TVs, rádios e jornais são vistos como de mais credibilidade pela população em relação a informações sobre o novo coronavírus (Foto: Visualhunt)

Uma pesquisa realizada pelo Datafolha entre os dias 18 e 20 de março mostra que as TV’s e os jornais impressos são vistos pelos brasileiros como mais confiáveis para divulgar informações sobre o novo coronavírus. O levantamento questionou se as pessoas confiavam totalmente, parcialmente ou não confiavam em determinado meio.

De acordo com o resultado, os meios de comunicação que são majoritariamente desempenhados pela imprensa convencional inspiram maior confiança do que os demais. É o caso dos programas jornalísticos de TV, vistos como confiáveis por 61% dos entrevistados. Outros meios que, segundo o levantamento, têm maior confiabilidade, são os jornais impressos, com 56%, seguidos pelos programas jornalísticos de rádio (50%), e sites de notícias (38%). Já as redes sociais Whatsapp e Facebook chegam a 12% cada. 

TV
Segundo a professora do Programa de Pós-graduação em Comunicação (PPGCOM) da Faculdade de Comunicação (Facom), da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Iluska Coutinho, essa confiança se mostra mais abrangente porque foi tecida ao longo dos últimos 70 anos. “É um pacto de confiança que vai sendo testado de diversas maneiras, e tem sido fortalecido, por exemplo, com a possibilidade de as pessoas enviarem vídeos que, ao serem veiculados, reforçam a confiabilidade. Não é só falar, é falar e escutar as pessoas. Acho que a pandemia mostra o jornalismo como lugar de referência. A especialidade do jornalismo é saber identificar onde está a melhor informação, mais precisa e correta, e trabalhá-la de modo a torná-la mais acessível para um grande número de pessoas”, afirma.

Universalização da TV no Brasil, com alcance como nenhum outro meio, ainda é uma variável que pesa na avaliação (Foto: Caique Cahon)

Na avaliação do também professor da Facom, Paulo Roberto Figueira Leal, no caso da TV há uma variável interveniente que é a sua quase universalização no Brasil. Ele destaca que não há nenhum outro meio de comunicação com o nível de alcance em quase totalidade dos lares brasileiros. “Parte significativa da população brasileira não tem ainda capacidade de consumo – porque não pode, em alguns casos, ou porque não pode e não quer, em alguns outros – de veículos impressos ou a sites noticiosos, onde haja uma densidade maior de informação. A indicação da TV no nível em que ela aparece nas pesquisas é resultado, em parte, não necessariamente de um trabalho melhor da TV, mas da sua presença cotidiana em muito mais lares do que qualquer outra tecnologia”, diz. 

Rádio
Por outro lado, a velocidade em transmitir informações e o imediatismo são os principais fatores para que os programas jornalísticos de rádio inspirem confiança a grande parte dos brasileiros, de acordo com a opinião diretor de Imagem Institucional da UFJF, Márcio Guerra. “Como pesquisador e como uma pessoa que viveu e estuda o rádio durante muitos anos, não é nenhuma surpresa que, neste momento, como aconteceu quando do ataque às torres gêmeas, como em outras tragédias que o mundo viveu, o rádio sempre foi o primeiro e o mais procurado pela população. Pela sua velocidade, mas também pela sua credibilidade, seu imediatismo e, principalmente, porque sempre foi o rádio o companheiro do ouvinte, do cidadão. Então normalmente é muito comum que o rádio seja, mais uma vez, um instrumento, uma ferramenta mais segura de informação”, avalia.

Jornais impressos e sites de notícias
Para a professora do PPGCOM, Cláudia Thomé, o jornalismo historicamente tem o compromisso em divulgar a informação correta, precisa, em noticiar com responsabilidade, ciente de sua função social. “A pesquisa mostra que a maioria reconhece isso. Essa confiabilidade, no entanto, precisa ser maior. Como jornalistas e pesquisadores, temos que avaliar esses números indicativos do nível de credibilidade do jornalismo profissional, mas também as mudanças de hábito do público na busca por informações no atual contexto comunicacional”, ressalta.

“Os sites aparecem com apenas 38% no nível de confiança, o que mostra que a função do jornalismo como certificador de informação pode não ter deslizado ainda totalmente para esses espaços”

Já em relação ao caso dos sites de notícias, que apresentam um percentual de confiabilidade menor na pesquisa, a professora salienta ser importante considerar de quais sites as pessoas estão falando, pois na Internet há ambientes de diferentes tipos. “Há sites ligados a grupos de comunicação tradicionais, outros de grupos de jornalismo independente já reconhecidos por seu trabalho, outros colaborativos, entre outras boas iniciativas. Os sites aparecem com apenas 38% no nível de confiança, o que mostra que a função do jornalismo como certificador de informação pode não ter deslizado ainda totalmente para esses espaços, o que preocupa, porque novos modelos de jornalismo apontam a migração do impresso para a web. Levar a credibilidade junto se apresenta como um desafio”, diz.

Redes sociais e o perigo das “Fake News”

12% das pessoas têm mais confiança em mensagens de whatsapp e outros 12% têm como fonte o Facebook (Foto: Brian Santos/Pixabay)

O levantamento feito pelo Datafolha mostra que 12% dos entrevistados confiam em informações sobre o novo coronavírus que têm como fonte o Facebook, e outros 12% das advindas do Whatzsapp. Para Leal, a inclusão de novas tecnologias está inserida numa dimensão de um lento processo de aprendizagem. “Há um processo pedagógico em curso, como, por exemplo, com a utilização do Whatsapp. Nas eleições de 2018, mais recentemente, esse foi um veículo especialmente capaz de ser um repositório de disseminação de fake news, de informação falsa. Então muita gente que até acreditou em alguma coisa, eventualmente depois percebendo que não era verdade, pode ter um processo de aprendizagem com a não confiabilidade deste meio. Há então uma dimensão dessa aprendizagem que vai se consolidando quanto mais as pessoas conhecem os limites e as características de cada plataforma, de cada tecnologia”, destaca. 

“A mídia não é nossa única referência no mundo, e nós vivemos numa época de guerra de narrativas que se tornou muito forte no Brasil em 2018, quando tivemos uma polarização política muito grande no país”

Iluska lembra que há uma relação de proximidade das pessoas com a mídia, mas que elas também possuem outras referências. “A mídia não é nossa única referência no mundo, e nós vivemos numa época de guerra de narrativas que se tornou muito forte no Brasil em 2018, quando tivemos uma polarização política muito grande no país. E essa guerra de narrativas, por um lado,  também veio desqualificando a mídia. Há um esforço muito grande de um grupo de poder tentando desqualificar a mídia, tentando dizer que ela não é confiável, muitas vezes utilizando a própria mídia para fazer isso”, afirma. 

Leal defende o cultivo de certo ceticismo para que a pessoas fujam de notícias falsas ou assumam algo como verdade incontestável. “Há um risco enorme de se receber alguma coisa numa rede social e tratá~la como verdade sem nenhum mecanismo de apuração, sem nenhum tipo de checagem. Do mesmo modo, há um risco de tomar as opiniões de um grupo de mídia tradicional, que tem preferências políticas e ideológicas, como a única versão possível daquele episódio. Acho que a sociedade cresce e dificulta a circulação de fake news quanto mais ela é capaz de perceber criticamente os conteúdos que recebe, e quanto mais é capaz de desenvolver mecanismos de verificação, de checagem de outras fontes, dependendo menos da única fonte que, eventualmente, diz que algo é verdade.”