Fechar menu lateral

Informativo 443 – Destruição e Estado

1 – Acadêmico alerta para descontrole da destruição da Amazônia

2 – Riscos ambientais para o Estado

 

1 – Acadêmico alerta para descontrole da destruição da Amazônia

 

Se a anistia aos desmatadores não for retirada do texto que altera o Código Florestal Brasileiro, a destruição da Amazônia pode perder o controle. A opinião é do ecólogo e Acadêmico Philip Fearnside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), entidade de pesquisa ligada ao Ministério de Ciência e Tecnologia do Brasil. A Câmara dos Deputados brasileira aprovou na terça, dia 24.05, um proposta de lei que altera as regras de proteção florestal em todo país, tornando-a mais permissiva e também perdoando crimes de desmatamento realizados até 2008.

Segundo Fearnside, todas as mudanças propostas pelo relator da proposta de lei, o deputado do Partido Comunista do Brasil, Aldo Rebelo, abrem espaço para aumentar o desmatamento na Amazônia, mas de alguma forma impõem limites. “A anistia não, porque abre a porta para o desmatamento até a última árvore”, lamenta. “Vão continuar o corte na esperança de ser anistiado e isto não vai ter fim. Vão esperar outra reforma no Código ou outra anistia”, completa.

Fearnside faz estudos sobre impactos de grandes projetos na Amazônia desde a década de 70 e já foi apontado como o segundo cientista mais citado no mundo quando o assunto é a região. Para ele, as mudanças afetam a imagem do Brasil no Exterior porque compromete metas voluntárias assumidas pelo país durante negociações internacionais. O Brasil pretende reduzir as emissões de carbono em até 38,9% até 2020. Mas o compromisso está seriamente ameaçado: o avanço do desmatamento em 27% na Amazônia este ano é apontado como decorrência da expectativa de que aprovação do Código Florestal vá perdoar os infratores.

O cientista lembra que além da anistia, a proposta aprovada no Congresso altera a forma como são medidas as matas que protegem os rios da Amazônia. Ele cita o estudo da Academia Brasileira de Ciências que aponta que em função da simples mudança na base de medição, a proteção das bordas de rios na Amazônia pode ser reduzida em 60%. Fearnside destaca a importância da mata ciliar, importantes corredores de migração de animais e plantas e que viabilizam a biodiversidade em mosaicos fragmentados. E, claro, servem para evitar inundações.

Problemas além da anistia

O Código aprovado isenta proprietários de até quatro módulos rurais (uma medida que varia muito no país) de manter a Reserva Legal. A Reserva Legal é um dispositivo no Código Florestal Brasileiro que obriga aos proprietários a manter uma parcela de sua propriedade com cobertura vegetal nativa. Na Amazônia, essa reserva deve ser de 80% da propriedade. O argumento do deputado Aldo Rebelo é que tal dispositivo da lei impede o sucesso de pequenos produtores na Amazônia.

A Academia Brasileira de Ciências defende uma legislação diferenciada para a agricultura familiar, mas utilizar o módulo rural como forma de distinção é arriscado. Em alguns lugares da Amazônia o módulo rural equivale a 100 hectares. Além disso, há o temor de que grandes propriedades sejam fracionadas para se encaixarem nesta brecha. O que não é difícil. Em Apui, sul do Amazonas, por exemplo, um estudo do Inpa apontou que uma mesma família é dona de 38 lotes, cada um com 100 hectares.

A bióloga Rita Mesquita, também do Inpa, lamenta que os deputados federais não tenham se baseado em argumentos técnicos e científicos durante as discussões do Código. “Você sabe que 61 milhões de hectares desmatados e degradados no país podem se tornar produtivas, inclusive para o agronegócio”, pergunta a pesquisadora. “Agora nós vamos ceder nossa biodiversidade, nossos recursos naturais, para multinacionais se implantarem em nosso país em troca de terra barata e trabalho escravo.”

Ela considera que houve uma inversão nas discussões, sobre o que seria realmente positivo para o Brasil e o que atenderia interesses estrangeiros. “A sociedade brasileira está sendo enganada quando dizem que a preservação é internacional, como se o agronegócio não estivesse nas mãos de empresas internacionais. Eu diria que o agronegócio é internacional e a conservação do Brasil”, completa.

Academia Brasileira de Ciências

Em nota divulgada nesta quinta-feira, 26 de maio, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) propuseram ao governo federal um prazo de dois anos para construção de um novo Código Florestal. As duas instituições classificam de precipitada a decisão tomada pelos deputados federais, por não terem levado em conta aspectos científicos e tecnológicos na aprovação da proposta de lei.

O comunicado, que considera a necessidade de uma revisão da lei de 1965, afirma que o Parlamento nunca convidou formalmente a ABC ou a SBPC para as discussões sobre o substitutivo aprovado. Afirma também que duas cartas haviam sido enviadas a congressistas e presidenciável alertando sobre a necessidade de um prazo maior para discussões aprofundadas sobre o Código Florestal.

As duas instituições ressaltam ainda estarem à disposição do Senado para a discussão do novo código. A nota deixa claro também que às críticas ao Código não tem vinculação com movimentos ambientalistas ou ruralistas, mas são feitas em nome da sustentabilidade do país. ABC e SBPC criaram em julho do ano passado um Grupo de Trabalho para discutir mudanças na lei ambiental. As propostas foram transformadas em um livro, lançado em março deste ano.

