1 – Países alcançam acordo da biodiversidade
2 – Pela preservação das palmeiras
3 – Secas podem tornar Amazônia savana
4 – Índico: criada maior reserva mundial
1 – Países alcançam acordo da biodiversidade
Após 18 anos negociando, eles assinam o Protocolo de Nagoya, considerado maior pacto ambiental desde Kyoto. Novo tratado garante a soberania dos países sobre os seus recursos genéticos; Brasil é visto como grande vitorioso
Representantes de quase 200 países chegaram a um acordo na última sexta-feira, em Nagoya (Japão), e assinaram um tratado sobre a biodiversidade.
As nações concordaram em reconhecer o direito dos países sobre a sua biodiversidade. Isso significa que países que desejarem explorar a diversidade natural (como plantas, animais ou micro-organismos) em territórios que não sejam seus terão de pedir autorização para as nações donas dos recursos.
Se estudo da fauna e da flora alheia resultar em novos produtos, como fármacos ou cosméticos, os lucros terão de ser repartidos entre quem os desenvolveu e o país de origem do recurso, conforme contrato prévio.
Se houver comunidades que utilizem os recursos genéticos tradicionalmente, como tribos indígenas, elas também terão direito de receber royalties pela exploração comercial da biodiversidade.
Os diplomatas chamam esses pontos de ABS, uma sigla em inglês para “acesso e repartição de benefícios”.
Vitória brasileira
As negociações para estabelecer esses pontos sobre o acesso aos recursos genéticos levaram quase 20 anos. Desde a Eco-92, no Rio de Janeiro, temas ligados à biopirataria são discutidos, e os países ricos relutavam em assinar um pacto que garantisse a soberania dos países sobre a sua biodiversidade.
Por isso, o acordo realizado agora, na COP-10 (10ª Conferência das Partes da Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica), em Nagoya, foi visto como uma grande vitória brasileira, país dono da maior biodiversidade do mundo e protagonista nas negociações no Japão.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, chefe da delegação brasileira, disse estar satisfeita. “É realmente uma vitória. Estou certa que temos um novo arranjo para a conservação biológica. Para nós é bom, finalmente avançamos, mas não é excelente.”
Ela diz isso porque algumas posições brasileiras, como o efeito retroativo para direitos sobre a biodiversidade (haveria royalties por substâncias já desenvolvidas e comercializadas, por exemplo), não estão no acordo.
A ministra defendeu, porém, que algum acordo é melhor do que nenhum acordo. “É necessário entender que precisamos de conciliação, senão não há resultados.”
Ela diz que o sucesso de Nagoya, com um consenso entre centenas de países, pode servir de exemplo para as negociações do clima, que seguem em Cancún, em dezembro. “Sou uma mulher pragmática e otimista.”
Não foi só Teixeira que saiu de Nagoya sorrindo. O clima entre os representantes de todos os países era de comemoração pelo acordo, que parecia distante conforme as negociações avançavam pela madrugada de sexta para sábado no Japão.
“Não é só um protocolo chato. Ele se refere a bilhões de dólares da indústria farmacêutica”, disse Tove Ryding, do Greenpeace.
“Se Kyoto entrou para história como o lugar onde o acordo do clima nasceu, em 1997, Nagoya terá destino similar”, diz Ahmed Djoghlaf, secretário-executivo da Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica (CBD), responsável pela conferência. Além do protocolo sobre a biodiversidade, várias metas de aumento na quantidade de terras e áreas marítimas preservadas foram estabelecidas.
A única ausência notável foi a dos Estados Unidos, que nunca participaram da CBD. (Ricardo Mioto) (Folha de SP, 30/10)
2 – Pela preservação das palmeiras
Durante 20 anos, engenheiro vem colecionando centenas de espécies dessa planta. Agora ele quer transformar essa longa paixão num jardim botânico
Vinte anos atrás, o engenheiro Gileno Machado plantou coqueiros, de 16 variedades, no jardim de sua casa de praia em Barra de Sirinhaém, Litoral Sul de Pernambuco, a 75 quilômetros do Recife. Começava ali o interesse dele por palmeiras.
Nessas duas décadas, comprou terrenos vizinhos, ingressou em redes virtuais de colecionadores, participou de expedições em busca de novas espécies, passou a dedicar dois dias da semana aos cuidados com as plantas e se tornou um leitor compulsivo de títulos sobre o tema.
