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Informativo 308 – Bioinvasão; Antártica; Mares e Bactérias no solo da Mata Atlântica

1 – ‘Bioinvasão’ trazida por navios desafia cientistas brasileiros

2 – Antártica? Ali ao lado

3 – A tragédia invisível dos mares

4 – Estudo pioneiro mapeia bactérias presentes no solo da Mata Atlântica

 

1 – ‘Bioinvasão’ trazida por navios desafia cientistas brasileiros

Siris, mexilhões e corais exóticos infestam as águas brasileiras. Alerta foi dado durante reunião da SBPC, que ocorre em Natal
Enquanto olhos do mundo todo se voltam para o derramamento de petróleo no Golfo do México, uma lenta “poluição” invade silenciosamente ambientes costeiros. São diversos seres, entre eles algas, crustáceos e moluscos, carregados na água dos porões dos navios e que podem causar desastres ambientais quando chegam em portos estrangeiros, onde muitas vezes não encontram predadores naturais e se alastram.
Durante a reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que ocorre nesta semana em Natal, cientistas que estudam o mar explicaram que ainda não há solução definitiva para esse problema, e que o Brasil tem vários exemplos de animais que já causaram transtornos ambientais.
A água, em geral captada nos portos onde os navios saem, é utilizada pelas embarcações para dar equilíbrio quando a viagem é feita sem carga. Ao chegar ao porto de destino, a chamada “água de lastro” é liberada, causando uma migração involuntária de milhões de seres vivos.
“O mundo inteiro está preocupado com esse problema, e ainda não há nenhum método eficaz para combatê-lo”, afirma a bióloga Rosa Luz de Souza , pesquisadora de Universidade Federal Fluminense (UFF) e organizadora do livro “Água de lastro e bioinvasão”.
Segundo a bióloga, um dos piores exemplos de espécie exótica que se alastrou pelo Brasil foi o mexilhão dourado. Ele veio da Ásia nos porões dos navios e se tornou uma praga nos rios brasileiros, chegando até o Pantanal. O animal se espalhou com tanto vigor que agora causa problema para as usinas hidrelétricas, pois se incrusta nos equipamentos e atrapalha a passagem da água.
O cientista Marco Cutrim, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), explica que os pesquisadores têm dificuldade para criar mecanismos que controlem esses seres depois que eles foram soltos na natureza, e aponta que faltam pesquisas sobre a biologia marinha. “No Nordeste no Norte nós não conhecemos nem a nossa biota [conjunto de seres que habitam um ambiente].”
Troca de água
No Brasil, a Marinha exige a troca da água de lastro em mar aberto antes que os navios cheguem aos portos. Há também normas específicas para o Rio Amazonas, para que embarcações não soltem água salgada em portos fluviais.
Segundo Flávio da Costa Fernando, pesquisador do Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira, ligado à Marinha, a substituição da água resolve parte do problema, mas não é totalmente eficaz, já que os navios não foram construídos para isso, e microorganismos invasores podem permanecer nos porões durante a troca.
O pesquisador explica que já foram feitas experiências com substâncias químicas para tratar a água, mas esses elementos podem matar os organismos nativos dos portos quando a água for desembarcada.
Convenção internacional
A grande esperança, segundo ele, é a implantação da Convenção Internacional para Controle e Gestão da Água de Lastro e Sedimentos de Navios. Aprovada pela Organização Marítima Internacional (IMO, na sigla em inglês) em 2004, ela não foi posta em prática ainda porque precisa da assinatura de 30 países, mas até agora conseguiu aprovação de 26, entre eles o Brasil.
“A convenção exige uma densidade máxima de organismos [na água de lastro]”, informa Fernandes. Segundo o pesquisador, para eliminar os seres vivos estão sendo desenvolvidos sistemas de tratamento, que ainda passarão pela aprovação da IMO.
(Iberê Thenório) (G1, 28/7)

 

