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Informativo 362 – Natureza; Recursos genéticos; Cianobactérias e A conta de natureza

1 – Dez anos para salvar a natureza

2 – Brasil quer regra mais justa sobre recursos genéticos

3 – Dinâmica de cianobactérias

4 – A conta da natureza

 

1 – Dez anos para salvar a natureza

Ritmo de extinção é mil vezes maior que natural. Prejuízo é de US$ 5 trilhões anuais
Espécies são extintas num ritmo mil vezes maior do que o natural, minando a estabilidade de ecossistemas ao redor do planeta, causando prejuízos avaliados em até US$ 5 trilhões anuais e ameaçando nossa própria existência. O alerta dramático foi ouvido na segunda-feira (18/10) por representantes de 193 países na abertura da 10ª Conferência das Partes sobre Biodiversidade (COP-10), um dos encontros ambientais mais importantes do ano, em Nagoia, no Japão.
Até o próximo dia 29, eles tentarão chegar a um acordo sobre um plano estratégico para interromper, num período de dez anos, a destruição das bases da natureza que sustentam a vida do homem. Para isso terão que superar uma série de divergências entre os países em desenvolvimento e as nações mais ricas do mundo.
O problema é que não há mais tempo para um novo fracasso, como o que ocorreu no ano passado, na conferência da ONU sobre mudanças climáticas.
– Estamos atingindo o ponto limite, depois do qual não teremos mais como reverter a perda da biodiversidade – discursou o ministro do Meio Ambiente do Japão, Ryu Matsumoto, que preside a conferência e tem o desafio de mostrar que seu país, muito criticado pelos ambientalistas, pode liderar a discussão.
– Se não dermos passos decisivos agora, cruzaremos este ponto em dez anos. Vamos adotar ações combinadas, como uma comunidade internacional, acertando metas ambiciosas e realistas – pediu.
Quinze mil pessoas participam do encontro em Nagoia, fazendo da COP-10 a convenção de biodiversidade mais disputada dos últimos anos, com a presença de governos, empresas e sociedade civil. Mesmo assim, é evidente que o tema não desperta a mesma atenção que o aquecimento global, assunto que domina a agenda ambiental internacional, embora um esteja ligado ao outro – as duas convenções nasceram juntas, na Rio 92.
O primeiro dia da COP-10 foi marcado pela distribuição farta de origamis – um símbolo do Japão -, menos manifestações ecológicas do que seria de se esperar e apelos para que os nós sejam desatados e metas para proteção de terras e águas sejam aprovadas, antes que seja tarde.
Um indício de que a reunião de Nagoia não é vista com a mesma importância dada à conferência de Copenhague, em 2009, é o fato de que os países serão representados por ministros e não chefes de Estado.
– Estamos destruindo a própria fundação que permite a vida neste planeta, mas quando realizamos fóruns como este, a sociedade ainda tem dificuldades para entender o que estamos fazendo aqui e por que isso importa – alertou o diretor do Programa Ambiental da ONU, Achim Steiner.
A discussão central para o Brasil, líder do grupo de 17 nações que detêm 70% da biodiversidade da Terra, é a aprovação de um tratado sobre o acesso a recursos genéticos para uso comercial ou pesquisas e a distribuição dos ganhos obtidos com essas operações, o chamado Tratado ABS (do inglês access and benefit sharing).
O princípio foi discutido pela primeira vez em 92: os países detentores de riquezas naturais querem garantias de que serão recompensados pela exploração de seus recursos por indústrias, como as de medicamentos e cosméticos, por exemplo. Mas as divergências nunca foram superadas.
– É um tema absolutamente crucial. As discussões estão mais maduras, mas se não houver acordo sobre o Tratado ABS, a COP-10 será um fracasso – concordou a alemã Cristine Von Weizsacker, da CBD Alliance, grupo que reúne várias ONGs ligadas à proteção da biodiversidade.
Outro ponto defendido pelo Brasil é a criação de um fundo com doações do mundo desenvolvido para garantir as iniciativas de proteção da natureza, como projetos de reflorestamento. Não há dúvidas de que metas de proteção precisam ser estabelecidas, mas não está claro se a conferência de Nagoia conseguirá aprovar um percentual a ser seguido.
As ONGs defendem que pelo menos 20% das áreas terrestres sejam transformadas em santuários ecológicos, protegidos da ação do homem. O Japão fala em 15% de terras e zonas marinhas. A China, a princípio, só aceita discutir a proteção de 6% dos oceanos.
Países em desenvolvimento temem que percentuais muito elevados atrapalhem o seu crescimento econômico.
– Não é uma questão de números, mas de responsabilidades – ponderou o argelino Ahmed Djoghlaf, secretário-executivo da COP-10. – A ideia é que as partes transformem em ações nacionais as metas decididas aqui, fazendo delas prioridade entre 2011 e 2020. O número da China não pode ser o mesmo do Haiti – exemplificou. (Claudia Sarmento) (O Globo, 19/10)