Hoje, 3.500 plantas depois, Gileno quer transformar sua coleção, distribuída em vasos, num jardim botânico. Assim, as árvores poderão fincar raízes no solo, garantia de que serão preservadas.
As palmeiras da coleção compreendem mais de 600 espécies, cerca de 200 nativas do Brasil. Ele guarda raridades como a tucum-mirim. Também chamada de coquinho, tem folhas aveludadas, não chega a três metros de altura e praticamente desapareceu da Mata Atlântica de Pernambuco, onde viveu nos anos 20 e 30 o beneditino alemão Dom Bento Pickel (1890-1963), botânico e professor de agronomia homenageado no nome científico da planta: Bactris pickelli.
“É um dos ‘tesouros botânicos’ mais ameaçados das nossas matas. Por isso, pretendemos multiplicar em cultivo para futura reintrodução no hábitat”, informa o colecionador. Gileno estima que existam menos de 10 indivíduos dessa espécie sendo cultivadas em coleções de todo o mundo. “E, que eu saiba, nenhum ainda frutificando.”
A coleção ocupa um terreno de aproximadamente 1.000 metros quadrados. Um jardim botânico de palmeiras teria que ter, no mínimo, 10 hectares, ou seja, uma área 100 vezes maior. “O ideal é que seja mais afastada do mar e que tenha árvores para fornecer sombra às espécies de palmeiras que não se desenvolvem sob radiação solar direta”, adianta Gileno. O que falta para o sonho se concretizar, revela, é a parceria com uma instituição.
Para o estudioso de palmeiras Judas Tadeu de Medeiros Costa, um jardim botânico dedicado exclusivamente a essas plantas, como existe no interior de Minas Gerais e em países como EUA (na Flórida) e Espanha (Ilhas Canárias), é importante para a conservação do patrimônio genético dessa família botânica. “Além de banco de germoplasma, funciona como um museu vivo.” Na opinião de Gileno, a criação de um palmetum (jardim botânico de palmeiras) se presta ainda ao turismo e ao paisagismo.
Dos mais de 350 tipos de palmeiras nativas do Brasil, seis estão na lista de plantas em risco de extinção, mas os palmófilos garantem que o número é superior. Uma das principais ameaças é a expansão da fronteira agrícola no Cerrado, rico em espécies dessa família. É o caso da Attalea barreirensis ou coco-de-caroço-só. Restrita ao Piauí e Bahia, tem sucumbido ao desmatamento para plantio de soja.
O fato de serem comestíveis também tem contribuído para condenar palmeiras ao desaparecimento. “Praticamente o palmito, que fica no interior do caule, de todas as palmeiras é comestível, assim como os coquinhos”, informa Tadeu.
Em um país de megabiodiversidade, diz o colecionador, e que ainda investe pouco em conhecimento científico sobre seu acervo botânico, é fácil constatar que a lista de palmeiras ameaçadas pode ser muito maior. “Existem várias espécies ainda a serem descobertas e descritas, com muita pesquisa nesse campo ainda por ser feita, inclusive na área de fármacos”, considera Gileno. (Verônica Falcão) (Jornal do Commercio, 31/10)
3 – Secas podem tornar Amazônia savana
Se estiagens como as de 1998, 2005 e 2010 virarem regra, floresta vai sumir no Pará, Tocantins e Mato Grosso. Falta de chuvas causada pela mudança climática fará com que a floresta se desestabilize, diz Carlos Nobre, do Inpe
Uma sucessão de secas como a de 2010 seria capaz de transformar a porção sudeste da Amazônia em savana. A conclusão é de uma dupla de pesquisadores do Brasil e da Colômbia, que calculou pela primeira vez qual é a redução na quantidade de chuvas necessária para desestabilizar a floresta.
Como tudo o mais que envolve efeitos do aquecimento global sobre os ecossistemas, a conta não é simples e envolve várias interações.
Mas Luis Fernando Salazar, da Universidade Industrial de Santander (na Colômbia), e Carlos Nobre, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), estimam que reduções de precipitação de 35% no sudeste da Amazônia e de 40% no nordeste bastariam para ampliar a estação seca (o “verão” amazônico) para quatro meses, transformando a vegetação em savana.
Num cenário futuro de aquecimento da Terra, no qual as temperaturas médias amazônicas subissem 4oC, tal redução de chuvas é perfeitamente plausível.
Basta lembrar que as secas prolongadas de 2005 e deste ano viram reduções tão grandes ou maiores do que essas.