2 – Antártica? Ali ao lado

Mudanças no ambiente antártico influenciam o Brasil muito mais do que imaginamos. Estudos recentes mostram que fenômenos que ocorrem no continente gelado afetam processos de desertificação e formação de ciclones na América do Sul
Sim, o Brasil é um país tropical e bonito por natureza. Mas não é só porque temos um longo verão na maior parte de nosso território que devemos esquecer o frio que vem lá de baixo.
Os processos ambientais na Antártica têm grande influência no clima e na biodiversidade dos oceanos brasileiros, lembram um glaciólogo, uma oceanógrafa e um geofísico em simpósio da reunião anual da SBPC, que acontece esta semana em Natal. O objetivo das apresentações era desmistificar a ideia de que a Antártica está longe e não tem relações diretas com o Brasil.
Não por acaso: parte do Sul do país fica mais perto do continente gelado do que da própria Amazônia. “A distância da estação brasileira na Antártica até Chuí é de 3.172 km”, explica Jefferson Simões, o primeiro glaciólogo brasileiro, à CH On-line. “De Chuí a Porto Velho, em Roraima, são 4.177 km!”
Simões relata ainda outro fato curioso para comprovar como a Antártica é nossa vizinha. Cerca de três vezes ao ano, uma massa de ar frio vinda desse continente adentra o território brasileiro e causa uma queda brusca de temperatura no Acre, a mais de seis mil quilômetros de distância do seu ponto de origem.
Mudanças lá, reflexos aqui
O geofísico Heitor Evangelista, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), apresentou resultados de estudos que comprovam a influência das variabilidades climáticas e glaciais da Antártica na América do Sul.
Um desses estudos analisou a concentração de metais nos últimos séculos da península antártica.
Descobriu-se que a concentração de alumínio nessa região mais que dobrou durante o século 20. Esse dado coincide, segundo os cientistas, com o aumento de um grau na temperatura média do hemisfério sul: um padrão que tem paralelo com a desertificação na Patagônia e no norte da Argentina.
Já outro estudo aponta que a quantidade de gelo na Antártica está ligada à formação de ciclones na América do Sul. No verão, quando há menos gelo, a formação de ciclones no continente americano é menor, e vice-versa.
Os motivos por trás dessas ligações, no entanto, ainda são desconhecidos. “De que forma acontecem essas correlações ainda é uma questão em aberto”, explica Evangelista.
Já oceanógrafa Lúcia de Siqueira Campos, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro do Comitê Nacional de Pesquisas Antárticas, apresentou o intercâmbio entre a incrível biodiversidade dos oceanos antárticos e o ecossistema marinho da América do Sul.
Essas trocas, segundo ela, podem estar ameaçadas por causa do aquecimento acelerado da península antártica. Cabe aos cientistas investigar de que forma essa mudança de temperatura no continente pode transformar os mares dali – e, quiçá, também os brasileiros. (Isabela Fraga, da Ciência Hoje On-line)

 

3 – A tragédia invisível dos mares

Fonte de oxigênio, população de fitoplânctons cai 40% por conta do aquecimento
As plantas microscópicas que alimentam toda a vida marinha estão morrendo em ritmo drástico, segundo um estudo inédito conduzido pela Universidade de Dalhousie, no Canadá, e publicado esta semana na revista “Nature”. A população oceânica de fitoplânctons, como estes seres são conhecidos, caiu cerca de 40% durante o século passado. Para os pesquisadores, a mudança está relacionada com o aquecimento global e as crescentes temperaturas da superfície do mar.
Os fitoplânctons são organismos marinhos microscópicos capazes de realizar fotossíntese, assim como as plantas terrestres. Encontrados nas camadas superiores dos oceanos, eles produzem uma quantidade significativa do oxigênio que respiramos.
Um declínio de 40% da população destes seres representaria uma mudança maciça na biosfera global. Se este índice for confirmado por outros estudos, poderá representar, de acordo com cientistas, um impacto maior do que a destruição de florestas tropicais e recifes de coral.
Impacto biológico sem precedentes
De acordo com o biólogo marinho Boris Worm, que participou do levantamento, as baixas populacionais foram constatadas principalmente na segunda metade do século XX.
– Se o ritmo de decréscimo permanecer o mesmo, algo realmente sério está acontecendo há décadas – alertou. – Tentei pensar em uma mudança biológica maior do que esta, mas nada me ocorreu. A confirmação de nosso estudo significaria que o ecossistema marinho de hoje está muito diferente daquele de poucos anos atrás, e boa parte dessa mudança está acontecendo no oceano, onde não podemos vê-la.
A equipe da universidade canadense estudou os registros populacionais de fitoplânctons realizados desde 1899, quando a clorofila do fitoplâncton (pigmentos verdes) passou a ser monitorada regularmente.
Cerca de meio milhão de medições, promovidas durante todo o século XX, foram analisadas.
As contagens aconteceram em dez regiões do mundo. Em oito, a população de fitoplânctons declinou em taxas preocupantes, em uma média global de 1% ao ano.
O declínio é correlacionado ao aumento da temperatura na superfície do mar – embora os cientistas não consigam provar que os oceanos mais quentes tenham sido a causa da morte dos fitoplânctons.
De acordo com os pesquisadores, o estudo optou pela análise de um período tão longo para eliminar as conhecidas flutuações naturais de fitoplânctons que ocorrem de uma década para outra. Estas mudanças são normalmente atribuídas a oscilações na temperatura do oceano.
– Os fitoplânctons são um importante ator no suporte da vida no planeta – ressaltou Worm. – Eles produzem metade do oxigênio que respiramos, retiram CO2 da superfície e ainda servem de alimento para todos os peixes.
Líder da equipe de pesquisa, que demorou três anos para concluir o estudo, Daniel Boyce também sublinhou a importância dos fitoplânctons e o impacto de sua população para o homem.
– Os fitoplânctons, base da vida nos oceanos, são essenciais na manutenção da saúde do mar – ponderou. – Eles representam um combustível, e seu declínio afeta toda a cadeia alimentar, incluindo os seres humanos. Precisamos, por isso, nos preocupar com o seu declínio. Fizemos uma descoberta muito robusta e temos confiança em nossas conclusões.
Os fitoplânctons são afetados pela quantidade de nutrientes que vêm do fundo dos oceanos. No Atlântico Norte, eles “florescem” naturalmente na primavera e no outono, quando as tempestades levam estes alimentos para a superfície.
Um efeito das temperaturas crescentes foi deixar a coluna de água de algumas regiões equatoriais mais estratificadas, com água mais aquecida sobre camadas mais frias, dificultando a chegada de nutrientes para os fitoplânctons na superfície do mar.
Mares mais quentes nas regiões tropicais também são conhecidos por ter um efeito direto em limitar o crescimento de fitoplânctons. (Steve Connor, do Independent) (O Globo, 29/7)

