1 – Plantas medicinais da Amazônia para todos
2 – Pedaço de um supercontinente
1 – Plantas medicinais da Amazônia para todos
Publicação do Goeldi coloca ao alcance do público resultados de discussões com cientistas e experiência acumulada sobre as plantas de uso medicinal região Amazônica
Fruto de extensa pesquisa e experiência botânica produzida por mais de 30 anos, a terceira edição do livro “Plantas Medicinais na Amazônia” apresenta informações científicas e da cultura popular colhidos pela pesquisadora do Museu Goeldi, Maria Elisabeth van den Berg.
Com ilustrações e tabelas, a publicação expõe nomenclaturas, descrições e usos de 31 famílias botânicas que contem espécies medicinais, visando oferecer uma base de dados científicos confiáveis para o incremento de pesquisas na área.
Ao longo das suas 266 páginas, o livro busca resgatar e sistematizar cerca de 365 espécies vegetais conhecidas e utilizadas na Amazônia, com a preocupação de mostrar o seu lugar dentro dos grupos taxonômicos, atualizando a sua classificação botânica. De acordo com a autora, foi comprovada a necessidade desse estudo devido ao grande número de nomes vulgares que definem espécies diferentes de plantas, o que induziria ao erro e provável problema no uso de medicamentos com tais espécies.
Exemplos disso são a “erva de passarinho” que designa duas espécies diferentes, assim como o “elixir paregórico”, e a “alfavaca” que abrange pelo menos três espécies. Além dessas, também são descritas na publicação espécies como as pimentas de macaco e do reino, o cipó d’alho e o alecrim, entre muitas outras.
Elaboração – “A idéia [do livro] era disponibilizar a todas as pessoas interessadas, seja do ponto de vista cultural, preservacionista, comercial ou industrial, uma contribuição útil e precisa dos nossos recursos, tão cantados e debatidos, às vezes de modo superficial e equivocado”, explica Elisabeth van den Berg no prefácio desta terceira edição.
Segundo a ex-diretora do Museu Goeldi Ima Vieira, que assina a apresentação desta edição, desde a sua primeira edição em 1982, o livro é referência para estudiosos, professores, estudantes e a sociedade civil em geral. “Tenho a convicção que esta obra clássica ficará para a história da produção científica brasileira, e estimulará a realização de outros estudos desse gênero”, afirma Vieira.
O material estudado durante a elaboração da pesquisa que gerou a publicação, em sua maior parte, é oriunda da coleção viva da autora, de coletas realizadas em feiras, a exemplo da Feira do Ver o Peso em Belém (PA), ou em outros estados da Amazônia Legal. Esse material está depositado nos herbários do Museu Goeldi e da Embrapa Amazônia Oriental. A publicação foi ilustrada por Carlos Alvarez e a foto da capa é de Maria Lúcia Morais. (Vanessa Brasil)
2 – Pedaço de um supercontinente
Projeto Temático na USP investiga a formação da América do Sul a partir da fissão de uma grande massa continental
Há 200 milhões de anos uma única massa continental reunia praticamente todas as terras emersas do planeta. A quebra desse supercontinente denominado Pangeia deu origem aos atuais contornos continentais.
Geólogos da Universidade de São Paulo (USP), que integram um projeto de Auxílio à Pesquisa – Projeto Temático apoiado pela Fundação de Amparo á Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), estão levantando a história geológica de um dos pedaços que se separou de Pangeia e veio a se constituir nas terras que seriam conhecidas posteriormente como América do Sul. O foco da investigação está em um período que se estende de 1 bilhão a 450 milhões de anos atrás.
“Esse é o principal período investigado no projeto relacionado com a formação do nosso continente. Depois, a América do Sul se comportou de maneira mais estável, em sua maior parte servindo de anteparo para a evolução dos Andes”, disse Miguel Stipp Basei, coordenador do Temático, professor do Centro de Pesquisas Geocronológicas (CPGeo) do Instituto de Geociências da USP, à Agência Fapesp.
A separação das massas de terra e a sua reunião em grandes blocos é um processo cíclico que se repetiu diversas vezes durante a formação do planeta. Exemplos de grandes massas continentais que existiram são os continentes Colúmbia, Laurentia, Gondwana, Báltica e Sibéria. Pangeia foi o último dos supercontinentes e a dispersão de seus fragmentos levou à configuração atual do planeta.
A África e a América do Sul, por exemplo, estão se separando a uma taxa de alguns centímetros por ano, enquanto outras regiões do planeta estão em processo de aproximação. Entender essa dinâmica é essencial para traçar o caminho que o continente fez até encontrar a atual configuração.
“Sabemos, por exemplo, que a agregação de massas continentais em um ou em alguns supercontinentes conduz a uma situação de instabilidade, em grande parte porque a crosta oceânica que formaria todo o resto do planeta teria uma densidade diferente da parte emersa, o que levaria a um novo processo de fissão”, explicou Basei.