 

2 – Brasil quer regra mais justa sobre recursos genéticos

Reunião em Nagoia, Japão, tenta finalizar anos de negociações a respeito de novas regras a respeito de como e quando empresas e pesquisadores podem usar genes de plantas e animais, oriundos principalmente de nações em desenvolvimento
O Brasil não vai aceitar novas metas globais de proteção da biodiversidade se elas não vierem acompanhadas de um novo tratado da ONU que garanta aos países em desenvolvimento uma participação mais justa nos dividendos dos seus recursos genéticos, disse um diplomata brasileiro nesta terça-feira (19/10).
Delegados de quase 200 países estão reunidos para um encontro de duas semanas em Nagoia, no Japão, para discutir a rápida degradação da biodiversidade em consequência da destruição de florestas, rios e recifes de coral, o que significa a perda de um importante patrimônio natural e econômico.
A mesma reunião também tenta finalizar anos de negociações a respeito de novas regras a respeito de como e quando empresas (especialmente laboratórios farmacêuticos) e pesquisadores podem usar genes de plantas e animais, oriundos principalmente de nações em desenvolvimento.
O documento, conhecido pela sigla ABS (de “acesso e compartilhamento de benefícios” na sigla em inglês), pode destravar bilhões de dólares para os países em desenvolvimento, mas há divisões entre nações ricas e pobres a respeito de questões como a abrangência do acordo e os termos do acesso aos recursos genéticos.
O Brasil, que por causa da Amazônia abriga uma das maiores biodiversidades do planeta, diz que as negociações em torno de um “plano estratégico” para a preservação ambiental dependem da aprovação do protocolo ABS e de verbas dos países desenvolvidos para a proteção dos ecossistemas.
“O mais importante é concluir e adotar o protocolo ABS”, disse à Reuters Paulino Franco de Carvalho, chefe da divisão de meio ambiente do Itamaraty e participante da conferência, que vai de 18 a 29 de outubro.
“Se adotarmos um protocolo ABS, podemos ter um plano estratégico na compreensão de que também teremos recursos financeiros. Esses aspectos estão interrelacionados.”
A meta da conferência é definir novas metas de preservação da biodiversidade para 2020, depois de as metas para 2010 serem quase totalmente descumpridas.
Os países em desenvolvimento pleiteiam mais verbas das nações ricas para a preservação. Grande parte da biodiversidade restante no planeta se concentra nas nações em desenvolvimento, como Brasil, Indonésia e as da África Central.
Protocolo efetivo
Carvalho disse que um acordo em torno do ABS será difícil, pois os delegados continuam divididos a respeito de várias questões, embora haja espaço para algumas concessões.
O Brasil, por exemplo, defende que o protocolo abranja derivados dos recursos genéticos, enquanto as nações desenvolvidas e alguns laboratórios se opõem, temendo que isso amplie demais a abrangência do acordo.
Outra polêmica diz respeito à possibilidade de que escritórios de patentes sejam usados pelas autoridades para monitorar a origem dos recursos genéticos empregados. É que genes de plantas e animais podem dar origem a produtos muito lucrativos, como novos medicamentos ou variedades agrícolas mais produtivas.
“Se não chegarmos a um acordo para termos um protocolo significativo, um protocolo eficaz, acho que seria melhor tentar vermos se podemos encontrar um entendimento entre todas as partes”, disse o brasileiro. “Simplesmente ter um protocolo só por ter não é a melhor opção.”
Um resultado possível do encontro de Nagoia seria dar aos países mais um ano para prosseguir com as negociações, afirmou o diplomata.
Mas os delegados, que na semana que vem ganharão a companhia dos ministros de Meio Ambiente de seus países, ainda não desistiram de um acordo, no mínimo porque desejam transmitir uma mensagem positiva para a conferência climática de novembro da ONU no México.
Há poucas esperanças de que a reunião de Cancún resulte em um novo tratado climático global de cumprimento obrigatório, especialmente devido a divergências entre países ricos e pobres a respeito de metas de redução de emissões de gases do efeito estufa. Mas a ONU ainda espera que os países cheguem a um consenso a respeito de pontos menos polêmicos, como a proteção de florestas tropicais e a criação de um fundo climático.
“Os ministros vão nos pressionar muito para chegarmos a um acordo a respeito do ABS e do plano estratégico, para chegarmos a Cancún com perspectivas”, disse Carvalho.
“Se chegarmos a Cancún sem termos alcançado nenhum acordo em Nagoia, será um mau sinal sobre o que irá acontecer em Cancún.” (Reuters) (Folha de SP, 19/10)