 

4 – Estudo pioneiro mapeia bactérias presentes no solo da Mata Atlântica

Micro-organismos compõem o acervo da Coleção de Bactérias da Mata Atlântica do Instituto Oswaldo Cruz, numa iniciativa de investigação genética sobre a biodiversidade de um dos ecossistemas mais relevantes e ameaçado do planeta
Considerado o conjunto de ecossistemas mais rico do mundo, os remanescentes da Mata Atlântica servem de lar para animais como o mico-leão-dourado, a onça-pintada e o bicho-preguiça. Contam, ainda, com a beleza das orquídeas, dos ipês e dos jacarandás. Difícil é imaginar que, incluída em sua biodiversidade, estão os micro-organismos que passam longe dos olhos. É o caso das bactérias presentes no solo.
Esse componente microscópico que sustenta toda a exuberância da floresta é alvo de um estudo pioneiro do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), e inicialmente financiado pela Finep e Faperj, que deu origem a uma coleção científica inusitada: a Coleção de Bactérias da Mata Atlântica.
Atualmente, as centenas de amostras que integram o acervo passam por uma fase de classificação e identificação por meio da taxonomia genômica, que se baseia na investigação da informação genética dos isolados – novidade nas pesquisas brasileiras na área.
As amostras de solo foram coletadas em 2005, durante um projeto que realizou o levantamento da biodiversidade do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, no Rio de Janeiro, com a participação de instituições como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Jardim Botânico e Museu Nacional.
“Além da investigação da biodiversidade da área, o projeto também incluiu o estudo de geólogos da Universidade de Brasília, que já haviam caracterizado, naquele ecossistema, cinco diferentes tipos de solo em uma trilha com extensão de 40 quilômetros. Participamos de uma das coletas que eles realizaram e, enquanto coletavam amostras para análise geofísica, nós fizemos a coleta para a análise bacteriana”, conta a pesquisadora Ana Carolina Paulo Vicente, chefe do Laboratório de Genética Molecular de Micro-organismos do IOC e coordenadora do estudo.
Segundo a especialista, o desafio surgiu logo no início do trabalho. “Quando investigamos a biodiversidade de um determinado ecossistema, não podemos delimitar alvos específicos. O objetivo era descobrir o que estava presente naquela área, naquele momento, em relação às bactérias. Tínhamos que fazer um isolamento não seletivo e trabalhar com bactérias cultiváveis”, esclarece.
Cerca de 800 morfotipos foram isolados inicialmente. Eles formam o acervo da coleção, que está em fase de classificação e identificação. Para isso, são utilizados métodos de análise ainda raramente empregados no Brasil em casos como este. “A maior parte dos trabalhos realizados em relação às bactérias no mundo tem foco nas bactérias de importância clínica. Dessas, são conhecidas as condições de cultivo e manutenção, já que algumas são estudadas há mais de cem anos. Já das bactérias que estão no ambiente, geralmente se conhece muito pouco. Por isso, estamos investigando a informação genética desses micro-organismos”, explica a pesquisadora.
“A abordagem é a da taxonomia genômica. Existem alguns alvos que são universais para bactérias. Recuperamos o DNA desses alvos a partir das amostras do ambiente para definir o gênero e a espécies isoladas na amostra do solo Parque Nacional da Serra dos Órgãos”, detalha.
Para a pesquisadora, o levantamento da biodiversidade bacteriana é um dos indicadores fundamentais para avaliar as mudanças no meio ambiente e eventualmente identificar “potenciais patógenos no ambiente”. “A importância do estudo da biodiversidade de um modo geral também se aplica para as bactérias. O status do meio ambiente é medido por diferentes indicadores. O ambiente é caracterizado, naquele momento, por determinado cenário, que inclui plantas, animais e também micro-organismos. Se houver uma mudança, que pode ser física ou química, todos estes indicadores podem contribuir para entender seus impactos”, finaliza. (Assessoria de Comunicação do Instituto Oswaldo Cruz)