A carta reconhece a contribuição do agronegócio para a produção de alimentos e na balança comercial brasileira, mas ressalta que a ampliação do agronegócio deve ocorrer sem prejuízos a preservação e conservação dos recursos ambientais do país.
(Vandré Fonseca e Karina Miotto para o blog Eco Amazônia). Fonte: Portal da Academia Brasileira de Ciências de 04.06.2011

 

2 – Riscos ambientais para o Estado

 

Ambientalistas temem que projeto do Código Florestal não passe por adaptações no Senado

A operação matemática de somar costuma ser relacionada a questões positivas. E ganhos. Pelos cálculos de pesquisadores e ambientalistas, a chamada adição terá efeito contrário sobre o meio ambiente se o projeto do novo Código Florestal, em poder do Senado, for aprovado sem mudanças. A conta exige pouco esforço. O relatório avalizado na Câmara dos Deputados, em maio, admite que um proprietário rural ao calcular a Reserva Legal de seu imóvel pode incluir o que for Áreas de Preservação Permanente (APPs). Desse modo, acreditam eles, a tendência seria a derrubada de grande parte do que sobrou de Mata Atlântica e do que resiste da Caatinga em Pernambuco.

A perda é evidente, atesta o biólogo e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Ricardo Braga. Ele chegou à conclusão baseando-se no projeto do novo Código Florestal e em estudos científicos. Em Pernambuco, as reservas legais devem representar, tanto no atual como no Código Florestal em discussão, 20% dos imóveis. Com um diferencial, explica, na legislação em vigor há uma separação entre as reservas e as APPs.

E os topos de morros podem ser ocupados apenas se a atividade, a exemplo do Lixão de Vitória de Santo Antão, for considerada de utilidade pública. Como as APPs correspondem a 15%, em média, das propriedades pernambucanas, o biólogo vê no projeto avalizado pela Câmara dos Deputados uma porta para o desmatamento. Para atender a legislação, os proprietários precisariam manter apenas cerca de 5% de mata que não fossem APPs.

Se o projeto do novo Código for aprovado como saiu da Câmara, pesquisadores e gestores de órgãos públicos acreditam que a lei desestimularia, por exemplo, usinas de cana-de-açúcar pernambucanas que têm investido na recuperação de florestas e matas ciliares. E estimularia o desmatamento. O que vemos é um retrocesso, avalia o presidente da Associação Pernambucana de Engenheiros Florestais, Márcio Luna. A seu ver, as conseqüências serão visíveis: derrubada maior da Caatinga e aumento dos canaviais, por exemplo.

Estudo do SOS Mata Atlântica e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) indica que Pernambuco teve 253 hectares desse bioma desmatados entre 2008 e 2010, cerca de 36 Parques da Jaqueira. Para o presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool (Sindaçúcar), Renato Cunha, o debate sobre o tamanho das reservas legais e das APPs deve ser feito a partir da história. A realidade agrícola do estado antecede ao Código. É secular, pontua. Tal aspecto, entende, mostra que a maioria dos produtores de cana não infringiu a legislação.

No mundo todo não existe a figura da reserva legal, afirmou. Renato Cunha avalia como positiva incluir as APPs no cálculo da reserva legal, mas admite que a discussão ainda não está fechada. Novos capítulos, acirrados como os vistos na Câmara, podem se repetir. É esperar.

Saiba mais

Conceitos

Reserva Legal
Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, com a função de assegurar o uso econômico de maneira sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar à conservação e à reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, o abrigo e a proteção da fauna silvestre e da flora nativa.

Área de Preservação Permanente
Área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.

Reserva legal exigida (percentual de área verde a ser preservado por imóvel rural)

Pernambuco

Caatinga 20%

Mata Atlântica 20%

Amazônia Legal

Florestas 80%

Cerrado 35%

Campos naturais 20%
Cultivo em áreas de preservação

Há um grande nó a ser desatado. Ou, quem sabe, apertado pelo Senado dentro do projeto de Código Florestal: a emenda 164, que repassa aos estados o poder de decidir sobre que culturas agrícolas devem ser cultivadas em áreas de preservação permanente (APPs). A bancada pernambucana posicionou-se contra a emenda, seguindo orientação do governador Eduardo Campos (PSB).

A emenda 164 é criticada por ambientalistas e parlamentares. Os senadores Humberto Costa (PT) e Armando Monteiro (PTB) estão entre os críticos. A União deve continuar a ter o poder de regulação sobre o desmatamento e o controle sobre a emissão das licenças para obras em áreas de preservação, disse o petista, que segue posição da bancada do PT e Palácio do Planalto.

Para os defensores, a emenda fortalece quem produz riquezas. E tira da ilegalidade produtores de café, uva, maça e cana-de-açúcar. O presidente do Sindaçúcar, Renato Cunha, é favorável que a questão das APPs seja resolvida no Congresso Nacional. É o Congresso que deve legislar. Se ele remete o assunto ao Executivo pode gerar insegurança jurídica e resultar em autuações descabidas, acredita. A emenda foi aprovado por um placar de 273 a 182 votos.

Os críticos, como ecólogo e professor da UFPE, Ralf Schwamborn, enxergam na emenda um risco ao espírito federativo. Algo semelhante à antiga guerra fiscal. Nela, atraia investimentos os estados que mais concedessem isenção de impostos. Com a proposta do novo Código, a conta penderia para o meio ambiente. Fonte: Jailson da Paz, Diário de Pernambuco de 06.06.2011.