 

3 – Dinâmica de cianobactérias

Pesquisadores da UFSCar estudam processos de liberação de matéria orgânica por cianobactérias que pode causar assoreamento. Resultados poderão ajudar a selecionar soluções para casos semelhantes
Formado pela junção de dois rios altamente poluídos – o Piracicaba e o Tietê -, o Reservatório de Barra Bonita, no interior paulista, tem seus 384 quilômetros quadrados repletos de cianobactérias, algo recorrente nesse tipo de ambiente em todo o mundo.
Por meio de diferentes processos, esses microrganismos – também conhecidos como algas azuis – liberam nas águas imensas quantidades de matéria orgânica dissolvida (MOD), que podem causar eventos indesejáveis como o assoreamento, agravando ainda mais as condições ambientais do reservatório. Por outro lado, podem também promover eventos ecológicos de interesse científico.
Com o objetivo de fundamentar a busca de soluções para esse problema, um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) estudou, durante os últimos cinco anos, o destino da MOD e os processos envolvidos com sua liberação por cianobactérias naquele reservatório.
O estudo, realizado no âmbito de um Projeto Temático apoiado pela FAPESP, foi coordenado por Armando Augusto Henriques Vieira, do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da UFSCar. Segundo ele, as pesquisas geraram várias publicações e suas conclusões poderão ser extrapoladas para outros reservatórios no país.
“Conhecendo o comportamento da MOD liberada pelas cianobactérias poderemos selecionar prováveis soluções para esse tipo de problema. Os resultados podem ser transpostos para outros casos, porque quase todos os reservatórios no Brasil estão poluídos e eutrofizados – isto é, têm excesso de nutrientes – e em quase todos as cianobactérias predominam”, disse Vieira à Agência Fapesp.
Segundo o pesquisador, os dois rios que formam o Reservatório de Barra Bonita estão altamente poluídos, com uma carga de esgoto industrial e doméstico que leva à eutrofização, facilitando a proliferação das cianobactérias e, consequentemente, de MOD. O aumento da biomassa presente na água leva a uma diminuição do oxigênio, provocando a morte de inúmeros organismos.
“Quando as cianobactérias morrem, elas se decompõem e liberam imensas quantidades de MOD. Descobrimos que parte dessa biomassa pode ser modificada pela radiação ultravioleta do Sol, gerando novos compostos diferentes dos que foram excretados pelos microrganismos”, disse Vieira.
Parte da MOD liberada pelas cianobactérias é reabsorvida não só por outras bactérias, mas também por diferentes organismos eucarióticos. Nessa MOD encontram-se grandes quantidades dos chamados polissacarídeos extracelulares, que podem ser utilizados como fonte de carbono e nitrogênio – já que sempre existe uma porcentagem de proteína associada aos polissacarídeos extracelulares – por populações de algumas espécies de zooplânctons.
“Medimos e quantificamos essas transformações que a matéria orgânica sofre ao longo do tempo. Avaliamos também a atividade enzimática das bactérias, identificando a quantidade e o tipo de enzimas liberadas pelas bactérias no reservatório. Atualmente estamos estudando a diversidade das bactérias que se associam à MOD de cada uma das principais espécies de cianobactérias do reservatório”, disse Vieira.
A maior parte dos dados, de acordo com o cientista, já foi publicada em revistas nacionais e internacionais. O estudo também gerou diversas teses e dissertações com abordagens específicas sobre a atividade das cianobactérias.
“Surgiram diversos problemas interessantes e agora vamos partir para a análise de todos os compostos identificados. Com os dados que reunimos até o momento vamos publicar um livro de divulgação, que será uma síntese de todas as pesquisas”, adiantou Vieira.
Estudando as enzimas e os açúcares presentes na água, os pesquisadores aprofundaram o conhecimento sobre a dinâmica do fluxo de matéria orgânica.
“Alguns polissacarídeos são liberados pelas cianobactérias em estado coloidal, transformando-se em agregados gelatinosos que se grudam continuamente com detritos e outras espécies, formando uma espécie de biofilme flutuante que se torna cada vez maior e no qual há crescimento de bactérias”, afirmou.
Esse processo, segundo o professor, interfere no fluxo vertical da MOD em direção ao fundo do reservatório. “Certas espécies, como alguma diatomáceas, utilizam esse processo como uma maneira para afundar, mantendo-se em ambientes onde o tempo de residência das águas é baixo  – como ocorre em pequenos reservatórios  -, evitando que elas sejam ‘lavadas’ para fora do reservatório”, disse.
Reações solares
A ação da radiação solar sobre o processo de formação da MOD, segundo Vieira, foi um dos aspectos mais surpreendentes do estudo. “Achávamos que a radiação solar aumentaria o ataque bacteriológico sobre a MOD. Mas descobrimos que o processo de radiação e o processo bacteriológico competem entre si”, disse.
Os pesquisadores achavam inicialmente que a MOD acumulada em grandes quantidades seria prontamente atacada por bactérias e transformada em CO2 e que, portanto, apenas uma pequena parcela dessa matéria orgânica dissolvida seria transportada.
“Como o ambiente é turbulento, há uma intensa mistura das águas, fazendo com que a MOD na superfície seja constantemente renovada e exposta à radiação ultravioleta do Sol. Achávamos que essa radiação facilitaria a quebra de moléculas e a decomposição da matéria orgânica. Mas o que ocorre é o contrário: grande parte dessas moléculas se transforma em compostos refratários ao ataque bacteriológico  – ou seja, inibe o ataque de bactérias. A síntese desses compostos se daria por condensação em moléculas maiores e por transformações diretas em compostos refratários por degradação”, explicou.
O impacto ambiental causado pelo acúmulo de cianobactérias é muito grande, de acordo com Vieira. Em torno das barragens, acumulam-se as chamadas manchas verdes, formadas pela exposição das bactérias ao Sol. Nesses locais e nessas condições, as cianobactérias envelhecidas morrem, liberando então grande quantidade de MOD, acompanhada de toxinas que, devido à proximidade dos vertedouros, são exportadas a jusante do reservatório.
“Além disso, o acúmulo de cianobactérias diminui a diversidade de peixes. Até há poucos anos era possível encontrar em grande quantidade, na região de Barra Bonita, peixes como trairão, piranha, lambari e outros. Hoje, eles não são encontrados com facilidade e alguns nem existem mais. Apenas as tilápias predominam”, disse Vieira. (Fábio de Castro) (Agência Fapesp, 19/10)

