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Informativo 379 – A vez do tempo e Pterossauros

1 – A vez do tempo

2 – Pterossauros voavam bem, mas eram derrubados por vento forte

 

1 – A vez do tempo

Modelos para representar distribuição espacial de espécies são eficazes, mas precisam considerar a dimensão temporal, diz pesquisador em workshop do Biota-Fapesp
Graças às novas tecnologias e a investimentos satisfatórios, os estudos sobre biodiversidade têm explorado com eficiência a dimensão espacial dos biomas. Mas, para que o conhecimento avance, é preciso investir na dimensão temporal, com estudos de longa duração.
Essa foi a síntese da palestra de abertura do International Workshop on Long-Term Studies on Biodiversity apresentada pelo coordenador do evento, Luciano Verdade, professor do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP).
O encontro, promovido pelo Programa Biota-Fapesp, foi realizado nesta terça-feira (23/11), em São Paulo, com o objetivo de sensibilizar a comunidade científica a respeito dos chamados programas de estudos de longa duração sobre biodiversidade.
Tendência em vários países, esses estudos possibilitam entendimento – em escalas espacial e temporal mais amplas – dos processos biológicos e humanos que determinam o padrão de distribuição e a abundância de espécies.
De acordo com Verdade, que é membro da coordenação do Biota-Fapesp, os estudos de longo prazo em documentação e conservação da biodiversidade não são apenas uma tendência, mas uma necessidade incontornável.
“Quando levamos em conta a complexidade dos estudos que tratam da conservação e abundância das espécies, vemos que se trata de uma necessidade. Por isso, o workshop não tem como objetivo apenas apresentar o estado da arte de determinado tema ligado à biota. Temos foco em um objetivo prático: trazer para São Paulo a experiência de grupos de pesquisa que tenham trabalhado em estudos de longa duração”, disse.
O evento, segundo ele, é coerente com as diretrizes da segunda fase do programa da Fapesp, chamada de Biota+10 e iniciada em 2009. Em sua primeira década, o programa teve foco em levantamento da fauna e flora em território paulista. Nos dez anos seguintes, estabeleceu-se que, além desses objetivos, seriam acrescentadas novas abordagens interdisciplinares.
“Esperamos que o compartilhamento dessas experiências internacionais possa despertar o debate para que possamos, com o Biota e a Fapesp, implantar programas de estudo de longo prazo”, disse Verdade.
O desafio de realizar estudos de longa duração em São Paulo não representa apenas uma necessidade de aumentar o tempo cronológico das pesquisas, mas também de considerar uma nova forma de percepção do tempo. “Precisamos passar a perceber o tempo de forma diferente, não apenas em termos cronológicos, mas em forma de processos”, disse.
Verdade explicou que na Grécia pré-helênica o conceito de tempo era dividido em duas palavras diferentes, correspondentes a dois deuses: Cronos e Cairos. O primeiro correspondia ao tempo cronológico, massacrante e implacável. O segundo era o deus das estações e correspondia a um tempo “existencial”, ligado aos processos.
“Na cultura ocidental moderna temos uma só palavra para a ideia de tempo, mas na prática o tempo tem várias faces. Precisamos nos voltar para esse tempo dos processos”, disse.
Com a instrumentação disponível atualmente, a partir de investimentos com satélites e estruturas computacionais, entre outros, foi possível construir uma ideia avançada da percepção da heterogeneidade espacial dos biomas.
“Isso ganhou tanta projeção que muitas vezes subestimamos o papel da heterogeneidade temporal para a realidade que queremos monitorar e modificar. Os modelos são, em geral, baseados na presença e ausência de espécies, mas não em sua abundância. Em geral, a dimensão do tempo é achatada, de forma que os modelos consideram apenas os padrões momentâneos. Outra limitação do aparato de satélites e dos modelos é que eles só permitem observar os padrões modernos”, afirmou.
Dimensão temporal
Quando se observa uma matriz composta de plantações de eucaliptos e de alguns remanescentes de vegetação nativa, por exemplo, é fácil perceber que a presença de carnívoros é maior nos pontos onde a paisagem é mais heterogênea. Isto é, a heterogeneidade espacial influencia os padrões de presença e abundância das espécies.
“Mas as projeções mostram essas comunidades em um só momento, não sendo capazes de trazer uma compreensão dinâmica de seu padrão ao longo do tempo. Uma das premissas que geralmente usamos nos artigos científicos é que há uma correlação entre os índices de abundância e a abundância real dos animais. Mas é possível que haja variação, de forma que essas figuras representem algo mais influenciado pelo método de observação do que a realidade de fato”, afirmou.
Na discussão de resultados, muitas vezes, os artigos científicos partem da premissa de que os padrões detectados não variam com o tempo, segundo Verdade.
“A partir daí se recomenda aos gestores públicos que qualquer mudança nos padrões é um perigo para a biodiversidade. Mas, quando se insere a dimensão temporal, sabemos que é inevitável que haja mudanças nos padrões. Portanto, é arriscado recomendar a manutenção de padrões definidos sem a dimensão temporal”, explicou.
Outra premissa comum é que espécies raras sejam mais propensas à extinção. “Sabemos que essa premissa também não é sempre verdadeira. Pelo contrário, na natureza é comum ser raro. E é raro ser comum. Por isso, partir do pressuposto de que as espécies raras são bons indicadores de qualidade do habitat também é arriscado”, disse.
“Quando vamos a campo e partimos da imagem de satélite para algo mais próximo às espécies em si, em relação à paisagem, percebemos que há muitos fragmentos de florestas e matrizes de pastagens e de cana-de-açúcar. Esse é um ambiente típico no Estado de São Paulo. Cada uma dessas manchas que forma a paisagem tem uma variação ao longo de um ano que pode ser dramática para os padrões que vamos encontrar”, disse Verdade.
As paisagens cobertas por plantações de cana-de-açúcar – que totalizam 9 milhões de hectares no Brasil – têm variações anuais entre zero e 100 toneladas de biomassa por hectare, segundo Verdade. Essa biomassa proporciona o aparecimento de espécies como roedores, por exemplo, que atraem seus predadores para essas áreas.
“A presença de muitas das espécies pode variar se considerarmos os padrões ao longo do tempo. Algo parecido ocorre nas plantações de eucalipto, que variam entre zero e 300 metros cúbicos de madeira em ciclos de seis a sete anos. Algumas espécies conseguem usar esses recursos criando cadeias tróficas mais simples que a da cobertura original, mas que não podem ser ignoradas”, explicou.
Certas flutuações tendem a ser cíclicas em maior ou menor escala. Outras mostram um padrão de espécies que aumentam sua presença, colonizando a paisagem. Outras, ainda, tendem a desaparecer, por não se adaptar. Algumas podem desaparecer e depois voltar.
“Algumas espécies podem apresentar um padrão caótico de flutuação e outras podem apresentar variações populacionais determinadas por eventos singulares”, indicou.
Mais dados
A presença humana, que também varia ao longo do tempo, precisa ser considerada quando se vai a campo, segundo o professor do Cena. “Além disso, temos que considerar a evolução das espécies, uma vez que elas se adaptam às mudanças do ambiente”, disse.
“Esse processo de adaptação pode ser fisiológico, de aclimatação, mas pode ser proveniente também de uma mudança no patrimônio gênico de certas espécies. Para algumas delas, poucas décadas representam centenas de gerações”, completou.
Por conta de todas essas modificações constantes dos padrões ao longo do tempo, os estudos em biodiversidade precisam considerar uma escala espaço-temporal mais longa.
“Para estudar os processos ao longo do tempo, precisamos trabalhar em rede nessas paisagens, montando e mantendo um banco de dados aberto, que mostre nossos diversos biomas e as paisagens agrícolas principais do estado. Os dados gerados precisam ser compatíveis e comparáveis – o que não é trivial sob nenhum ponto de vista”, afirmou Verdade.
A vantagem desse tipo de estudo, segundo ele, é que a precisão conseguida pelos modelos de presença, abundância e distribuição das espécies é muito maior.
“Hoje, os lugares vazios nos mapas correspondem à ausência de evidências da presença de uma espécie. Queremos que esses vazios passem a ser, ao contrário, a evidência de ausência das espécies. Isto é, muitas das lacunas que temos atualmente nos mapas não significam que ali há pouca presença das espécies. Significa que há pouca presença de dados”, disse. (Fábio de Castro) (Agência Fapesp, 24/11)

