o menor investimento, podem ser obtidos os melhores resultados.
Portanto, as políticas públicas devem privilegiar o combate ao desmatamento ilegal, a melhoria tecnológica dos automóveis e combustíveis e a ampliação da participação de biocombustíveis no setor de transportes. Essas três políticas já reduziriam as emissões de gases de efeito estufa a níveis inferiores a 1990. Os detalhes que suportam essa conclusão estão num estudo inédito que o Instituto Acende Brasil lançará em breve. O Brasil, com base na sua posição de liderança global na geração de energia elétrica predominantemente renovável, precisa impor – aos grupos de pressão internacionais e locais – políticas que ataquem os reais responsáveis pelas mudanças climáticas.
Cláudio J.D.Sales é presidente do Instituto Acende Brasil: www.acendebrasil.com.br.