 

4 – A conta da natureza

ONU calcula quanto homem lucra com plantas e animais. Só insetos rendem US$ 210 bi
Criaturas, grandes e pequenas, nos prestam um enorme ser viço, ao fornecer água e alimento para os cerca de 7 bilhões de seres humanos do planeta.
A ONU apresentou na quarta-feira (20/10) na Cúpula da Biodiversidade, em Nagoia, no Japão, uma forma inédita – e, espera-se, mais convincente – de calcular o valor dos serviços prestados pela natureza. O estudo ainda é preliminar, mas informa que só os insetos que polinizam plantas comestíveis prestam serviço avaliado em US$ 210 bilhões por ano.
Os corais – berçários de peixes e usados em turismo – proporcionam US$ 172 bilhões anuais. Cerca de 30 milhões de pessoas dependem diretamente de recursos vindos dos corais para viver.
Em sua versão mais avançada, o relatório “Economia de Ecossistemas e Biodiversidade” (Teeb, na sigla em inglês) trará o valor dos serviços prestados por sistemas mais complexos, como as florestas tropicais.
Preparado pelo Programa de Meio Ambiente da ONU (Pnuma), o relatório lembra que a perda de biodiversidade custa aos países cerca de US$ 5 trilhões anuais (número anunciado no início da semana) e que a destruição de ecossistemas causará crises sociais e econômicas.
– O tempo de ignorar a biodiversidade acabou. A invisibilidade econômica da natureza sempre foi um problema, estamos mudando isso. Os governos precisam entender que só têm a perder com atual modelo de desenvolvimento predatório. A preservação de espécies é uma questão de sobrevivência da nossa própria espécie – disse o principal autor do estudo, o banqueiro indiano Pavan Sukhdev.
O Teeb foi bem recebido por ambientalistas. Eles acreditam que, ao fornecerem números concretos, o Teeb muda a argumentação em favor da conservação da biodiversidade, ainda vista por muitos como menos importante do que o combate às mudanças climáticas.
– O Teeb é uma fonte sólida de argumentação e achamos que os ministros vão analisá-lo com atenção – disse Tove Ryding, do Greenpeace.
Outro relatório apresentado na quarta-feira em Nagoia listou as regiões e as espécies mais ameaçadas de extinção do mundo. Elaborado por um consórcio integrado por 68 instituições internacionais de conservação chamado Aliança para a Extinção Zero (AEZ), ele relaciona 587 lugares que são o último habitat das 920 espécies mais ameaçadas de plantas e animais.
O Brasil, um dos países megadiversos, é o terceiro em número de sítios em risco, com destaque para a Mata Atlântica. (O Globo, 21/10)