Para traçar o caminho dos continentes e localizar onde estavam os terrenos que formam o atual litoral de São Paulo há 130 milhões de anos, por exemplo, os pesquisadores lançam mão do paleomagnetismo das rochas.
Ao formar uma rocha, os minerais magnéticos que a compõem se alinham de acordo com o polo magnético da Terra. Com a medição de suas características paleomagnéticas e a determinação de sua idade é possível descobrir com certo grau de precisão onde ela estava quando foi formada.
A pesquisa tem permitido justapor partes dos continentes africano e sul-americano com precisão cada vez maior. A semelhança entre rochas encontradas no sudoeste da África e no sudeste da América do Sul possibilitou, desde o início dos estudos sobre a separação dos continentes na década de 60, efetuar correlações geológicas entre esses territórios que um dia estiveram unidos. Em continuidade a esses estudos pioneiros, e, utilizando-se de técnicas e equipamentos mais sofisticados, está sendo possível detalhar essas correlações.
Um exemplo está no litoral do Uruguai (Cinturão Rocha) onde são observadas rochas semelhantes às encontradas em uma região que compreende o litoral sul da Namíbia e a costa noroeste da África do Sul (Cinturão Gariep).
“Estudos mostraram que, além das semelhanças entre essas rochas, ambas derivaram de uma fonte idêntica. Isso caracteriza que nessa parte da América do Sul atual temos rochas que integraram um único bloco com aquela parte da África”, disse Basei.
Para desenvolver a pesquisa, o grupo brasileiro conta com a cooperação de especialistas de instituições como a Universidade de La Plata (Argentina), da Universidade de Chile, da Universidade da Cidade do Cabo (África do Sul), da Universidade de Kansas (Estados Unidos) e da Universidade de Goettingen (Alemanha).
“Uma das ferramentas importantes que complementam a comparação entre as rochas e seus constituintes vem da geologia isotópica. Estudos envolvendo análises pelos métodos Rb-Sr, Sm-Nd e Pb-Pb [de datação baseados na desintegração radioativa desses elementos químicos] permitem determinar a assinatura isotópica das diferentes unidades geológicas. Esses dados somados às idades das rochas conferem grande segurança às correlações”, disse Basei.
O Projeto Temático permitiu a aquisição de um espectrômetro de massas Triton, que garante maior rapidez e precisão na análise das amostras. O Temático também viabilizou a constituição, no fim de 2009, do Laboratório de Análises de Minerais por LA-ICP-MS (siga em inglês para “espectrômetro de massa por ionização acoplada por plasma com ablação a laser”), que possibilita a determinação da idade in situ de minerais.
Além desses equipamentos, este ano deverá entrar em operação no CPGeo da USP uma microssonda iônica de alta resolução (Shrimp, na sigla em inglês).
O aparelho é capaz de analisar porções dos grãos da ordem de cinco mícrons (milésimos de milímetro) e indicar as diferentes épocas em que essas regiões dos cristais se formaram. Financiada em partes iguais pela Fapesp e pela Petrobras, a microssonda custou R$ 3 milhões e só existem 14 similares no mundo.
Auxílio jurássico
A antiga fauna das regiões geográficas também pode ser um indicador do posicionamento de terras em tempos passados. Foi assim que a presença de fósseis de um tipo de trilobita (artrópode do período Paleozóico) permitiu sugerir a hipótese de que parte da região noroeste da Argentina representaria um fragmento do supercontinente Laurencia, que ficava ao norte do planeta.
“Por volta de 500 milhões de anos atrás, esse pedaço da atual Argentina teria se desprendido de uma porção de terra que atualmente constitui a região sul dos Estados Unidos e norte do México”, disse o professor da USP, ressaltando que os fósseis são bons complementos para as pesquisas do Temático.
As similaridades geológicas e cronológicas (encontradas nas rochas) e faunísticas (fornecidas pelos fósseis) permitem detalhar os mapas do planeta em diferentes eras geológicas. E saber onde os continentes estavam no passado e quais eram as suas ligações é importante não só para a ciência, segundo Basei.
Em uma palestra que fez na mina de Kumba, na África do Sul, o professor se espantou com a numerosa audiência. “E todos estavam interessados em saber quais as correlações possíveis com o que havia nas rochas da contraparte da América do Sul”, disse.
O interesse, segundo Basei, se justifica. A correlação das rochas entre os continentes pode indicar quais riquezas minerais podem ser encontradas na África a partir do que já foi descoberto do outro lado do Atlântico, e vice-versa.
“As minas africanas localizadas em regiões que se desprenderam do Brasil podem indicar a presença e orientar a procura desses mesmos minerais aqui”, disse. (Fabio Reynol) (Agência Fapesp, 1/9)