“É como se no futuro o que aconteceu neste ano de 2010 passe a ser o padrão”, disse Nobre à Folha.
Efeito CO2
Em um estudo publicado no periódico científico “Geophysical Research Letters”, a dupla de pesquisadores usa um modelo computacional de clima e vegetação e analisa a resposta da floresta a diferentes níveis de temperatura e precipitação.
Mas, claro, num mundo aquecido não são apenas temperatura e chuva que variam: um dado que estudos do tipo ainda não haviam computado, é o efeito do CO2 a mais sobre a floresta.
O gás carbônico, como qualquer criança sabe, é fundamental para a fotossíntese. Ao mesmo tempo em que ajudam a esquentar o planeta, as emissões humanas do gás fertilizam as plantas.
O problema, conta Nobre, é que ninguém sabe qual é o efeito de fertilização do gás sobre a floresta amazônica.
“O ponto de não-retorno depende do efeito de fertilização”, diz o pesquisador. “E os dados não nos permitem dizer que seja zero.”
Ele e Salazar, então, montaram três cenários de resposta da floresta: um com zero fertilização, outro no qual o efeito é 100% (também improvável) e um intermediário, com fertilização de 25%.
No cenário intermediário, o aumento de temperatura de 4ºC e uma redução de 35% nas chuvas transformariam todo o sudeste amazônico numa savana empobrecida.
O efeito é máximo no sudeste (sul do Pará, Tocantins e Mato Grosso) e mínimo no noroeste (Amazonas). “Lá chove 4 metros por ano, se cair para 2 metros ainda dá para sustentar uma floresta”, diz Carlos Nobre.
“Mesmo que a temperatura suba 7ºC, o efeito do CO2 compensaria esse aumento”, afirma o cientista. (Claudio Ângelo) (Folha de SP, 3/11)
4 – Índico: criada maior reserva mundial
Reino Unido transforma Arquipélago de Chagos em área de proteção
A maior reserva marinha totalmente protegida do mundo enfim saiu do papel. Administrada pelo governo britânico, ela conta com 544 mil km² – o dobro do tamanho do Reino Unido – e comporta todo o Arquipélago de Chagos, no Oceano Índico. A pesca comercial será proibida em todo o seu perímetro.
Embora sua criação seja aplaudida por especialistas, sobram ressalvas de que o esforço não é o suficiente para a comunidade internacional cumprir suas metas.
Em 2002, as nações participantes da Convenção da Diversidade Biológica e da Cúpula da Terra para o Desenvolvimento Sustentável comprometeram-se a proteger, até 2012, 10% da área ocupada pelos oceanos do planeta. Hoje, a apenas 15 meses do fim do prazo, estima-se que apenas 1,17% deste território está sob alguma forma de proteção. Diante da impossibilidade de cumprir a promessa, o prazo foi estendido na semana passada para 2012.
A medida não agradou aos pesquisadores da vida marinha, que sustentam que o acordo instituído é menos ambicioso do que o necessário. De acordo com suas estimativas, é preciso proteger um terço das águas oceânicas para que as espécies presentes naquele habitat possam por sua sobrevivência.
– O fracasso em se aproximar das metas originais resultará em uma perda maciça de recursos marinhos e, consequentemente, em menos formas de sustento – pondera Heather Koldewey, administradora do Programa Internacional de Conservação Marinha e de Água Doce da Sociedade Zoológica de Londres. – Seria necessário dedicar de 30 a 40 por cento dos ambientes aquáticos a alguma forma de conservação.
O biólogo marinho Charles Sheppard, da Universidade de Warwick, na Inglaterra, acredita que a criação de mais reservas marinhas é vital para manter “vida suficiente nos oceanos”.
– Os governos precisam enfrentar o lobby da pesca industrial antes que seja tarde demais – alerta. – Não podemos suportar mais atrasos, quando seus compromissos já deveriam estar sendo honrados.
A reserva de Chagos é lar de espécies ameaçadas de extinção como tartarugas de mar verde e golfinhos, além de contar com um dos maiores recifes de coral do mundo – um habitat para mais de 1.200 espécies. Sua vida marinha foi duramente atingida pela prática descontrolada da pesca.
A Sociedade Zoológica de Londres estima que, nos últimos cinco anos, cerca de 60 mil tubarões, entre outras espécies, foram capturados como um “complemento acidental” da pesca comercial de atum. (O Globo, 2/11)