 

2 – Pterossauros voavam bem, mas eram derrubados por vento forte

‘Voo lento’ permitia pouso suave, reduzindo risco de quebrar ossos frágeis. Vulnerabilidade a turbulência, mesmo em terra, assemelha dino a planador
Os pterossauros, os primeiros e maiores vertebrados com capacidade de voar conhecidos, se adaptaram muito bem às brisas tropicais, mas caíam em caso de tempestade forte, segundo um estudo britânico publicado na “Biological Letters” da Royal Society nesta quarta-feira (24).
Os biólogos especializados na evolução estudam há muito tempo as capacidades aerodinâmicas dessas criaturas gigantes, que viveram no mesmo período que os dinossauros, durante a era mesozoica (de 220 a 65 milhões de anos).
Alguns cientistas mencionaram até mesmo a hipótese de que os pterossauros, entre eles o mais conhecido, o pterodáctilo (“dedo voador” em grego antigo), simplesmente não podiam voar.
Com sua envergadura que podia alcançar os 12 metros e pesando cerca de 200 kg, decolar não devia ser coisa fácil para os pterossauros.
Colin Palmer, engenheiro e paleontólogo da Universidade de Bristol (Grã-Bretanha), demonstrou, no entanto, por meio de experimentos com vento artificial, que esses animais pré-históricos na realidade se adaptaram muito bem a certos tipos de voo.
Com base no estudo de fósseis, Palmer criou modelos de asas de pterossauro com resina e fibra de vidro de carbono. Depois, inspirando-se em experiências realizadas com pás de hélices e cascos de veleiros, testou a resistência e a aerodinâmica dessas asas num túnel de vento, como qualquer engenheiro aeronáutico testando a asa de um avião.
Segundo ele, os pterossauros se adaptaram a um voo tranquilo, transportado pelas correntes cálidas ascendentes, principalmente nas ladeiras de colinas e nas zonas costeiras.
O voo lento e de geometria variável também lhes permitia pousar suavemente, reduzindo o risco de quebrar os ossos, relativamente frágeis, ao tocar o solo.
“Os ossos dos pterossauros era ocos e, portanto, muito vulneráveis em caso de choque. Por isso, uma baixa velocidade na aterrissagem era um elemento importante para evitar lesões”, diz Palmer.
Suas experiências também mostraram, no entanto, que o menor vento de tempestade certamente precipitava essas criaturas ao solo.
“Em contrapartida, os pterossauros sofriam de uma alta vulnerabilidade a ventos fortes e turbulências, tanto em voo como em terra, como os planadores modernos”, resume o pesquisador. (G1, 24/11)